
Por Larissa Oliveira Gonçalves
Bióloga e mestre em Ecologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É doutoranda em Ecologia na mesma universidade, trabalhando junto ao Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (NERF-UFRGS).
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Muitos atropelamentos são imperceptíveis, mas quando um veículo atropela um animal de um porte um pouco maior, como capivaras, onças e veados, os danos podem ser imensuráveis. Pensando apenas nas perdas monetárias, elas podem estar relacionadas, por exemplo, a custos de reparo dos veículos e auxílios à saúde.
Estimativas apontam que veados causam 1,2 milhão de colisões com veículos anualmente nos EUA, acarretando em 1,66 bilhão de dólares em danos, 29 mil pessoas feridas e 200 pessoas mortas. Isso faz com que os veados sejam um dos mamíferos mais perigosos para os humanos na América do Norte.
Por que há tantos acidentes com veados? A perda dos grandes predadores possibilitou que as populações de veados aumentassem muito, se tornando um dos animais mais abundantes.
Será que a recolonização de grandes carnívoros poderia ajudar a reduzir as mortes humanas por colisões nas estradas?
Essa foi a pergunta que motivou um trabalho muito legal publicado na revista Conservation Letters recentemente ) em que os autores avaliaram qual seria o impacto da recolonização de onças-pardas no leste norte-americano para a redução das colisões com veículos. No leste dos EUA, tanto onças-pardas (Puma concolor) quanto lobos (Canis lupus) poderiam recolonizar essa região naturalmente, sendo que essas espécies são predadores naturais dos veados que tanto se envolvem em acidentes.
A principal conclusão do trabalho é que se as onças-pardas retornassem ao seu ambiente historicamente já habitado, elas poderiam prevenir 22% dos acidentes, evitando 155 mortes humanas, 21.400 pessoas com lesões e economizar 2,3 bilhões de dólares num período de 30 anos. Isso porque, num período de 6 anos, uma única onça-parda poderia comer 259 veados, reduzindo a densidade desses animais, prevenindo oito colisões e evitando custos estimados de 37.600 dólares.
Além das estimativas acima, os pesquisadores utilizaram informações do Estado de Dakota do Sul, onde havia dados disponíveis sobre as densidades de onças e veados, e estimaram as colisões antes e depois da recolonização das onças-pardas nos anos 90. Eles observaram que as onças-pardas reduziram as colisões com veículos em 9% dentro de 8 anos após a recolonização. Com isso, 158 colisões puderam ser prevenidas e gastos de aproximadamente 1,1 milhão de dólares anuais evitados.
Não temos exemplos claros desse tipo para o Brasil, mas a partir desse trabalho fica a pergunta: será que conservar onças no Brasil poderia reduzir o número de acidentes com a fauna nas estradas?