
Por Jefferson Leite
Veterinário especialista em Perícia Médica Veterinária e em Saúde Pública, coordenador do Núcleo de Prevenção e Controle de Arboviroses do Centro de Controle de Zoonoes de Mogi das Cruzes (SP) e clínico de animais domésticos e silvestres.
nossasaude@faunanews.com.br
Sou médico veterinário formado há 23 anos pela Universidade de Alfenas (MG) e há quinze anos trabalho no Centro de Controle de Zoonoses de Mogi das Cruzes (SP). Atualmente, sou um dos coordenadores do Núcleo de Prevenção e Controle de Arboviroses do município. Também sou clínico de animais domésticos e animais silvestres e atendo em meu consultório particular, desde minha formação. Neste nosso primeiro encontro, vamos falar sobre a definição, aspectos históricos e sobre as relações entre zoonoses e animais silvestres. Nas nossas próximas conversas, pretendo trazer informações mais pormenorizadas de algumas dessas doenças e as suas formas de contágio e prevenção, sempre com o foco na fauna silvestre.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, zoonoses são infecções naturalmente transmissíveis entre animais vertebrados e os seres humanos. Ainda segundo esse mesmo órgão, existem mais de duzentas zoonoses catalogadas e distribuídas por diversas partes do planeta.
Pode-se dizer que um possível primeiro registro de zoonose que se tem notícia foi de um tipo de artrite deformante, encontrado por paleontólogos em fósseis de homem de Neanderthal e ursos, que coabitaram cavernas há 50 mil anos. Porém, é no período neolítico, a partir de oito mil anos antes de Cristo, que as condições favoráveis para transmissão desse tipo de doença se ampliaram. Foi nessa época, nos primórdios da agricultura e da domesticação dos animais, que o houve o início da fixação do homem na terra, com a formação de aldeias e cidades. Estreitou-se, então, o convívio entre humanos e animais.
Podemos dizer que as zoonoses moldaram a história da humanidade. A raiva, a peste bubônica, a febre amarela e diversas outras moléstias mudaram, e até hoje influenciam, o comportamento humano. Já outras importantes epidemias, como a Influenza H1N1, a AIDS, não são mais considerados zoonoses, mas tem sua origem no contato do homem com animais.
Os animais domésticos ainda são os principais transmissores de zoonoses, porém, animais silvestres são importantes reservatórios e portadores dessas enfermidades, oferecendo um grande risco de disseminação dessas para a população humana.
A expansão imobiliária sobre áreas verdes, que provoca um enorme desequilíbrio e facilita o contato de pessoas com a fauna nativa, o consumo de carne de caça e, principalmente, o tráfico de animais silvestres são as principais formas de disseminação dessas doenças. A manutenção de animais silvestres em cativeiro, quando esses são provenientes do comércio ilegal, é pior ainda por ser uma atividade de grande risco. Nesses casos, desconhecemos a procedência do exemplar, não temos um histórico da sua situação clínico-epidemiológica e ainda o estresse de captura, de transporte e a modificação dos hábitos alimentares podem levar a um quadro de imunossupressão e facilitar o aparecimento de infecções com potencial zoonótico.
As diferentes formas convívio e contato com animais silvestres não são isentas de riscos e por isso o conhecimento é importante. Nem sempre é possível contar com a ação de vacinas, antibióticos e outros medicamentos. Na verdade, muitas vezes não é possível nem se identificar, em tempo, o agente causador de uma zoonose. Como muitas dessas enfermidades transmitidas por animais tem grande capacidade de provocar mortes e incapacidades permanentes em humanos, a prevenção ainda é o melhor negócio.