Por Marlon Cezar Cominetti
Biólogo, mestre e doutor em Doenças Infecciosas e Parasitárias pela Faculdade de Medicina pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (Famed-UFMS). É é coordenador do Centro de Reabilitação de Animais Silvestres (Cras) do Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul) em Campo Grande.
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Desde sua fundação em 1987, o Centro de Reabilitação de Animais Silvestres (Cras) de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, já recepcionou mais de 60.800 animais oriundos do Estado e nas condições mais variadas possíveis – de uma simples entrega voluntária até um atropelamento com fraturas múltiplas.
Visto que o ano de 2019 – a duras penas – já foi, um balanço sobre as atividades deste centro é interessante, tanto para divulgar o trabalho quanto pra servir de modelo – positivo ou negativo – para Cras e Cetas que queiram fazer comparações e compreender melhor sua realidade em relação a outras regiões.
Apenas em 2019, mais de 2.360 animais foram atendidos pelo Cras. Se contarmos o período de 2015 a 2019, esse número chega a 14.505. Desses, 2.216 foram mamíferos, 1.780 passeriformes, 1.006 répteis e 7.295 aves não passeriformes.
Para evitar um texto longo e cansativo, coloquei em gráficos esses dados. O gráfico 1 mostra o número de animais recepcionados ao longo desses cinco anos, mostrando uma linha de tendência de diminuição nos recebimentos, apesar de os números totais variarem ao longo dos anos com maiores e menores entradas.
Dos animais mais recepcionados, aves lideram as entradas, visto que a cultura de “ter um passarinho para escutá-lo cantar” ou um “loro para falar” ainda é comum no Estado – apesar de serem pensamentos nacionais. O gráfico 2 apresenta esses dados com maior facilidade de compressão.
Dentro desses grupos, algumas espécies se destacam por sua beleza – pássaros e psitacídeos –, sinantropismo – gambás – ou facilidade de captura e contenção – jabutis.
O gráfico 3 mostra os mamíferos mais frequentemente recepcionados no Cras, sendo o gambá-de-orelha-branca e a capivara os mais frequentes. Ambos são comuns na cidade de Campo Grande e frequentemente invadem residências, como o gambá, ou são atropelados nas vias públicas, como as capivaras.
Entre os répteis (gráfico 4), os jabutis são muito comuns, visto que muitas pessoas ainda capturam esses animais para criarem como pets, mas, com todo ser vivo, eles crescem e dão trabalho. O destino natural desses animais, caso não sejam lançados em alguma das várias áreas de mata da cidade de Campo Grande, acaba sendo o Cras. Também devido a essas áreas verdes, jiboias são relativamente comuns na cidade, criando um misto entre repulsa e curiosidade na população. Felizmente, essas cobras não são mais vistas como “terríveis assassinas” e a população costuma chamar equipes responsáveis para sua captura e encaminhamento ao centro.
Das aves, como já explicado em outros artigos, psitaciformes são os mais comuns. Não estranha o papagaio-verdadeiro estar entre as principais aves que chegam ao Cras (gráfico 5). Além do tráfico, muitas entregas voluntárias são realizadas, garantindo seu número sempre expressivo. Periquitos e maritacas são muito frequentes na época de reprodução, visto que muitos fazem ninhos em forros de residências, o que gera conflito com as pessoas. Entre os passeriformes, os mais frequentes são as espécies comumente encontradas na cidade, como o bem te vi e sabiá laranjeira, que são muito entregues pela população local. Não é incomum também ocorrem apreensões de criações ilegais dessas aves. Tanto que o número de animais que chegam ao centro é relativamente próximo (gráfico 6).
Em geral, não tem sido fácil o trabalho do Cras, visto que ainda enfrentamos o tráfico e a ignorância com relação a nossa fauna. Mesmo assim, temos visto pequenas melhoras no quando geral, com a população tomando – e desejando tomar – mais conhecimento sobre o universo faunístico que a cerca. Espero que a conscientização continue crescendo e que diminua a necessidade de nosso trabalho, pois significaria que a natureza estaria melhor protegida e sofrendo menos impactos antrópicos.
Sonhar, ainda, não custa nada.