Análise de Dimas Marques
Editor-chefe
dimasmarques@faunanews.com.br
“Uma imagem chocante. Uma mãe tamanduá-bandeira com seu filhote ao lado, com parte dos órgãos expostos. Ambos mortos, com o corpo no asfalto quente da movimentada rodovia BR-262, no Mato Grosso do Sul. Um retrato cruel sobre o atropelamento de fauna em um dos estados conhecidos como um dos melhores destinos para ver animais selvagens. A cena foi registrada nesta quinta-feira (1º) pela equipe do projeto Bandeiras & Rodovias, que realiza o monitoramento sistemático de 1.300km de estradas no estado a cada 15 dias. E enquanto a fotografia por si só, já choca, os números são ainda mais alarmantes.
De acordo com o biólogo Arnaud Desbiez, que comanda a iniciativa, apenas nos últimos três anos, o projeto de monitoramento registrou 608 tamanduás-bandeiras mortos nas rodovias, uma média de mais de 200 atropelados anualmente. O número, entretanto, seria ainda maior, se consideradas as carcaças que somem antes da equipe passar (estimada em 25%) e os animais que morrem afastados da estrada. “Nós colocamos colares em 59 tamanduás e seis foram atropelados. Destes, três morreram na rodovia, de forma que a gente conseguiria ver, e três morreram até uns 100 metros depois da rodovia, e esses animais não são vistos. Então 50% dos animais não teriam sido vistos no nosso monitoramento. Ou seja, de 608, você adiciona 25% [carcaças que somem] e depois você multiplica por dois. E esse é o número real da tragédia que está ocorrendo nas nossas rodovias. Esse é o exemplo dos tamanduás-bandeira, mas deve acontecer com outros animais também”, explica Arnaud.” – texto da matéria “Mãe e filhote de tamanduá-bandeira morrem atropelados em rodovia no MS”, publicada pelo O Eco em 1º de abril de 2021
Retrato de descaso. Não há como interpretar de outra forma. O massacre de animais silvestres por atropelamentos na BR-262 é muito bem conhecido. E ainda assim, continua acontecendo.
As iniciativas tomadas para reduzir o impacto da circulação de veículos sobre a fauna local não têm surtido efeito significativo. A rodovia é monitorada por pesquisadores – que escancaram o problema e apontam possíveis soluções –, a Polícia Militar Ambiental do Mato Grosso do Sul faz campanha educativas pontuais e radares e cercas foram instalados em alguns pontos, mas a chacina continua.
O que está faltando?
Está faltando priorizar a biodiversidade. A rodovia não será removida e seu tráfego, da forma como é gerido, vai continuar dizimando a fauna. As medidas de mitigação (redução) de impactos implantadas até o momento não estão surtindo efeito (o Ibama e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, inclusive, não estariam se manifestado sobre a efetividade dessas iniciativas). O Ministério Público Federal desde 2018 acompanha a situação. É tudo moroso. O tempo das negociações, das reuniões, das ações judiciais e do Judiciário está permitindo a matança.
O tempo da nossa burocracia e das tomadas de decisões não é o tempo necessário para salvar essas vidas. Para encurtar esse tempo, só quando o assunto for realmente priorizado. E não é isso que se vê.