Estudo publicado na revista Scientific Reports sugere que as comunidades de peixes que habitam os recifes da costa brasileira são resilientes a alterações ambientais decorrentes das mudanças climáticas, entre elas o declínio dos corais.
A pesquisa foi conduzida no âmbito do projeto Recifes Brasileiros no Antropoceno (ReefSYN), do Centro de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (SinBiose/CNPq), e contou com apoio da Fapesp.
“Devido à alta sedimentação e à influência de água doce dos rios, os recifes brasileiros apresentam uma cobertura de corais e complexidade estrutural baixas em comparação a outras regiões, como o Caribe. Por isso, são chamados de recifes ‘marginais’. O estudo mostrou que as comunidades de peixes nesses locais são resistentes a mudanças climáticas que influenciam negativamente as comunidades de corais”, explica Juan Quimbayo, coautor do estudo e bolsista de pós-doutorado no Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo (CEBIMar-USP).
Os resultados contrastam com o que ocorre nos oceanos do Indo-Pacífico e Caribe, onde o declínio de corais frequentemente leva ao colapso geral de todo o ecossistema recifal. É possível, portanto, que os peixes em recifes brasileiros consigam se adaptar melhor a um futuro com menos corais, que são extremamente sensíveis às mudanças climáticas.
Diversidade de peixes
Mesmo não sendo muito abundantes, os corais do litoral brasileiro favorecem a ocorrência de peixes e ajudam a aumentar a diversidade desses animais nos recifes. “As colônias de corais oferecem muitos recursos para os peixes, como abrigo e alimentação. Por isso, cerca de 40% das espécies de peixes analisadas, de um total de 113 espécies, têm maior probabilidade de ocorrer em locais com maior abundância de corais”, conta André Luza, primeiro autor do estudo e pesquisador de pós-doutorado na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
Para chegar aos resultados, os pesquisadores fizeram modelagens computacionais a partir da observação de peixes recifais em 36 pontos distribuídos ao longo dos 8 mil quilômetros de litoral brasileiro. A coleta de dados consistiu na instalação de câmeras cobrindo dois metros quadrados em vários sítios de coleta, resultando em aproximadamente 4 mil horas de filmagens.
“Foram inúmeras câmeras para registrar a atividade dos peixes nos recifes. Com isso, foi possível associar a atividade dos peixes sobre os organismos fixos no fundo do mar, em uma escala bem fina”, diz Mariana Bender, professora da Universidade Federal de Santa Maria e coordenadora do ReefSYN, que também assina o estudo.
Segundo os autores, os peixes recifais brasileiros provavelmente manterão boa parte das funções ecológicas que realizam, apesar dos declínios de corais induzidos pelo clima e a consequente perda de espécies associadas aos corais.
Os pesquisadores ressalvam, porém, que as análises foram feitas apenas em computador e os corais não foram removidos experimentalmente para identificar outros efeitos sistêmicos. Não se sabe, por exemplo, quais impactos em cascata podem ocorrer com a retirada de espécies do ecossistema ou se a sobrepesca já afetou as funções ecológicas dos peixes recifais.
Ainda assim, os resultados contribuem para um planejamento das estratégias de conservação de recifes brasileiros focadas em refúgios climáticos, ou seja, na priorização de ambientes capazes de se adaptar às mudanças do clima.
O que são recifes
Os recifes são estruturas formadas por esqueletos de invertebrados sobre as rochas das porções mais rasas dos oceanos. Esses ecossistemas ocupam apenas 0,000063% da superfície terrestre, mas abrigam pelo menos um quarto do conjunto da fauna e flora marinhas.
Devido à pesca, poluição e às mudanças climáticas, essas espécies estão em declínio globalmente. Estima-se que 14% dos corais do mundo desapareceram entre 2009 e 2018, o que representa cerca de 11.700 quilômetros quadrados.