
Por Andreas Kindel
Biólogo, professor associado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e coordenador do Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias da mesma universidade (NERF-UFRGS)
estradas@faunanews.com.br
Durante esta semana, acontece em Belo Horizonte o IV Simpósio Brasileiro de Biologia da Conservação. Além da programação diversa e instigante, o evento trouxe uma série de inovações, sobretudo nas formas de comunicação e divulgação. A mais interessante é a necessidade de cada trabalho inscrito para apresentação durante o evento ter um vídeo divulgando as ações e os resultados do projeto. Todos os vídeos foram disponibilizados e concorriam à premiação a partir das escolhas de um júri do evento e do voto popular (número de curtidas).
A ideia aqui não é discorrer sobre as inúmeras oportunidades que esse tipo de iniciativa de comunicação gera e sim chamar a atenção para dois vídeos que trataram do mesmo tema, porém em contextos diferentes. O primeiro vídeo avalia o uso de passagens de fauna por mamíferos em uma rodovia de Minas Gerais (vídeo 1) e o segundo avalia o uso das passagens por antas em uma ferrovia que corta o Mato Grosso (vídeo 2).
Vídeo 1:
Vídeo 2:
Imagens de animais atravessando passagens são uma mensagem de esperança e são a comprovação de que são usadas por múltiplas espécies. Mas será que são suficientes para comprovar que estão sendo efetivas? Ou seja, o fato de documentarmos as travessias significa que seus objetivos foram cumpridos e a fauna está salva?
Para confirmarmos o sucesso da implantação das passagens é preciso revisar os objetivos da sua implantação. Se as passagens foram implantadas para diminuir a mortalidade, é necessário medir a mortalidade antes e depois da implantação das passagens e/ou em locais com e sem passagem. Se o objetivo primário era manter ou recuperar a conectividade das populações entre os dois lados da estrada, é necessário medir a conectividade antes e depois da implantação das passagens e/ou em locais com e sem passagem. Resumindo: é importante monitorar o uso das passagens pela fauna (e meu objetivo aqui não é criticar essas iniciativas), mas chamar a atenção de que isso não é suficiente para julgarmos que estamos tendo sucesso na proteção da fauna.
Nós exploramos esse e alguns outros mitos relacionados à avaliação e planejamento da mitigação de impactos em estradas em um recente artigo de opinião publicado na revista Área Aberta (p. 73-79).
Finalmente, é preciso lembrar que estradas, sejam rodovias ou ferrovias, são vetores do processo de expansão da fronteira agrícola e, portanto, da simplificação de ecossistemas, substituindo sistemas complexos e biodiversos como florestas, cerrados e campos por monoculturas. De nada adianta termos passagens, se antas, veados, gatos-do-mato e tantos outros não tiverem para onde ir. Essas estratégias de mitigação obrigatoriamente devem vir acompanhadas de outras ações de proteção de habitat na área de influência desses empreendimentos.