Ninguém fica preso e ninguém paga multa. Tráfico de fauna está liberado

Dimas Marques
  • Dimas Marques

    Editor-chefe

    Formado em Jornalismo e Letras, ambos os cursos pela Universidade de São Paulo. Concluiu o curso de pós-graduação lato sensu “Meio Ambiente e Sociedade” na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo com uma monografia sobre o tráfico de fauna no Brasil. É mestre em Ciências pelo Diversitas – Núcleo de Estudos das Diversidades, Intolerâncias e Conflitos da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, onde pesquisou a cobertura do tráfico de animais silvestres por jornais de grande circulação brasileiros. Atua na imprensa desde 1991 e escreve sobre fauna silvestre desde 2001.

    Fauna News
16 de janeiro de 2013
“A cultura de impunidade no país em relação a esses crimes joga no mercado milhões de animais por ano, enquanto os criminosos lucram centenas de milhões de dólares, segundo os cálculos de funcionários de organizações governamentais e não-governamentais.

Arquivos do governo obtidos pela recém-aprovada Lei de Acesso à Informação mostram que entre 2005 e 2010 o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA – emitiu cerca de R$ 630 milhões em multas para crimes contra a fauna.

Macaco-prego sendo vendido no Pará
Foto: SOS Fauna


O que significaria muito– se os infratores pagassem o que devem. Durante o mesmo período, o IBAMA recebeu o equivalente a menos de 2% do total em multas.

Essa realidade provoca comentários como o do promotor federal Renato de Freitas Souza Machado, alocado no Rio de Janeiro, um ponto forte do comércio ilegal de espécies raras e protegidas: “Os traficantes sabem que nada vai acontecer com eles”.

As multas não-pagas – que um porta-voz do Ibama diz que serão cobradas – não são o único problema. Uma combinação de sentenças leves e apelações que parecem não ter fim resultam em poucas prisões para traficantes, mesmo para os grandes. Poucas horas após serem presos, eles estão de volta às ruas e, em muitos casos, de volta aos negócios.” – texto da matéria “Onde vivem as feras”, publicada pelo site Pública – Agência de Jornalismo Investigativo em 14 de janeiro de 2013

Não é novidade o fato de que traficante de animal, no Brasil, não vai preso. Atualmente, a peça legal aplicada contra o tráfico de fauna é a Lei de Crimes Ambientais (n° 9.605, de 12 de fevereiro de 1998), que estipula no artigo 29:

“Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécies da fauna silvestre, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida:

 Pena – detenção, de seis  meses a um ano, e multa.”

§1º – Incorre nas mesmas penas:

Inciso III – quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente.”

Também é aplicado o artigo 32 da mesma lei:

“Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:

Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa.”

Da forma como a Lei de Crimes Ambientais trata esse crime, ninguém vai para a cadeia por traficar animais. Pelo fato de as penas serem inferiores a dois anos (“menor potencial ofensivo”), os acusados são submetidos à Lei 9.099/1995, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e abre a possibilidade da transação penal e a suspensão do processo. É o famoso pagamento de cestas básicas ou trabalho comunitário.

Agrava a situação a Lei 12.403/2011, que estabeleceu o fim da prisão preventiva para crimes com penas inferiores a quatro anos de prisão, como a formação de quadrilha (enquadramento que muitos delegados, por exemplo, utilizavam para segurar traficantes de animais na cadeia por algum tempo).

E mesmo que os acusados acabassem condenados e presos, as penas previstas na atual lei são brandas e não servem para inibir os criminosos.

Filhotes de papagaio-verdadeiro apreendidos com traficantes
Foto: SOS Fauna

Além desse absurdo jurídico contra a fauna brasileira, a questão das multas é uma “pá de cal” em qualquer tentativa de punir os infratores. E o Ibama e a grande imprensa ainda insistem e divulgar, nos títulos e primeiros parágrafos das matérias sobre apreensões de animais silvestres, os altos valores das multas aplicadas.

Não sei quem é pior: se o órgão ambiental que joga uma cortina de fumaça com essas multas na tentativa de apresentar alguma ação contra o tráfico de fauna ou se a imprensa que, desinformada e desinteressada, vai na onda do Ibama.

Lamentável.

– Leia a matéria completa do site Pública
– A mesma matéria foi publicada no site da EBC (Empresa Brasil de Comunicação), do governo federal

Fauna News

Sobre o autor / Dimas Marques

Formado em Jornalismo e Letras, ambos os cursos pela Universidade de São Paulo. Concluiu o curso de pós-graduação lato sensu “Meio Ambiente e Sociedade” na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo com uma monografia sobre o tráfico de fauna no Brasil. É mestre em Ciências pelo Diversitas – Núcleo de Estudos das […]

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