Ano novo, vida nova. A expressão não poderia ser mais verdadeira para o grupo de sete bugios que no último ano teve sua vida limitada pelas paredes de um recinto e, logo no segundo dia de 2024, ganhou a liberdade e a floresta. Os animais estavam desde abril em um recinto de aclimatação dentro do Parque Nacional da Tijuca, no Rio de Janeiro (RJ). A soltura, que ocorreu em 2 de janeiro, consagra a retomada do esforço, coordenado pelo Refauna, de trazer de volta esse primata para a floresta carioca.
Os novos moradores da Tijuca se somam a um grupo de outros oito bugios – também fruto das reintroduções do projeto – numa iniciativa que aos poucos preenche o silêncio e o vazio da floresta com seus habitantes originais.
Os bugios-ruivos (Alouatta guariba) são primatas nativos da Mata Atlântica, com uma distribuição que vai da Bahia até o Rio Grande do Sul e se estende até a Argentina – onde a situação da espécie é particularmente crítica. Historicamente ameaçada pela destruição do bioma na costa brasileira, a espécie havia desaparecido das florestas cariocas há mais de um século.
O grupo recém solto é formado por sete indivíduos. Dois adultos – um macho e uma fêmea – com origem e experiência de vida livre e outros cinco filhotes nascidos em cativeiro no Centro de Primatologia do Estado do Rio de Janeiro (CPRJ), onde estavam os animais. Por estarem presos, foram todos vacinados contra a febre amarela, doença letal para esses macacos.
Como foi a soltura na floresta
A soltura foi bem-sucedida e, aos poucos, os bugios se acostumam com a liberdade da floresta.
Todos saíram do interior do recinto em poucos minutos, como esperado. Foi tudo bem, mas alguns indivíduos ainda não foram para as árvores, estão ficando no teto do recinto”, conta o coordenador da Reintrodução de Bugios-Ruivos na Floresta da Tijuca do Refauna, Matheus Travassos.
De acordo com o biólogo, os meses de aclimatação são importantes para que os bugios se acostumem com o ambiente da floresta e aprendam a conhecer as árvores próximas, os sons e os cheiros. “Isso suaviza o processo e diminui o impacto do lugar novo”, explica o coordenador. Além disso, foi feito um trabalho de introdução de plantas nativas na dieta dos animais para ensiná-los quais alimentos eles devem buscar depois de soltos.
A hora certa de abrir o recinto foi definida pelo momento em que o comportamento dos bugios está estabilizado, dentro do padrão para espécie, sem estresse ou medo, e quando eles já tiverem sido apresentados a uma quantidade considerável de plantas nativas. Com todos os requisitos cumpridos, foi dado sinal verde para a soltura.
Monitoramento pós-soltura
O trabalho dos pesquisadores, entretanto, continua com o monitoramento, que será diário durante este primeiro mês em liberdade. Como os animais não possuem nenhum dispositivo de rádiotelemetria – o que ajudaria a encontrá-los na floresta –, a equipe do Refauna está se revezando para não os perder de vista. Todo dia, até o começo de fevereiro, os pesquisadores os acompanham do nascer do sol, quando os macacos começam a sua atividade, até o poente, quando eles se recolhem numa árvore para dormir.
Após esse primeiro mês intenso ao lado dos bugios, o monitoramento passará a ser mais esporádico, “umas duas vezes por semana”, conta Matheus.
A reintrodução dos bugios no Parque Nacional da Tijuca é um trabalho que começou em 2015, quando o Refauna fez a primeira soltura dos macacos na floresta. A iniciativa, entretanto, precisou ser paralisada nos anos seguintes, diante do surto de febre amarela que atingiu a região Sudeste.
Uma das grandes expectativas dos pesquisadores é ver a interação entre os animais recém-libertos e o grupo de bugios que já vive na floresta. “Ouvimos a vocalização do outro grupo ontem e hoje. Acredito que em breve deve rolar [a interação]”, torce o coordenador.