Seja no Brasil, seja no Equador, ONGs que atuam com animais silvestres vivem de “pires na mão”

Dimas Marques
  • Dimas Marques

    Editor-chefe

    Formado em Jornalismo e Letras, ambos os cursos pela Universidade de São Paulo. Concluiu o curso de pós-graduação lato sensu “Meio Ambiente e Sociedade” na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo com uma monografia sobre o tráfico de fauna no Brasil. É mestre em Ciências pelo Diversitas – Núcleo de Estudos das Diversidades, Intolerâncias e Conflitos da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, onde pesquisou a cobertura do tráfico de animais silvestres por jornais de grande circulação brasileiros. Atua na imprensa desde 1991 e escreve sobre fauna silvestre desde 2001.

    Fauna News
18 de maio de 2011
Esta semana, ocasionalmente, chegou às minhas mãos um exemplar do jornal El Universo, do Equador. Na edição de 15 de maio, o veículo publicou “Centros de rescate intentan resolver una falencia estatal”. Enquanto lia a matéria tive a impressão de estar com um jornal brasileiro em minha frente, em que era exposta a incompetência estatal no manejo de animais silvestres apreendidos.

As informações veiculadas naquele jornal confirmaram aquilo que eu já sabia: centros de recepção de animais silvestres privados ou de ONGs, que suplementam o precário trabalho do setor público nesse campo, vivem de “pires na mão” na tentativa de conseguir recursos para se manter. No Equador, a falta de capital é tão crítica que a infraestrutura desses centros é totalmente precária.

O El Universo baseou-se em um documento de 2008 que contém análises de 23 das 135 Unidades de Manejo da Vida Silvestre registrados pelo governo federal. O jornal não informa com exatidão se essas instituições são particulares e de ONGs ou se também foram verificadas unidades do poder público – pelo título e o transcorrer da matéria, é mais provável que se trate de centros mantidos por particulares ou organizações não governamentais. Do total analisado, 91% recebem animais vítimas do tráfico e, destas, 57% não tem infraestrutura adequada para esse tipo de atendimento.

Primata em centro de resgate da vida silvestre no Equador

Foto: El Universo

““El tráfico ilegal de vida silvestre es una de las principales causas de la pérdida de biodiversidad en el país”, afirma el informe Situación actual de los centros de rescate de vida silvestre, presentado en el 2008 por la Unidad de Vida Silvestre del Ministerio del ambiente. Después de analizar 23 de las 135 Unidades de Manejo de Vida Silvestre (UMVS) registradas en el MAE, que incluye, entre otros, a centros de rescate y zoológicos, el documento concluye que el 91% de estas unidades recibe activamente animales rescatados del tráfico ilegal. Sin embargo, el 57% de estas no cuenta con instalaciones ni personal adecuado.” (texto do jornal)

Apenas cinco unidades têm um biólogo e um veterinário permanentes, nove contam com um veterinário fixo  e o restante recebe apenas visitas esporádicas desses profissionais. A matéria relata uma série de absurdos como o acima descrito, como falta de áreas para triagem dos animais recebidos, para quarentena e para hospitalização dos animais. O básico, que seria fichas com a identificação correta dos espécimes, também deixa a desejar.

A situação é tão precária que 65% das unidades já registraram fugas de animais. A falta de apoio do governo fica clara pelo fato de que alguns desses centros arrecadarem dinheiro com a exibição pública de alguns bichos.

“Lo dicho en el documento es reconocido por el director de Pro Bosque, pero añade: “Nosotros (los centros de rescate) estamos intentando, en las medidas de nuestras posibilidades, resolver un problema (la rehabilitación y cuidado de fauna silvestre) que debería resolver el Estado”. Agrega que el contacto con el MAE – sigla do Ministério do Meio Ambiente do Equador –  se da solo una vez al año: en el momento de renovar la patente.” (texto do jornal)

Brasil
A pobre infraestrutura de atendimento a animais silvestres do poder público brasileiro motiva às ONGs a suprirem essa deficiência. Da mesma forma como acontece no Equador, o trabalho de muitas dessas instituições, que sobrevivem sem auxílio dos governos, também acaba ameaçado pela falta de recursos – mesmo aquelas que mantêm organização e procedimentos adequados.

Em Itu, no interior de São Paulo, o Projeto Mucky, que atua na proteção à primatas, é um exemplo.

“Há 25 anos ajudando no combate ao tráfico de animais, a entidade tem uma dívida de R$ 120 mil, proveniente de juros bancários, pagamento de funcionários e ex-funcionários. A Organização Não Governamental (ONG) conta com doações, empresas parceiras e ações filantrópicas para manter-se. O projeto conta com uma equipe de 16 pessoas, para atendimento 24h de 214 primatas. Muitos desses animais foram encontrados desnutridos, cegos, com membros fraturados ou amputados ou com problemas de locomoção, devido às lesões sofridas pela manutenção indevida de silvestres como animais de estimação.” (texto do jornal Cruziero do Sul – edição de 14 de abril)

“Não recebemos um centavo sequer do governo federal, estadual ou municipal. Isso faz com que passemos por muitas dificuldades. Há dias, por exemplo, que não temos dinheiro para colocar combustível no carro para buscar alguma doação”, afirma a fundadora e coordenadora do projeto, Lívia Botar.

– Leia a matéria do jornal El Universo.
– Leia a matéria sobre a crise do Projeto Mucky – Jornal Cruzeiro do Sul (Sorocaba – SP)
– Leia a matéria sobre a crise do Projeto Mucky – Agência de Notícias de Direito dos Animais.
– Conheça o Projeto Mucky.

– Assista ao vídeo do Projeto Mucky (pedido de ajuda):


Fauna News

Sobre o autor / Dimas Marques

Formado em Jornalismo e Letras, ambos os cursos pela Universidade de São Paulo. Concluiu o curso de pós-graduação lato sensu “Meio Ambiente e Sociedade” na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo com uma monografia sobre o tráfico de fauna no Brasil. É mestre em Ciências pelo Diversitas – Núcleo de Estudos das […]

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