
Por Elisângela de Albuquerque Sobreira
Médica Veterinária e mestre em Ecologia e Evolução pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Doutoranda em Animais Selvagens pela Universidade Estadual Paulista (Unesp/Botucatu). Já foi Gerente do Centro de Controle de Zoonoses (CCZ) de Anáplois (GO), onde fundou e mantém o Centro Voluntário de Reabilitação de Animais Selvagens (CEVAS)
nossasaude@faunanews.com.br
A esporotricose é uma micose subcutânea que acomete o homem e uma grande variedade de animais, tendo como agente causal fungos do complexo Sporothrix schenckii. A ocorrência da doença em animais domésticos no Brasil tem sido descrita em cães, gatos, mulas e burros. Ocorre também em primatas, canídeos e felídeos de vida livre. Infelizmente esta enfermidade é pouco estudada e negligenciada na saúde pública.
Considerada um grande problema de saúde pública devido ao aumento do número de casos zoonóticos descritos, a esporotricose é uma doença cuja transmissão do agente etiológico para as pessoas ocorre especialmente pela arranhadura ou mordedura de felinos domésticos infectados. As lesões nos felinos podem aparecer como feridas pequenas, penetrantes, drenantes e não são prontamente diferenciáveis de abscessos bacterianos ou celulites causadas por mordidas e arranhões em brigas entre gatos. As lesões geralmente estão localizadas na cabeça e extremidades, mas ao se lamberem, a doença pode se espalhar para outras áreas.
Normalmente, a infecção se dá por inoculação cutânea de conidióforos (uma parte do fungo) infecciosos através de trauma. O isolamento de Sporothrix schenckii em diferentes espécies de animais doentes e aparentemente sadios constitui evidências da transmissão da enfermidade através de arranhadura, mordedura ou contato com os enfermos em áreas endêmicas. As lesões são caracterizadas por grande quantidade de leveduras, sendo que ulceram e eliminam um líquido (exsudato sero-hemorrágico). Essa superpopulação de fungos potencializa a capacidade infectante das lesões, quer ao homem quer a outros animais.
Os animais, ao lamberem as lesões, podem espalhar a doença para áreas distantes como a face, orelhas e as extremidades, tendo um período de incubação de três meses.
O período de incubação varia de três dias a seis meses, tendo uma média de três semanas. No tecido subcutâneo, desenvolvem pequenos nódulos de um a três centímetros de diâmetro no local da inoculação e, à medida que a infecção atinge os vasos linfáticos, desenvolvem um cordão de novos nódulos, ocorrendo pústula local ou ulceração. A infecção se desenvolve por difusão hematogênica ou tecidual do local inicial da inoculação para ossos, pulmão, fígado, baço, testículos, trato gastrointestinal ou sistema nervoso central.
Pode ocorrer expansão secundária do Sporothrix schenckii para a superfície articular e ossos, ou disseminação para o sistema nervoso central, trato genito-urinário ou pulmão. A forma disseminada pode apresentar sinais de comprometimento sistêmico. Esta forma pode resultar em doença sistêmica grave, podendo os linfonodos internos, baço fígado, pulmão, olhos, ossos, músculos e sistema nervoso central serem acometidos.
A esporotricose disseminada é rara, porém potencialmente fatal, e pode se desenvolver caso haja negligência das formas cutânea e linfocutânea. Embora a enfermidade sistêmica encontre-se ausente, a enfermidade crônica pode resultar em febre apatia e depressão.
Nos seres humanos, a doença se manifesta na forma de lesões na pele, que começam com um pequeno caroço vermelho, que pode virar uma ferida. Geralmente aparecem nos braços, nas pernas ou no rosto, às vezes formando uma fileira de carocinhos ou feridas. Como pode ser confundida com outras doenças de pele, o ideal é procurar um dermatologista para obter um diagnóstico adequado.
Deve-se suspeitar de esporotricose em qualquer animal com lesões de pele, supurativas ou ulcerativas, especialmente quando estas lesões são refratárias ao tratamento antibiótico. É importante que os animais suspeitos sejam adequadamente contidos para evitar mordeduras e arranhaduras. Durante o atendimento clínico, devem ser utilizadas luvas, sendo que após a manipulação do animal, os profissionais devem lavar adequadamente as mãos, descartar o material utilizado e esterilizar o local do procedimento.
O tratamento recomendado, na maioria dos casos humanos e animais, é o antifúngico itraconazol, que deve ser receitado por médico ou veterinário. A dose a ser administrada deve ser avaliada por esses profissionais, de acordo com a gravidade da doença. Mas, dependendo do caso, outros fármacos podem ser usados. Reforçamos: a administração do medicamento só deve ser feita após avaliação médica ou veterinária.