
Por Dimas Marques
Jornalista, pesquisador do Diversitas-USP e editor responsável do Fauna News
dimasmarques@faunanews.com.br
Valdivino Honório de Jesus, 62 anos, natural de Governador Valadares (MG), casado, residente no Distrito de Bom Jesus, zona rural de Junco do Seridó (PB), assistente administrativo na Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado da Paraíba (Emepa).
Desde 1996, esse homem já foi preso 14 vezes com animais silvestres. Sua última prisão, em 29 de outubro de 2016, foi exibida em uma reportagem especial do programa Fantástico, da Rede Globo, que abordou os maiores traficantes de animais do Brasil segundo levantamento do Ibama e a impunidade envolvendo essa prática criminosa.
E Valdivino foi apontado como o maior traficante de fauna silvestre do Brasil.
De acordo com o procurador da República em Patos (PB), Tiago Misael de Jesus Martins, desde 2002, o Ibama apreendeu 3.775 animais, principalmente aves, com Valdivino. Em seu pedido à Justiça para que Valdivino, sua companheira Elizabeth Morais de Medeiros, seu fllho Aureliano Gomes de Jesus e sua cunhada, Edilza Morais de Medeiros Nóbrega, fossem conduzidos coercitivamente para serem ouvidos (há suspeita da participação deles no tráfico), o procurador do Ministério Público Federal não tem dúvida que os animais apreendidos eram destinados ao abastecimento do mercado ilegal de fauna silvestre.
Martins vai além. “Não é preciso dizer que esse número desconsidera aqueles animais não apreendidos, ou seja, contando-se a cifra negra desse comércio, estima-se que o número de animais traficados chegue facilmente cem vezes os animais apreendidos”, conclui.
Valdivino voltou a ser notícia em 12 de setembro. A partir de um pedido de Martins, a Justiça determinou que a Polícia Federal cumprisse mandados de condução coercitiva e de busca e apreensão nas casas de Valdivino e Elizabeth, de Aureliano e de Edilza. A intenção de Martins, que conduz uma investigação sobre a última prisão do acusado (a registrada pelo Fantástico) era ouvir separadamente cada um dos quatro suspeitos e tentar encontrar provas contra eles. Durante a ação policial, jabutis e aves foram apreendidos na casa de Aureliano, que, assim como seu pai, também já foi preso com animais silvestres.
Como os crimes praticados por Valdivino não dão cadeia no Brasil (a legislação é fraca) e as multas aplicadas contra ele, que por sinal nunca foram pagas, não são suficientes para controlar a sanha do investigado por comercializar animais silvestres de forma ilegal, Martins solicitou à 14ª Vara Federal da Seção Judiciária da Paraíba a aplicação de algumas medidas cautelares. A Justiça determinou o comparecimento mensal em juízo para justificar suas atividades, a proibição de ausentar-se da Comarca de Junco do Seridó, onde atualmente reside, o recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o acusado tiver residência e trabalho fixos e o pagamento de uma fiança de R$ 40 mil.
O procurador Martins considera que Valdivino desdenha da Justiça Penal,
Mais do que isso, se forem relembradas com detalhes as prisões do investigado, é fácil concluir que ele também desdenha da vida dos outros seres.
Às 22h de 15 de maio de 2012, Valdivino sofreu um acidente de carro na altura do km 52 da BR-116, próximo à ponte do Rio Bonito, em Campina Grande do Sul, região metropolitana de Curitiba (PR). Assim que uma viatura da Polícia Rodoviária Federal se aproximou para verificar o ocorrido, os patrulheiros viram que, com o impacto, gaiolas foram lançadas para fora do veículo. E, ali perto, o investigado estava estrangulando algumas aves e as jogando no rio sob a ponte.
Valdivino transportava 40 aves, sendo que 33 morreram. Sete delas ainda foram socorridas com vida: uma ararajuba, três araras, um corrupião, um trinca-ferro e um azulão.
Mesmo preso, recebia salário
Valdivino também responde a uma ação civil pública por ato de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público da Paraíba. O MP acusa o infrator de receber salário e ter ajuda de alguém para assinar seu ponto de presença durante as viagens para traficar animais.
Maior traficante é o que foi mais vezes preso
Os números de Valdivino impressionam. Seja pela quantidade de prisões, de animais com ele apreendidos ou de multas que recebeu. Também chama a atenção a crueldade ao friamente estrangular aves. Mas, apesar da fama de maior traficante de fauna do país, ele não é um sujeito rico. morando em imóveis simples, possuindo um carro popular (Celta) e não tendo muito para ostentar – basta verificar em seus perfis em rede social (ele tem mais de um).
É difícil acreditar que Valdivino seja o maior traficante de fauna do Brasil – apesar de a estimativa de animais vendidos por ele do Ministério Público Federal ser assustadora: cem vezes mais que os quase quatro mil bichos apreendidos em seu poder. A quantidade de animais e o tempo de atuação dele ajudam a sustentar a fama, que foi criada a partir da quantidade de prisões registrada.
Agora, se o critério for o dinheiro, aí a coisa muda. Os grandes traficantes, que conseguem altas cifras, passam então a estar em criadouros e outros ramos do tráfico de fauna.
Uma certeza dá para ter sobre Valdivino: na escola do crime, ele faltou às aulas de como evitar ser preso.
– Assista a reportagem do Fantástico que mostra Valdivino
– Releia "Editor do Fauna News participa de reportagem do Fantástico", publicado em 5 de dezembro de 2016 pelo Fauna News
– Releia "Impunidade e vergonha: homem é preso pela 13ª vez traficando animais", publicado em 2 de junho de 2016 pelo Fauna News