
“A Polícia Rodoviária Federal da Bahia prendeu em flagrante nesta segunda-feira, 30, o traficante de animais Valdivino Honório de Jesus, de 60 anos, na divisa entre os estados da Bahia e de Pernambuco. Ele transportava 1 000 pássaros silvestres, da espécie canário-da-terra, dentro de seu porta-malas e seguia viagem com destino a Caruaru, município pernambucano. Os pássaros estavam aglomerados em pequenas gaiolas, sendo que 15 aves foram encontradas mortas, provavelmente devido a maus tratos ocorridos durante o transporte. Essa é a 13ª vez que Valdivino é pego em flagrante pela PRF. A primeira foi em 1996 – há duas décadas – e as outras aconteceram em diferentes cidades dos estados do Paraná, Minas Gerais, Bahia, Paraíba e Pernambuco.
O que permite a reincidência desses criminosos é a própria legislação. O crime é descrito como: "matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida". Nesses casos, a pena prevê prisão de seis meses a um ano e multa. Na prática, contudo, os traficantes não costumam ser presos e apenas as multas são aplicadas, várias e várias vezes.” – texto da matéria “Traficante é preso pela 13ª vez com 1 000 pássaros em porta-malas”, publicada em 31 de maio de 2016 pelo site da revista Veja
A abordagem dos policiais aconteceu às 11h na altura do km 240 da BR 110, em Petrolândia (PE). O veículo tinha placas de Patos (PB), sendo que Valdivino alegou ter saído de Itabuna (BA) com destino a Caruaru (PE). Os animais apreendidos seriam levados para o Centro de Triagem de Animais Silvestres (CETAS) de Salvador para receber cuidados.
Valdovino é o retrato da impunidade no combate ao tráfico de animais no Brasil. Quem tiver curiosidade, basta fazer uma busca na internet com o nome dele e verá algumas das vezes que esse homem, que até 2009 era funcionário da Secretaria de Agricultura da Paraíba (não sabemos se ele ainda trabalha para o Estado), foi flagrado transportando animais sem autorização.
O Fauna News oferece uma pequena amostra sobre Valdovino:
25 de agosto de 2009: flagrado com 497 pássaros silvestres em Salgueiro (PE)
24 de maio de 2010: flagrado com 227 animais em Chorrochó (BA)
31 de agosto de 2010: flagrado com 421 animais silvestres em Salgueiro (PE)
12 de setembro de 2010: flagrado com 582 pássaros silvestres em Encruzilhada (BA)
15 de março de 2012: flagrado com 50 aves na região metropolitana de Curitiba (PR). Vale destacar: ele foi detido após bater o veículo e, para tentar fugir do flagrante, estrangulou alguns animais
18 de abril de 2013: flagrado com 500 animais em Salvador (BA)
Dá para reparar que a legislação não funciona. Dá para reparar também que o Valdovino foi preso, pelo que encontramos em uma rápida busca na internet, três vezes somente em 2010 em pequenos intervalos de tempo.
E aí, legisladores? Alguém vai se mexer para acabar com isso?
E aí, governadores? Algum dos senhores pretende encaminhar para o parlamento federal alguma sugestão de alteração na legislação?
Ou vamos ficar com sei lá quantos Valdovinos acabando com nossa biodiversidade e causando sofrimentos aos animais?
Hoje, a peça legal para o combate ao tráfico de animais silvestres é a Lei de Crimes Ambientais (nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998), que estipulou no artigo 29:
“Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécies da fauna silvestre, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida:
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e multa.
Parágrafo 1º – Incorre nas mesmas penas:
(…) Inciso III – quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente."
Também é aplicado o artigo 32 da mesma lei:
“Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:
Pena – detenção de três meses a um ano, e multa.”
Pelo fato de as penas para esses crimes serem inferiores a dois anos (“menor potencial ofensivo”), eles são submetidos à Lei 9.099/1995, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e abre a possibilidade da transação penal e a suspensão do processo.
Agrava a situação a Lei 12.403/2011, que estabeleceu o fim da prisão preventiva para crimes com penas menores que quatro anos de prisão, como o de formação de quadrilha.
O tráfico de animais silvestres é o crime da impunidade.