Hipopótamos sulamericanos? Herança do tráfico

Dimas Marques
  • Dimas Marques

    Editor-chefe

    Formado em Jornalismo e Letras, ambos os cursos pela Universidade de São Paulo. Concluiu o curso de pós-graduação lato sensu “Meio Ambiente e Sociedade” na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo com uma monografia sobre o tráfico de fauna no Brasil. É mestre em Ciências pelo Diversitas – Núcleo de Estudos das Diversidades, Intolerâncias e Conflitos da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, onde pesquisou a cobertura do tráfico de animais silvestres por jornais de grande circulação brasileiros. Atua na imprensa desde 1991 e escreve sobre fauna silvestre desde 2001.

    Fauna News
12 de março de 2011
Saber que na América do Sul há hipopótamos vivendo livres na natureza foi uma novidade para mim. Afinal, esses animais são originários da África e por aqui somente são vistos em zoológicos. Mas, acredite ou não, 30 deles perambulam pela Colômbia graças à ostentação do traficante Pablo Escobar, morto em dezembro de 1992.
Fiquei sabendo da história desses hipopótamos ao ler a matéria “O terror das cercanias”, publicada dia 6 de março, na página J8 do caderno Aliás de O Estado de S. Paulo. O texto de Verónica Calderón (originalmente publicado no El País) é uma reportagem sobre o documentário Pablo’s Hippos (Os hipopótamos de Pablo), do diretor colombiano Antonoio von Hildebrand, que traça uma analogia entre a espécie e o traficante.
Espécie da África, esses hipopótamos vivem livres na Colômbia

Foto: Reprodução

A matéria não esclarece se os hipopótamos foram importados legalmente, junto com outros milhares de animais (o zoológico de Escobar, Hacienda Napoles, chegou a abrigar mais de 2.500 animais). Com a morte do traficante, a propriedade foi saqueada e bichos foram roubados. Alguns até acabaram sendo levados para outro zoológico colombiano.

Mas os hipopótamos tiveram um destino diferente: uma parte ficou vagando pelas imediações da Hacienda Napoles e um casal escapou e se reproduziu, formando um grupo que se instalou a 150 quilômetros ao norte da antiga propriedade de Pablo. Os animais se transformaram em um problema para o poder público colombiano por destruírem lavouras, derrubarem cercas e atacarem outros animais, camponeses e pescadores.

Além da história dos hipopótamos sulamericanos chamar a atenção por sua singularidade, a ostentação de Pablo Escobar é um símbolo de um dos principais elementos motivadores do comércio de animais silvestres no mundo. Esse hábito já estava presente na Idade Média como um indicativo de riqueza, poder e nobreza.

A outra face dos criadores de animais silvestres está ligada principalmente aos que mantêm pássaros. E esse costume, muito ligado às tradições indígenas, não está restrito ao universo dos endinheirados. Como o valor dos pássaros é menor, não há localidade no Brasil em que inexista o comércio de aves e que não se encontre gaiolas em residências.

Para dar uma dimensão sobre o problema:
– Dependendo da fonte consultada, o número de animais silvestres retirados da natureza no Brasil, por ano, é 12 milhões ou 38 milhões;
– Entre 60% e 70% do comércio ilegal de animais silvestres no Brasil é voltado para abastecer o mercado interno: estima-se que de dois a quatro milhões de animais silvestres vivam em cativeiros particulares;
– Estima-se que 95% do comércio de animais silvestres no Brasil seja ilegal;
– Há pesquisas que apontam haver 60 milhões de brasileiros criando espécimes da fauna nativa em suas residências.

Mudando um pouco o raciocínio…
Peço licença para mudar um pouco o raciocínio, mas mantendo ainda como base a história de Pablo Escobar e os hipopótamos. Não pude deixar de lembrar o quanto que o tráfico de animais silvestres está ligado ao tráfico de drogas. No 1º Relatório Nacional sobre o Tráfico de Fauna Silvestre, publicado pela ONG Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres (Renctas), a entidade destaca:

“Na América do Sul, os carteis de drogas têm grande envolvimento com o comércio ilegal de fauna silvestre, muitas vezes se utilizam da fauna para transportarem seus produtos. Frequentemente, são encontradas drogas dentro de animais vivos ou em suas partes.”

“Não é surpresa alguma essas atividades estarem ligadas, se considerarmos que ambas são atividades marginais, que os produtos envolvidos são enviados das mesmas regiões e que os métodos utilizados são similares: falsificação de documentos, suborno de autoridades, evasão de impostos, declarações alfandegárias fraudulentas, entre outras.”

De acordo com pesquisa da Renctas (divulgada em 2001), estima-se haver entre 350 e 400 quadrilhas de tráfico da fauna silvestre, sendo que cerca de 40% possuem ligações com outras atividades ilegais (drogas, armas e pedras precisas, por exemplo).

Leia a matéria completa: “O terror das cercanias”
Conheça a ONG Renctas
Saiba mais sobre os hipopótamos

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Sobre o autor / Dimas Marques

Formado em Jornalismo e Letras, ambos os cursos pela Universidade de São Paulo. Concluiu o curso de pós-graduação lato sensu “Meio Ambiente e Sociedade” na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo com uma monografia sobre o tráfico de fauna no Brasil. É mestre em Ciências pelo Diversitas – Núcleo de Estudos das […]

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