“Seu hipócrita!” Se eu gosto de animais, posso defender zoológicos?

“Seu hipócrita!” Esse foi o xingamento que ouvi durante uma reunião. Eu acabara de defender os zoológicos e a pessoa que me agredia se referia às minhas críticas, contra zoológicos, na internet e em audiência dentro Congresso Nacional. Eu explico.

Zoológicos são os únicos empreendimentos de fauna no Brasil para os quais temos regras de tamanho de recintos e condições nas quais os animais devem ser mantidos. Também são os únicos que possuem uma lei própria, a Lei n° 7.173/1983 que, aliás, em seu artigo primeiro, define como zoológico qualquer coleção de animais silvestres nativos ou exóticos expostos à visitação pública.

Se existe lei, eu cumpro a lei. Mas isso não me anula como cidadão de uma democracia. E, nesse contexto histórico e democrático, eu posso agir politicamente, dentro e fora do Congresso Nacional, para mudar as leis. Afinal, as mulheres já foram proibidas de votar, a escravidão no Brasil já foi normal, o racismo agora é crime, brasileiros podem se divorciar… Essas e outras questões demonstram como a cultura e a consciência evoluem e, igualmente, as leis de um país.

Não temos mais zoológicos humanos mas, como humanidade, já cometemos tal crime. Então, eu não apenas posso, mas devo falar contra a exploração animal. O cativeiro pela diversão, uma vida toda de prisão para serem exibidos. Isso não é ético e, se não for agora, certamente em algum momento futuro essa percepção moral será maioria na sociedade. Assim, ontem e hoje contraímos mais uma dívida histórica da qual nos envergonharemos, no futuro, pelos crimes do passado. Eu já me envergonho hoje.

Quando crítico zoológico, não crítico a conservação ex-situ (em cativeiro). Mas hipocrisia é usar a conservação ex-situ de algumas poucas espécies para justificar a prisão de centenas delas. Já se perguntou quantas espécies em nossos zoológicos estão realmente envolvidas em projetos de conservação? Visite um zoológico comum, qualquer um deles. Anote quantas espécies estão representadas lá. Pergunte quantas delas participam de projetos oficiais de conservação. Atenção: não é se aquela espécie possui algum projeto no mundo, é se aquele zoológico e aqueles indivíduos participam de projetos de conservação. Você irá se surpreender.

Zoológico que não é zoológico

Mas por que, então, me chamaram de hipócrita? Por que eu estava defendendo zoológicos? Respondo: porque criadores de animais estavam pleiteando (e conseguiram isso em norma, que nesta parte é ilegal) que pudessem realizar visitas em seus criadouros. Ué, mas por que, então, eles não se registram como zoológicos? Porque como zoológicos, eles terão que adequar seus recintos, ter biólogo e veterinário contratados e se adequar a outras exigências de lei. O jeitinho brasileiro criou, ilegalmente, um zoológico que não é zoológico.

A grande crítica a zoológicos é a visitação. Mas eles devem seguir uma lei. Agora. imaginem um local com visitação, mas que não siga nem a lei de zoológicos? Perdi a votação e a possibilidade de visitação existe em norma desde 2018.

Já são pouco mais de seis anos que fui chamado de hipócrita por defender os animais. Afinal, argumentava que se queriam visitação e cobrar entrada, então que, ao menos, se enquadrassem como zoológicos. Hipocrisia seria dizer que gosto dos animais e não defendê-los.

Continuarei respeitando as leis, inclusive a de zoológicos. Mas, óbvio, lutando para mudá-las, pois um domingo de diversão não vale uma vida de prisão. Em algum momento, no futuro, terei orgulho de ter estado do lado certo neste caminho da humanidade. E você, em qual lado está?

O texto reflete posição pessoal e não, necessariamente, institucional.

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