
Por Elisângela de Albuquerque Sobreira
Médica Veterinária e mestre em Ecologia e Evolução pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Doutoranda em Animais Selvagens pela Universidade Estadual Paulista (Unesp/Botucatu). Já foi Gerente do Centro de Controle de Zoonoses (CCZ) de Anáplois (GO), onde fundou e mantém o Centro Voluntário de Reabilitação de Animais Selvagens (CEVAS)
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A leishmaniose é uma zoonose tropical e reemergente, que se destaca dentre aquelas mais negligenciadas por incidirem em grupos populacionais de países em desenvolvimento e não serem prioritárias para investimentos em pesquisas pelo poder público. Existem dois tipos de leishmaniose: a leishmaniose cutânea (tegumentar) e a leishmaniose visceral (calazar). A primeira é conhecida como “ferida brava” e caracteriza-se por feridas na pele. Já a leishmaniose visceral é sistêmica e ataca órgãos internos, principalmente o fígado, o baço e a medula óssea.
As principais espécies de animais silvestres consideradas reservatórios da leishimaniose cutânea são o cachorro-do-mato (Cerdocyon thous), o tatu-galinha (Dasypus novemcinctus), o quati (Nasua nasua), os gambás (Didelphis spp.) e diversos roedores (Rattus rattus, Agouti paca, Oryzomys subflavus, Nectomys squamipes, Bolomys lasiurus, Proechimys sp., Rhipidomys sp., Akodon sp. e Thrichomys apereoides). O gambá, assim como o cão doméstico, possui papel como reservatório da leishmaniose visceral, principalmente na região Sudeste do país. Diversas espécies de mosquitos do gênero Lutzomyia são transmissores da leishmaniose cutânea, enquanto que a leishmaniose visceral tem como principal vetor o Lutzomyia longipalpis (mosquito-palha).
Os sinais clínicos apresentados pelos animais acometidos por esta enfermidade são caquexia (perda de peso, atrofia muscular, fadiga, etc.), perda de pêlos, fraqueza, feridas, linfadenopatia (gânglios inchados), hiperqueratose ou onicogrifose (crescimento exagerado das unhas), anemia, hepatoesplenomegalia (o aumento do fígado e baço), insuficiência renal, febre, pelagem seca e quebradiça, emese, diarréia, uveíte I(inflamação nos olhos), ulceração mutifocal, dentre outros.
As tentativas para tratamento por meio de drogas tradicionalmente empregadas, como o antimoniato de n-metilglucamina, o alopurinol, cetoconazol, fluconazol, miconazol, itraconazol e anfotericina B, têm tido baixa eficácia. Com relação ao antimoniato de n-metilglucamina, a dosagem recomendada para o tratamento é aproximadamente dez vezes maior que o recomendado para o tratamento humano. O uso rotineiro de drogas induz à remissão temporária dos sinais clínicos, não previne a ocorrência de recidivas (recaídas), tem efeito limitado na infectividade de flebotomíneos e leva ao risco de selecionar parasitas resistentes às drogas utilizadas. O tratamento de casos humanos também é utilizado como método de controle para a enfermidade. Os antimoniais pentavalentes (estibogluconato de sódio e antimoniato de n-metilglucamina) são as drogas de eleição para uso em humanos.
A leishmaniose é uma zoonose parasitária que avança com o passar dos anos acarretando sérios riscos à saúde pública. É considerada uma zoonose muito grave e de difícil tratamento, tanto em animais quanto em humanos. Cresce nos meios urbanos, tem reservatórios domésticos e silvestres, é de difícil controle para os agentes de saúde, necessitando maior trabalho de educação em saúde e ambiental. A prevenção, como o uso de repelentes, instalação de telas em janelas e outras medidas para evitar o contato com os mosquitos, além de evitar manter criadouros (como os do mosquito da dengue), é o melhor remédio.