Bioincrustação: prevenção e controle em áreas portuárias

A introdução de espécies exóticas* e as bioinvasões** constituem, respectivamente, um aspecto e um impacto ambiental com os quais o tráfego aquaviário e a atividade portuária devem lidar em termos de controle e prevenção. O tema já foi tratado nesta coluna, nos artigos “Os perigos ocultos na água de lastro à fauna”, “O transporte aquaviário como agente de risco à fauna nativa” e  “Fauna marinha pega carona”, razão pela qual este artigo se concentrará apenas em ações de prevenção e controle em áreas portuárias.

Atualmente, inúmeros portos organizados estabelecem e divulgam suas normas específicas a respeito da prevenção da introdução de espécies exóticas, além de realizarem monitoramento desses organismos. As instalações portuárias fornecem uma ampla gama de substratos artificiais para o assentamento larval e a bioincrustação, incluindo estacas, cais, píeres, molhes, boias, cabos, plataformas, embarcações, entre outros. No caso dos substratos móveis, além de disponibilizar áreas para o assentamento e o estabelecimento de espécies, eles contribuem ainda para a dispersão e a expansão de áreas nas quais ocorre a introdução e/ou a bioinvasão, razão pela qual sua limpeza requer cuidados extras, além de ser realizada em terra/sítio seco.

Inúmeros requisitos legais contemplam ações de prevenção de bioinvasões, bem como suas competências. Embora as principais obrigações legais nesse sentido recaiam sobre as embarcações, responsáveis pelo gerenciamento de água de lastro conforme as diretrizes emanadas da Organização Marítima Internacional (IMO) no que tange  prevenção, minimização e eliminação dos riscos da introdução de organismos aquáticos nocivos e agentes patogênicos existentes na água de lastro, bem como pelo uso de sistemas anti-incrustantes em obras vivas, restringindo aqueles danosos ao meio ambiente marinho e/ou à saúde humana, conforme normas igualmente emanadas da IMO, e sobre a autoridade marítima (responsável pela internalização e fiscalização quanto ao cumprimento de tais normas no País), há ações que podem ser executadas em portos para minimizar o problema.

Tais ações podem ser mandatórias (quando exigidas por licenças ambientais, por exemplo) ou voluntárias (quando executadas como boa prática e/ou positivadas na jurisdição da autoridade portuária por meio de norma própria), podendo ainda serem replicadas por terminais, marinas, estaleiros e afins.

O exemplo de Pernambuco

Nesse sentido, ideias interessantes são trazidas pelo Decreto Estadual nº 50.351/2021, vigente no estado de Pernambuco e que “Dispõe sobre ações de prevenção, erradicação, controle e monitoramento de espécies exóticas invasoras e proteção da biodiversidade marinha na zona costeira continental e oceânica…”.

A chegada do coral-sol (Tubastrea spp.) ao litoral do Estado, cuja plataforma continental apresenta uma diversidade de substratos duros composta sobretudo por recifes de arenito e de coral, além de algas calcárias, cuja presença justifica a proteção legal de algumas das áreas sob a forma de unidades de conservação marinhas, motivou, em 2021, a elaboração do requisito legal. Isso se deu de forma participativa, com envolvimento de diversos atores interessados e detentores de conhecimento sobre o tema.

Dentre as ações ali estabelecidas, figuram: restrições quanto à instalação de recifes artificiais; proibição da liberação de água de lastro em substratos consolidados, sejam eles naturais ou artificiais; condicionamento do recebimento de plataformas, monoboias e estruturas similares para fins de hibernação e/ou manutenção em portos ou estaleiros a anuência ambiental específica do órgão licenciador; proibição, em regra, dos serviços de limpeza, raspagem, retirada de cracas e demais organismos incrustantes dos cascos das embarcações em ambiente natural no mar territorial e notificação mandatória quando da identificação de espécie exótica invasora durante serviços de inspeção.

Embora não haja garantias quanto à efetiva prevenção da introdução de espécies exóticas diante da adoção das práticas supracitadas, seu uso pode reduzir consideravelmente as chances de aporte e estabelecimento de novas espécies no ambiente aquático.

Diante do desafio de erradicar ou mesmo controlar uma espécie invasora, a combinação entre tais ações e tantas outras que protegem ambientes e espécies nativas de uma bioinvasão representam um cuidado essencial para a gestão de portos, terminais, marinas, estaleiros e instalações afins, sobretudo para aqueles preocupados com a gestão ambiental e a sustentabilidade da sua atividade.

Definições

* Espécie exótica: espécie ocorrendo fora de sua área de distribuição natural passada ou presente.

**Bioinvasão: processo pelo qual uma espécie ou população é transportada para fora de sua área de distribuição natural e introduzida a um novo ambiente, reproduzindo-se e gerando descendentes viáveis e se disseminando de forma a não só ampliar a distribuição geográfica, mas também a ameaçar a diversidade biológica local, com potenciais impactos à sociedade, à economia e à saúde.

Fontes consultadas

• Convenção Internacional sobre Controle de Sistemas Antiincrustantes Danosos em Embarcações (IMO, 2001).
• Convenção Internacional para o Controle e Gerenciamento da Água de Lastro e Sedimentos dos Navios (IMO, 2004).
• Decreto nº 50.351/2021 – Dispõe sobre ações de prevenção, erradicação, controle e monitoramento de espécies exóticas invasoras e proteção da biodiversidade marinha na zona costeira continental e oceânica do Estado de Pernambuco (SEMAS-PE, 2021).
• Portaria Suape 090 (SUAPE, 2021).
• Regulamento de SSMA para embarcações nos Portos do Paraná (APPA, 2022).
• NORMAM – 401 – Normas da Autoridade Marítima para a Prevenção da Poluição Hídrica Causada por Embarcações e Plataformas (DPC, 2023).

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