Por Alicia Lobato
Amazônia Real com edição do Fauna News
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Só há um espaço para receber animais silvestres em funcionamento na capital do Amazonas, o Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas), administrado pelo Ibama. E ele está lotado. Segundo apurou a Amazônia Real, há cerca de 80 animais no local. Só de primatas, são cerca de 40; mais de 20 deles são macacos-prego. Amontoados, os primatas acabam brigando entre si por falta de espaço. E, atualmente, é o único local apto para receber os sauins-de-coleira, espécie de primata endêmica de Manaus e criticamente ameaçada de extinção. Por sorte, no momento, há apenas uma jaguatirica no Cetas de Manaus, mas o número de animais recolhidos no local é considerado muito alto para a estrutura disponível.
Com as queimadas e os incêndios florestais, os resgates de animais aumentaram e a solução tem sido devolvê-los ao habitat rapidamente. Apenas os feridos permanecem para serem tratados. Os Cetas são unidades do poder público para receber animais resgatados em situação de vulnerabilidade, em ações fiscalizatórias, ou entregues pela população. No Amazonas, o único Cetas é mantido pelo Ibama, em Manaus.
A cada dois dias um animal silvestre vem sendo resgatado em Manaus, segundo dados disponibilizados pelo Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), órgão do governo do Amazonas. Nos meses de junho a julho foram registrados 51 resgates, animais fora do ambiente natural que são afetados pela expansão urbana ou ação ilegal como desmatamento e queimadas. No entanto, o Ipaam não possui um centro de triagem de animais silvestres próprio e encaminha os resgatados para o Cetas, do Ibama, ou para outros espaços que recebem animais. O governo do Amazonas mantém uma ação compartilhada com o órgão federal, mas nunca construiu um refúgio para animais silvestres.
São dados preocupantes se levar em conta o boletim diário de queimadas divulgado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Dos dez municípios brasileiros com mais focos acumulados nos últimos cinco meses, dois são do Amazonas: o município de Lábrea está na quarta posição, com 533 focos de incêndio em setembro (até o dia 22) e Apuí encontra-se na sexta posição, com 479 focos.
“Não é incomum, mesmo em uma região extremamente úmida como a nossa, receber um animal no Cetas com marcas de incêndio florestal e queimados. Apesar de que a maior parte dos animais que chegam queimados ao Cetas são por eletro-combustão ou o animal tomou um choque elétrico na linha de alta tensão”, observa o biólogo e coordenador do Laboratório de Interações Fauna e Floresta da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Rogério Fonseca. Traduzindo: cada vez mais animais, têm fugido para as zonas urbanas, onde acabam sendo eletrocutados.
Administrado pelo governo federal, o Cetas atua em colaboração com o governo estadual, que é responsável apenas pelo deslocamento dos animais silvestres encontrados fora do seu hábitat e removidos pelo Ipaam. Para Rogério Fonseca, a atual estrutura do Cetas, em Manaus, é pequena para a quantidade de animais que chegam. “Existe uma sobrecarga muito grande em cima de uma única instituição que é o Ibama, e essa sobrecarga não tem cooperado para a gente cuidar melhor dos animais que chegam”, alerta.
É o Ipaam que informa que se não estiverem feridos, os animais são devolvidos à floresta. Só aqueles que não estão em condições físicas são encaminhados para o Cetas. A Amazônia Real entrou em contato com o Ibama para saber a quantidade de animais que estavam em reabilitação no centro e como o espaço tem sido gerido, mas até a publicação da reportagem não houve resposta oficial à solicitação.
Um dos animais mais ameaçados é o sauim-de-coleira, espécie endêmica de Manaus e em ao menos três municípios próximos à capital amazonense. O sauim-de-coleira está na lista de animais ameaçados de extinção do ICMBio e a cada ano sua população está ficando mais reduzida. Especialistas afirmam que, sem uma política de proteção, ele poderá desaparecer da natureza em menos de duas décadas.
Só um centro de triagem
A capital amazonense chegou a contar com um grande centro de reabilitação para animais silvestres, o Refúgio da Vida Silvestre Sauim Castanheira, localizado na zona leste. Mas em 2016 suas atividades foram encerradas após uma série de furtos de animais terem sido registrados no local. Desde então, a prefeitura não reativou mais o espaço. Para a Amazônia Real, a administração municipal comentou que há apenas a pretensão do retorno da unidade, mas ainda sem previsão para o refúgio voltar a funcionar.
Em nota, a Semmas concorda não ser suficiente a presença de apenas um Cetas na capital, visto que ele tem limitações, e garante que as autoridades estão se organizando para participar “efetivamente da gestão da fauna silvestre no município de Manaus”. A participação efetiva seria o retorno do Refúgio Sauim Castanheira, que está sendo revitalizado..
“Será criado o Parque Municipal Sauim-Castanheiras, que será preparado e estruturado nos moldes do Parque do Mindu, no Parque 10, mas com atividades adicionais distintas, como a reativação da atuação com fauna silvestre e, provavelmente, mais um horto de produção de mudas para arborização de Manaus”, acrescenta a nota.
Para o biólogo, essas atividades distintas precisam ser verificadas nesse novo projeto prometido pela prefeitura, já que o Parque do Mindu é uma unidade de conservação de proteção integral onde o objetivo é preservação das espécies que estão lá dentro, enquanto um centro de triagem de animais silvestres é temporário. A ideia desses espaços provisórios é “para que os animais fiquem ali para se reabilitar e serem posteriormente soltos ou destinados para um zoológico, um criador ou conservacionista. Então são objetivos de gestão e gerenciamento muito diferentes um do outro”, afirma Rogério.
O pesquisador alerta que manter animais em reabilitação em um local aberto ao público pode ser preocupante, se esse tipo de atividade se aproximar mais de um espaço como um zoológico. Rogério afirma que o ideal seria, se esta opção for adotada, que seja um espaço de visitação técnica para alunos de veterinária, biologia e profissionais ligados em ciências naturais.
A Semmas informa, ainda na nota, que o espaço vai funcionar num esquema misto, tanto para a questão da fauna como também para receber o público para visitação. “O espaço é duas vezes maior que o Parque do Mindu, terá o espaço para cuidar dos animais e as pessoas não vão transitar nesse espaço específico”, adianta.