
Por Larissa Oliveira Gonçalves
Bióloga e mestre em Ecologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É doutoranda em Ecologia na mesma universidade, atuando no Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (NERF-UFRGS)
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Podemos ficar estarrecidos com os números de animais silvestres atropelados em estradas no Brasil e no mundo. Se pensarmos em perdas de vidas, basta apenas uma morte para nos preocuparmos. Mas o que significa uma morte por atropelamento para uma população? Será que uma já basta para colocá-la em risco ou precisamos de muitas mortes de uma mesma espécie para identificarmos efeitos maiores? O artigo Meia dúzia já basta, escrita pela Júlia Beduschi, relatou estudos que mostram como os atropelamentos de animais silvestres podem ter um efeito drástico nas populações desses animais, usando o tamanduá-bandeira e a anta como exemplos. Hoje, quero relatar um fato que aconteceu no fim do mês de março e reflete muito do que foi discutido na coluna citada: uma onça-pintada foi atropelada na rota 19, estrada que corta o Parque Ecologico Urugua-í, em Misiones, na Argentina.
O que significa esse atropelamento para as populações de onças-pintadas da região?
É preciso lembrar que essa população não se restringe apenas ao país vizinho e à região de Misiones. Evidências genéticas apontam que essas onças pertencem à mesma população que chega até o Parque Estadual do Turvo, único local no estado do Rio Grande do Sul onde ainda existem onças, e também ao Parque Nacional do Iguaçu, no Paraná (toda essa região é chamada de Corredor Verde por esses estudos). Por ser um mamífero de grande porte, já podemos dizer que esse atropelamento tem um importante reflexo na população dessa espécie, visto que ela é uma espécie ameaçada de extinção e com populações tendendo ao declínio.
Agora, imagine se essa onça estivesse em plena idade reprodutiva e grávida de dois filhotes. Pois então, esse foi o cenário encontrado: uma onça-pintada atropelada e, com isso, três mortas! Com certeza, o reflexo na população daquela localidade será grande.
Um trabalho sobre as populações de onças-pintadas da Mata Atlântica usando informações genéticas mostrou que as populações da região costeira apresentam baixos níveis de diversidade genética e um pequeno tamanho populacional efetivo estimado em 7,9 indivíduos (o tamanho populacional efetivo é menor do que o tamanho real da população, pois representa apenas os indivíduos que se reproduzem e conseguem deixar descendentes).
A situação da região onde essa fêmea grávida foi morta também é preocupante. Um estudo de dez anos atrás estimou que havia de 25 a 53 onças adultas na região do Corredor Verde. Uma estimativa apresentada pela Red Yaguareté (uma Fundação Argentina que apoia a conservação das onças-pintadas) alerta para o fato de que há 250 onças na Argentina, mas que na região de Misiones há menos que 70 indivíduos.
Não sabemos exatamente como esse atropelamento afetará a população a curto ou a longo prazos, mas sabemos que essa é uma população ameaçada e a perda de indivíduos deveria ser minimizada. Se você quiser ajudar de alguma forma, pode começar participando do abaixo assinado que está em andamento. Organizado pela Red Yaguareté, ele pede que sejam instalados redutores de velocidade e radares nas rotas 12 e 101, em Misiones, com o objetivo de reduzir os atropelamentos.
Basta clicar aqui!