Conhecer as espécies de animais que habitam determinada área é um passo importante para planejar políticas de conservação da fauna – e, no Cerrado, isso parece ser um problema. Um levantamento inédito revela a escassez de evidências científicas sobre mamíferos de médio e grande portes em, pelo menos, 70% da área do bioma. O achado é de pesquisadores da Universidade Federal de Lavras (UFLA), do Museu Paraense Emílio Goeldi e do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e está descrito em artigo científico publicado na sexta-feira (19 de julho) na revista Biota Neotropica.
A área com poucas informações sobre os mamíferos se estende pelos estados do Maranhão, Bahia, Piauí, Tocantins, uma parte central de Goiás e as fronteiras entre o Mato Grosso e Rondônia e tem apenas 25% dos pontos de amostragem de espécies do Cerrado. A maioria dos Estudos focados nesses animais, nesse bioma, estão próximos da divisa com a Mata Atlântica – e inexistem estudos publicados sobre mamíferos do norte desse território.
O trabalho sintetiza o conhecimento sobre espécies de mamíferos médios e grandes no Cerrado e na Mata Atlântica a partir de revisão de artigos científicos publicados sobre o assunto ao longo das décadas, nas bases de dados científicas Scopus, Web of Science e Google Acadêmico. Ao todo, foram identificadas 116 espécies, descritas em 84 publicações científicas, das quais nove estão “em perigo” ou “em perigo crítico” de extinção.
Cachorro-do-mato é o mamífero mais citado
O animal mais citado pela literatura científica é o cachorro-do-mato (Cerdocyon thous) e a maior parte dos mamíferos (57%) foi identificada na Mata Atlântica. Apesar de apresentar uma distribuição de estudos mais uniforme, o levantamento mostra que algumas regiões desse bioma também não possuem estudos sobre mamíferos, como o litoral de Alagoas, o interior do Paraná e o norte da Bahia.
O trabalho destaca a importância da pesquisa científica ao apontar a escassez de informação sobre mamíferos em determinados pontos do Cerrado e da Mata Atlântica. Esses biomas correspondem a 40% do território brasileiro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e são considerados pelos especialistas como lugares-chave para a conservação da biodiversidade. Como aponta o estudo, diversas espécies do Cerrado podem estar em risco de extinção por causa do desmatamento provocado pela expansão agrícola das últimas décadas.
“Existe uma ideia estabelecida de que já conhecemos a diversidade brasileira e que podemos diminuir os esforços de pesquisa de base”, comenta Luciano Querido, do Inpa, um dos cientistas envolvidos no estudo.
Porém, nossos resultados mostram que é preciso investir em ciência, mesmo em biomas tão bem estudados”. O próximo passo do grupo de pesquisa é expandir o levantamento para outros biomas brasileiros.