Por Vitor Calandrini
Primeiro-tenente da PM Ambiental de São Paulo, onde atua como chefe do Setor de Monitoramento do Comando de Policiamento Ambiental. É mestrando no Programa de Pós-Graduação em Sustentabilidade na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP)
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Além de o tráfico de entorpecentes e o tráfico de fauna serem condutas criminosas, existe outra semelhança muito interessante nas discussões envolvendo drogas e animais: a sugestão de diferenciação nas penas aplicadas entre os traficantes e usuários, no caso de drogas, e entre traficantes e pessoas quem apenas mantêm animais em cativeiro como bichos de estimação. E a pergunta que faço é: essa comparação é aceitável?
Inicialmente, poderíamos achar que sim, pois é muito mais grave quem retira e transporta o animal da natureza do que aquele que só tem um único animal em sua residência para lhe fazer companhia. Mas fazendo uma análise sobre os aspectos jurídicos e materiais envolvidos, gostaria de compartilhar minha opinião sobre a questão.
Quando falamos em substâncias ilícitas e tráfico de drogas, não podemos esquecer que a vítima, ou no juridiquês, o objeto jurídico tutelado é a sociedade, ou seja, a coletividade. Dessa forma, a pena é pesada, sendo previsto punições que variam de 5 a 15 anos de reclusão!
Mas quando falamos do usuário de drogas, a lei prevê uma pena que sequer cabe a prisão, pois, nesse caso, o bem tutelado é a saúde. Dessa forma, cada pessoal poderia dispor da sua, a partir da sua liberdade de escolha. Por isso, em muitas decisões, sequer falamos em criminoso, mas sim em dependente químico, ou seja, tratado a pessoa como portadora de uma doença.
E aqui vem o que defendo como ponto de cisão entre animais ou drogas. O animal silvestre, sendo fruto do meio ambiente, se torna um bem difuso e coletivo, ou seja, pertence a todos e a todo o tempo. Sendo assim, essa característica não será alterada, independentemente de haver a retirada, o transporte ou mesmo a manutenção em cativeiro de um único espécime. O animal continua pertencendo à coletividade.
Partamos desse pressuposto para imaginar que se uma pessoa mantém um papagaio em sua residência, outras milhares perderam automaticamente seu direito de observá-lo em vida livre, de aproveitar de suas funções ambientais, de usufruir de um direito que a própria constituição garante.
E neste momento, você deve estar pensando: devemos então deixar a legislação na forma como está? Eu diria que não. Mas não podemos desvincular as ações entre quem retira e transporta de quem compra e cria os animais silvestres. Devemos aumentar o rigor para ambos os casos, pois o mercado ilegal de fauna só existe pois pessoas buscam traficantes para conseguir animais.