
Por Elisângela de Albuquerque Sobreira
Médica Veterinária e mestre em Ecologia e Evolução pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Doutoranda em Animais Selvagens pela Universidade Estadual Paulista (Unesp/Botucatu). Já foi Gerente do Centro de Controle de Zoonoses (CCZ) de Anáplois (GO), onde fundou e mantém o Centro Voluntário de Reabilitação de Animais Selvagens (CEVAS)
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Observação: a coluna Os Silvestres e a Nossa Saúde, publicada quinzenalmente às terças-feira, passa a ser comandada por Elisângela. Agradecemos a colaboração do veterinário Jefferson Leite que brilhantemente iniciou a coluna no Fauna News.
Obrigado, Jefferson. Bem-vinda, Elisângela!
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A hanseníase é uma zoonose, doença crônica, infectocontagiosa, cujo principal agente etiológico (causador) é o Mycobacterium leprae. Esse bacilo (tipo de bactéria) tem a capacidade de infectar grande número de indivíduos, no en¬tanto poucos adoecem. A doença atinge pele e nervos periféricos podendo levar a sérias incapacidades físicas. A hanseníase é uma doença de notificação compulsória em todo o território nacional e de investigação obrigatória.
Essa zoonose é transmitida principalmente pelo tatu-galinha (Dasypus novemcinctus) quando mantido em cativeiro como animal de estimação e caçado ilegalmente para consumo humano.
De todos os Xenartras (superordem a que pertence a espécie), o tatu-galinha é o de mais ampla distribuição. Ocorre desde o sul dos Estados Unidos, passando pela América Central até a Argentina. É encontrado em todos os principais biomas brasileiros (Amazônia, Mata Atlântica, Caatinga, Campos Sulinos e no Cerrado). Mede cerca de 60 cm de comprimento e pesa entre 3 a 4 kg. Sua alimentação consiste basicamente em invertebrados, mas ocasionalmente pode se alimentar de material vegetal, pequenos vertebrados e ovos. Também é um excelente nadador podendo inclusive se alimentar na água. A reprodução ocorre em média uma vez por ano. A gestação dura entre 110 a 120 dias da qual normalmente nascem quatro filhotes. Ocorre nessa espécie um fenômeno chamado de poliembrionia, que consiste na formação de vários embriões a partir de um único óvulo. Nesse caso, os filhotes do tatu-galinha nascem com a mesma carga genética e o mesmo sexo. Há registros de animais que viveram pouco mais de 20 anos em cativeiro. É muito caçado, sobretudo no Cerrado pela sua carne.
A hanseníase tem cura, porém exige tratamento prolongado para não desencadear problemas ao paciente ou a transmissão da bactéria para indivíduos de convívio próximo. Nos dias de hoje, sabe-se que não há necessidade do isolamento dos indivíduos, pois o SUS fornece a medicação necessária para recuperação dos portadores da doença.
Geralmente, leva um ano ou dois para limpar totalmente o microrganismo do corpo. O distúrbio ocasiona manchas esbranquiçadas em áreas como mãos, pés e olhos, mas também podem afetar o rosto, as orelhas, nádegas, braços, pernas e costas. Se não for tratada, a hanseníase pode causar danos nos nervos tão grave que as pessoas perdem a sensibilidade nos dedos das mãos e pés, levando à deformidade e a incapacidade motora nas mãos. Enquanto o microrganismo ataca a pele, as mãos e os pés dos seres humanos, ele tende a infectar o fígado, baço e os linfonodos dos tatus.
Portanto, retirar animais da natureza é uma atitude que vem desencadeando não apenas uma drástica ameaça à fauna com conseqüente diminuição da diversidade biológica, mas também um severo problema de saúde pública devido ás transmissões de zoonoses. A carência da literatura científica sobre o assunto dificulta o tratamento na maioria dos casos, fazendo com que as pessoas carreguem essa enfermidade para o resto de sua vida.