Insetos, os donos da árvore de Natal

Separei três espécies que são consideradas pragas dos pinheiros de Natal.

Elidiomar Ribeiro da Silva

Licenciado em Ciências Biológicas, mestre e doutor em Zoologia pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professor do Departamento de Zoologia da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), sendo responsável pelo Laboratório de Entomologia Urbana e Cultural.
Entomólogo, tem carreira centrada no estudo da taxonomia das ordens Ephemeroptera, Hemiptera e Lepidoptera, sendo que recentemente vem se dedicando ao estudo da presença simbólica de animais nas manifestações culturais, a chamada zoologia cultural. Com mais de cem artigos científicos publicados, cerca de 200 trabalhos apresentados em congressos científicos, nove livros editados e sete capítulos de livros, orientou dez dissertações de mestrado e três teses de doutorado. É idealizador e editor do periódico A Bruxa, uma revista de biologia cultural, e do fanzine sobre ciência Homem-Leoa. É também o criador e organizador do Colóquio de Zoologia Cultural e da Mostra de Biologia Cultural.

18 de dezembro de 2024

FAUNA NEWS Insetos, os donos da árvore de Natal

Chegou dezembro, mês em que tentamos correr atrás do prejuízo, na vã busca de se fazer tudo aquilo que não se fez ao longo do ano. Em meio à eterna discussão entre os que gostam ou não de uva-passa e panetone, uma coisa é certa na tradição decembrina: nesta época, irei sempre tentar dar um jeito de associar os insetos ao Natal ou ao fim do ano, algo que já fiz em textos anteriores [1] [2].

Dessa feita, o tema será algo que já deve estar, dentro do bom espírito natalino, enfeitando a casa de muitos e assim ficará até 6 de janeiro, o Dia de Reis: a árvore de Natal, um dos símbolos dos festejos de fim de ano. Talvez a árvore de Natal seja a única “planta” que temos em casa e que não nos causa preocupação com relação a eventuais ataques de insetos. Pelo menos assim o é em grande parte do Brasil, pois por aqui esses típicos enfeites natalinos são artificiais, feitos de arame e plástico, além de sonhos e esperança por dias melhores, é claro. Mas, em muitos territórios do planeta, notadamente nas regiões mais frias e no Hemisfério Norte, a tradição prega o uso de árvores de verdade. Isso não é novidade, pois certamente você já viu algum filme natalino em que uma família estadunidense, em meio a muitas aventuras e peripécias (ave, Sessão da Tarde!) vai atrás de árvores coníferas para usar em casa no Natal.

Entre as plantas reais mais corriqueiramente usadas como árvore de Natal nas terras do Tio Sam destacam-se píceas (gênero Picea), pinheiros (gênero Pinus) e abetos (gêneros Pseudotsuga e Abies), todos da ordem botânica Pinales e sua única família, Pinaceae. Sendo plantas de verdade, as árvores de Natal dos caras que acham que futebol se joga com bola oval têm, sim, problemas com os insetos. Fazendo uso do número três, tão bem representado nesta época pelos Reis Magos, vou trazer ao papo evocando um trio de insetos considerados pragas das árvores de Natal estadunidenses.

Pragas da árvore de Natal

Rhyacionia frustrana (ordem Lepidoptera, família Tortricidae), a mariposa-da-ponta-do-pinheiro-de-nantucket, é uma mini mariposa que mede de 9 a 15 milímetros de envergadura e apresenta coloração geral cinza com manchas vermelho-tijolo a amarronzadas nas asas. As larvas (lagartas) totalmente desenvolvidas são castanho-alaranjadas, medem cerca de 10 milímetros de comprimento e se alimentam em várias espécies de pinheiros, causando danos principalmente nos brotos. Os galhos infestados morrem, resultando na má formação da árvore. A espécie é encontrada nos Estados Unidos, de Massachusetts ao sul da Flórida, a oeste do Missouri, Oklahoma, Texas e Califórnia. Também é naturalmente encontrada no México, Guatemala, Honduras, Nicarágua, República Dominicana, Cuba e Jamaica [3] [4].

Hylobius pales (ordem Coleoptera, família Curculionidae), o gorgulho-pálido, é um besouro escuro e oval, medindo cerca de um centímetro de comprimento, com um rostro bem proeminente (“bico”), coloração geral castanho-avermelhada a preta, com manchas alaranjadas e esbranquiçadas na cabeça, tórax e élitros (asas anteriores). As larvas são brancas com a cabeça castanha, sem pernas e em formato geral de um “C”, medindo até 7 milímetros de comprimento. Podem ser bastante danosos aos pinheiros. Na planta, o ferimento mais sério ocorre em pequenas mudas ou nos galhos de árvores maiores, como resultado da alimentação dos adultos. Os gorgulhos provocam pequenos buracos irregulares na casca, podendo causar dano comercial [4].

Cinara pini (ordem Hemiptera, família Aphididae), o pulgão-do-pinheiro-silvestre, é uma espécie cujas formas ápteras são castanho-avermelhadas com reflexos esverdeados, medindo entre 3 e 4 milímetros de comprimento. As formas aladas são de cor mais escura. Esses pulgões possuem aparelho bucal muito longo em comparação com outros da mesma família, o que lhes permite absorver substâncias da casca dos galhos. Afetam folhas e ramos, prejudicando o crescimento dos brotos [4] [5].

Ufa, ainda bem que aqui em Pindorama a gente não precisa se preocupar com esses “destruidores de árvores de Natal”, até porque nós não compramos o precioso acessório em hortos botânicos, mas em supermercados ou lojas de departamentos, não é? Além disso, esses insetos, que parecem ter pouco apreço pelas festas de fim de ano, são problema lá do povo setentrional, certo?

Outro problema…

Pois é, parece que não. Há um problema, e dos grandes, que tem a ver com a tal da globalização, característica marcante dos dias atuais. Os elementos da natureza não respeitam as fronteiras físicas que tentamos impor e, por conta própria ou com alguns empurrõezinhos, bichos, plantas, fungos, protistas, bactérias e vírus volta e meia dão as caras em lugares em que não ocorriam naturalmente. Essas introduções têm consequências quase sempre problemáticas. Da trinca de insetos aqui abordados, já temos no Brasil o pulgão-do-pinheiro-silvestre [6], enquanto que a mariposa-da-ponta-do-pinheiro-de-nantucket e o gorgulho-pálido, não. Ainda não. Esses dois últimos insetos são considerados pragas quarentenárias ausentes [7], ou seja, embora não tenham sido detectados, há suspeitas de que possam vir a ser e, caso isso se confirme, provavelmente eles irão causar prejuízo considerável.

Vale sempre ressaltar que, especificamente no que se refere aos insetos, as ampliações de distribuição geográfica não são culpa dos mesmos, mas quase sempre respostas às ações do ser humano. Isso se aplica também, diga-se de passagem, ao próprio conceito de “praga”. No final das contas, se olharmos direitinho, veremos que quem boicota a ordem natural do planeta somos nós, à semelhança do que o personagem Grinch tenta fazer com o Natal.

Boas Festas e até o ano que vem!

Referências:

Observação: as opiniões, informações e dados divulgados
no artigo são de responsabilidade exclusiva de seu(s) autor(es).

Sobre o autor / Elidiomar Ribeiro da Silva

Licenciado em Ciências Biológicas, mestre e doutor em Zoologia pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professor do Departamento de Zoologia da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), sendo responsável pelo Laboratório de Entomologia Urbana e Cultural. Entomólogo, tem carreira centrada no estudo da taxonomia das ordens Ephemeroptera, Hemiptera […]