Por Larissa Oliveira Gonçalves
Bióloga, mestre e doutora em Ecologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É pesquisadora colaborada do Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias da mesma universidade (NERF-UFRGS)
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A tecnologia veio para auxiliar nas tarefas diárias e facilitar o que antes era mais difícil e complicado. Para saber notícias de alguém que está longe, basta uma chamada de vídeo. Para saber qual ônibus pegar para um determinado destino, basta inserir o seu caminho no aplicativo de transporte de sua cidade. Os exemplos são diversos e as inovações tecnológicas também estão sendo criadas para ajudar a reduzir os atropelamentos de fauna em estradas. Já falamos aqui dos veículos autônomos, mas temos mais exemplos.
Em 2017, um dos maiores aplicativos de trânsito do mundo, o Waze, lançou mais uma função na versão disponível para Israel, seu país de origem: os motoristas poderiam começar a reportar também acidentes de trânsito com animais. A ideia disso é agrupar informações que ajudem a prever onde haverá mais chance de animais cruzarem a pista e ocorrer um acidente. Obviamente, é muito mais fácil alertar os motoristas sobre um buraco na pista (reportado por outra pessoa), do que prever acidentes com fauna silvestre. Entretanto, o primeiro passo é obter essas informações.
Segundo o app, mais de 11.000 acidentes foram reportados em seis meses, o que já permitiu identificar em quais estradas tinha maior risco de acidentes com fauna no país. Não encontrei informações mais recentes sobre o andamento dessa iniciativa e se ela está tendo sucesso. Mas, aparentemente, outros países também estão investindo nessa ideia, como é o caso da Malásia.
Outro exemplo de tecnologia integrada à mitigação de atropelamentos são as cercas virtuais, que nada mais são do que cercas invisíveis. Elas estão sendo mais testadas e utilizadas para a criação de gado. Nas estradas, a ideia é instalar dispositivos que são acionados com a presença de veículos e que alertam os animais através de sinais sonoros e luminosos. Os desenvolvedores dessa tecnologia esperam que o animal se sinta desconfortável com aqueles sinais e se afaste da estrada. O problema é que há pouca evidência de que isso aconteça.
Apesar de alguns trabalhos concluírem que os dispositivos funcionam, ainda há dúvida na literatura científica. Um teste de cinco anos na Áustria concluiu que houve uma redução de 90% dos atropelamentos de cervídeos. Um outro estudo de três anos com diabo-da-Tasmânia concluiu que os dispositivos têm um enorme potencial de reduzir as taxas de atropelamentos, podendo chegar a mais de 50% de redução. Entretanto, uma pesquisa, com uma abordagem um pouco mais rigorosa, avaliou três espécies australianas e apontou que a redução dos atropelamentos variou entre 13% e 32%.
É importante lembrar que cada estudo tem o seu contexto, além, é claro, de questionar a rigorosidade da avaliação da efetividade. Ainda, precisamos saber qual o objetivo da mitigação e qual sua espécie-alvo ou o grupo-alvo. Só assim, poderemos também testar e saber se essas abordagens podem ser importadas para o contexto brasileiro.
Parafraseando Steve Jobs (um dos grandes nomes do mundo tecnológico): “a tecnologia move o mundo”. Será que ela também moverá a conservação da biodiversidade?