Análise de Dimas Marques
Editor-chefe
dimasmarques@faunanews.com.br
A população de onças-pintadas (Panthera onca) do bioma Mata Atlântica está extremamente ameaçada. Estima-se que sobrevivam cerca de 300 animais da espécie, que ocupam, principalmente, três áreas: a Serra do Mar, o Alto Paranapanema (SP) e o corredor verde da divisa da região de Foz do Iguaçu (PR) com a Argentina.
E foi na região do Alto Paranapanema, no Contínuo de Paranapiacaba, onde está o mosaico composto pelos parques estaduais Carlos Botelho, Intervales, Nascentes do Paranapanema e Turístico do Alto Ribeira (Petar) e Estação Ecológica de Xitué, que o macho de onça-pintada Máscara foi assassinado no começo do mês. Nessa área, estimativa de 2019 de pesquisadores indicava que a população do felino seria de nove a 35 animais. E só.
Estima-se que vivam de nove a 35 onças-pintadas na região onde Máscara foi morto – Imagens: Projeto Onças da Região do Vale do Ribeira e do Alto Paranapanema
A morte de qualquer onça-pintada nessa região não significa somente a diminuição do número de indivíduos, mas a redução da possibilidade desses animais se reproduzirem, aumentando as chances de sobrevivência da espécie. Perdem-se futuras gerações e se compromete todo o equilíbrio do ecossistema – que depende da existência desses animais cumprindo suas funções ecológicas como predador que é.
O portal G1 publicou, em 15 de julho, uma boa reportagem sobre o assassinado de Máscara. Vale conferir.
“Uma onça-pintada que estava sendo monitorada por um projeto ambiental foi encontrada morta com mais de 50 perfurações de chumbo de espingarda em um córrego no limite entre Guapiara e Capão Bonito, no interior de São Paulo.
Segundo pesquisadores, o animal conhecido como “Máscara” era um dos seis acompanhados pela equipe e era fundamental para a sobrevivência da espécie na região conhecida como Contínuo de Paranapiacaba.
O pesquisador Thiago Borges Conforti, da Fundação Florestal, e gestor do Parque Estadual Intervales contou ao G1 que a área é uma das três últimas onde existem populações de onças que ainda podem sobreviver por um longo período.
Através do projeto coordenado pela analista ambiental Beatriz de Mello Beisiegel, do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Thiago e outros pesquisadores pretendem refazer a estimativa populacional das onças no Contínuo de Paranapiacaba.
“O projeto já tem mais de 20 anos de existência e hoje se sabe que existem menos de 20 indivíduos de onça-pintada na Serra de Paranapiacaba. Agora resta menos um”, lamenta o pesquisador.
De acordo com Thiago, a onça foi encontrada morta no dia 5 de julho às margens da Rodovia Penteado de Camargo (SP-250). A suspeita é de que ela tenha sido morta na área rural e transportada de veículo até a ponte na rodovia, de onde foi jogada para o córrego.
“Máscara foi morto por sucessivas ações de caçadores do meio rural. A primeira impressão é que foi morto por atacar criações domésticas. Porém, essa pode ser uma impressão enganosa. É mais provável que tenha passado a atacar criações domésticas por já estar com a locomoção prejudicada devido a um tiro”, conta Thiago.
Apoio do projeto
Conforme observado pelos pesquisadores através das “armadilhas fotográficas”, câmeras escondidas na mata, Máscara estava com um ferimento na pata direita e andava mancando (veja acima). Por causa disso, estaria caçando presas “mais fáceis” e incomodando fazendeiros.
“Quando um bicho fica prejudicado e não consegue mais caçar presas naturais por estar machucado, ele começa a caçar o que está mais fácil. Então, ele estava comendo patos e galinhas nas casas do entorno”, explica a pesquisadora Beatriz.
Por causa disso, a coordenadora do projeto informou que vinha trabalhando com os proprietários rurais para afastar o animal das suas criações sem que houvesse conflito. Os moradores receberam equipamentos como luzes automáticas, buzinas de propano e cercas elétricas.
Além disso, os pesquisadores estavam se organizando para fazer a captura e o tratamento da onça, devido ao estado de saúde dela.
“As providências para contratação estavam sendo tomadas e, no dia de aprovação dos orçamentos para captura, alguém cruzou o seu caminho antes da equipe do projeto. Um assassinato covarde em um momento que o animal estava prestes a ser resgatado e tratado”, conta Thiago.
“Alguém que não avisou a gente sobre o problema simplesmente resolveu assassinar esse bicho, adulto, bem de saúde. Se a gente tem seis bichos na região, ainda existe a possibilidade de a onça-pintada sobreviver a longo prazo. Ele era fundamental para a espécie sobreviver”, concorda Beatriz.
Consequências
Os pesquisadores contaram também que Máscara viveu por pelo menos oito anos antes de ser morto, e a necropsia apontou que ele era um animal saudável, exceto pelos tiros e suas consequências.
“Por vários anos ainda continuaria encantando as matas do Contínuo de Paranapiacaba, ajudando a controlar e manter saudáveis as populações de antas, queixadas, catetos e veados dessa área e contribuindo para a preservação da nossa floresta, com suas águas e seus atrativos turísticos.
Segundo Thiago, as onças são extremamente necessárias para a conservação da Mata Atlântica porque são predadores de topo nos ecossistemas terrestres, atuando no equilíbrio dos ambientes. Além disso, elas são um dos grandes atrativos turísticos para os visitantes do Parque Intervales, Petar e Carlos Botelho.
De acordo com Beatriz, a Polícia Federal foi acionada depois da morte da onça-pintada e vai investigar o crime ambiental. Segundo a PF, as investigações estão em andamento e a pessoa que matou a onça não tinha sido identificada até esta quinta-feira (15).
Em nota, a Fundação Florestal, que é o órgão do estado de São Paulo responsável pelo gerenciamento das áreas protegidas estaduais, informou que todas as áreas têm programas de fiscalização ambiental que fazem intermediação com moradores rurais com problemas de predação de animais domésticos.
Segundo o órgão, a orientação é que as equipes locais das Áreas Protegidas sejam procuradas o mais cedo possível quando detectado esse tipo de problema. “O diálogo certamente evita assassinatos desnecessários como esse”, opina a fundação.” – texto da matéria “Onça-pintada monitorada por projeto ambiental é achada morta com mais de 50 perfurações de chumbinho”, publicada em 15 de julho de 2021 pelo portal