
Por Rubem Dornas
Biólogo, especialista em Geoprocessamento e mestrando em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais na Universidade Federal de Minas Gerais. Integra o Transportation Research and Environmental Modelling Lab (TREM-UFMG) e o Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (NERF-UFRGS)
estradas@faunanews.com.br
Veículos autônomos e suas inovações tecnológicas vêm, cada vez mais, tomando espaço na mídia. Em alguns países desenvolvidos, têm se tornado comuns os testes com esse tipo de automóvel, guiado sem a participação humana. Entretanto, como praticamente tudo que cerca grandes novidades, os veículos autônomos não escapam de polêmicas.
A principal delas, no momento, tem relação com a decisão que o veículo deve tomar, em caso de acidente iminente, escolhendo alvos-potenciais para proteger e outros para sofrer maiores danos. Os participantes de uma enquete do estudo que trata dessa discussão, em sua maioria, preferem salvar jovens no lugar dos idosos (pelo menos em países ocidentais), mulheres ao invés de homens, médicos e executivos em detrimento de desabrigados, pessoas desportistas no lugar de pessoas obesas e por aí vai.
Mas e o que a fauna tem a ver com isso? Em primeiro lugar, e como já era de se esperar, o estudo identificou que a vida humana tem preferência para ser salva, ainda que construções e animais possam ter que pagar o preço por isso. Apesar disso, carros autônomos podem ser de grande importância quando se leva em consideração o evitar um acidente iminente com a fauna de grande porte.
Por dispor de um alto número de sensores, sejam eles de obstáculos, de movimento ou térmicos, os veículos autônomos serão capazes de detectar animais no entorno ou sobre a via e, a partir disso, reduzir a velocidade ou desviar do animal. Obviamente que estudos mais aprofundados deverão ser realizados, principalmente com relação à decisão do veículo em função do tipo de locomoção e porte do animal. Diferentes espécies apresentam comportamentos distintos, sejam eles em termos de resposta ao automóvel (fugir ou paralisar) ou mesmo da forma de locomoção, que pode confundir os sensores do veículo.
Veículos autônomos já conseguem detectar e identificar grandes ungulados (veados, alces), mas têm dificuldade de compreender o que é um canguru pelo seu modo de deslocamento em saltos (veja mais aqui). De qualquer maneira, uma vez que os animais de grande porte terrestres deverão ser tratados a algo semelhante a um pedestre, existirá a redução do risco aos passageiros e ao patrimônio, o que será benéfico também para poupar a vida animal.
Como nem tudo são flores, é bem provável que animais de menor porte sejam totalmente ignorados pelo sistema de detecção dos carros autônomos. Assim, não será possível, a exemplo do que acontece atualmente por motoristas bem-intencionados, desviar dos animais pequenos deslocando-se sobre a via. Por outro lado, o atropelamento intencional (já falamos sobre isso aqui e aqui) poderá ser eliminado.
Uma vez que o assunto ainda é incipiente e devem faltar alguns bons anos para que a frota dos países mais desenvolvidos seja totalmente substituída por carros autônomos, é importante começar a pensar de forma mais criteriosa sobre essa questão. Cabe divulgar recorrentemente esse assunto a fim de pressionar montadoras e órgãos governamentais sobre a necessidade de realizar um maior número de pesquisas que compreendam o comportamento animal frente a veículos e que incluam, também, o desenvolvimento de algoritmos que reconheçam – e preservem – a vida de animais de menor porte.