Pesquisadores encontram anzóis em filhotes de tubarões ameaçados em Fernando de Noronha

Pesquisadores estão encontrando filhotes de tubarão-limão (Negaprion brevirostris) com anzóis em Fernando de Noronha (PE). A equipe do projeto Tubarões e Raias de Noronha detectou, entre 23 de janeiro e 5 de fevereiro, seis animais da espécie, que está ameaçada de extinção, com o apetrecho de pesca enroscado no corpo ou com marcas do equipamento. A captura do animal é proibida.

Atualmente, o projeto vem capturando e marcando tubarões-limão no arquipélago e já monitora 36 indivíduos. As capturas ocorrem na baía do Sueste, localizada no parque nacional marinho, que é protegido, e no porto de Santo Antônio, espaço com maior concentração de pessoas. Foi apenas no porto que os pesquisadores encontraram os filhotes com anzóis.

O objetivo do estudo é verificar se a crescente urbanização e as atividades turísticas em Fernando de Noronha têm algum impacto negativo nos filhotes. O projeto Tubarões e Raias de Noronha atua na conservação desses animais na região do arquipélago.

Segundo a bióloga e coordenadora do projeto, Bianca Rangel, a maioria dos anzóis foi observada presa na boca dos filhotes, mas há registros também nas nadadeiras e imagens de um animal com anzol no olho. Bianca destaca que a presença desse apetrecho de pesca nos tubarões pode atrapalhar a sua alimentação. “Os filhotes nasceram há poucas semanas e ainda estão aprendendo a caçar”, afirma a cientista, que salienta: “A presença do anzol pode atrapalhar na hora de morderem uma presa”.

Bianca explica que a presença de anzóis na mandíbula pode afetar o desenvolvimento do aparato bucal, o que pode prejudicar o animal também na fase adulta. Já os anzóis nos olhos podem cegar e atrapalhar tanto na caça, como na interação com outros indivíduos do seu grupo. O pequeno tubarão pode, ainda, ficar mais vulnerável a animais maiores. Outro fator preocupante é a existência de linhas nos anzóis, encontradas com frequência, e que podem limitar a natação e locomoção do animal.

É importante lembrar que o tubarão-limão está classificado como “vulnerável” pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, em inglês). Na Lista. Oficial de Espécies da Fauna Brasileira Ameaçadas de Extinção, é classificado como “em perigo”, que é um nível mais ameaçado do que o indicado pela IUCN. Isso tem implicações importantes para a espécie. Ainda segundo Bianca, “qualquer alteração na população pode levar ao colapso da espécie, bem como das interações ecológicas das quais os indivíduos fazem parte”. E acredita-se que os tubarões-limão sejam “residentes” em Fernando de Noronha, ou seja, permanecem a maior parte do tempo na região.
Para Bianca, o problema pode ser consequência de pesca acidental, mas ainda é preciso realizar estudos para comprovar.

Tubarões mortos em janeiro

Em 7 de janeiro, foram encontradas caudas e barbatanas de pelo menos três filhotes de tubarões-limão no porto de Santo Antônio. O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) explicou que é comum avistar os filhotes mais próximos da costa durante esta época do ano. O comportamento é um meio de defesa contra predadores. Porém, essa proximidade da praia faz com que fiquem mais vulneráveis à pesca predatória e à interação com banhistas.

O arquipélago abriga duas unidades de conservação: o parque nacional marinho – de proteção integral – e a área de proteção ambiental (APA) – de uso sustentável. Na área do parque é proibido realizar qualquer tipo de pesca. Já na área da APA é permitido pescar seguindo as regras do Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental de Fernando de Noronha. As espécies proibidas são budiões (escarídeos), tubarões e raias (condrictes).

Testemunhas ouvidas pelo ICMBio relataram ter avistado pescadores no momento do crime ambiental, mas não foi possível identificar os suspeitos. O instituto afirmou que não há registro de atividades de grupos de pesca ilegal em Fernando de Noronha, e que raramente ocorrem interações acidentais com espécies proibidas durante a pesca. A investigação segue sob responsabilidade da Polícia Federal.
Sobre o caso, a bióloga Bianca acredita se tratar de pesca para consumo. “O Brasil é um dos maiores consumidores da carne de tubarão no mundo”, afirma. “Não seria novidade encontrar nadadeiras descartadas quando a intenção é a pesca para consumo da carne do corpo do animal”.