Por Gabriela Schuck de Oliveira
Graduanda em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e bolsista do Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (NERF-UFRGS)
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Tenho observado em meus monitoramentos de fauna atropelada no anel viário do Campus do Vale da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) uma quantidade visivelmente elevada de quelônios atropelados após a eclosão dos ovos em um trecho de um quilômetro da via (na figura acima estão 63 quelônios coletados em duas temporadas reprodutivas). O mesmo problema foi recentemente noticiado com tartarugas marinhas em uma praia do Rio Grande do Norte.
Em minhas observações sempre existiam mais de um indivíduo atropelado no mesmo local, já que basta um único veículo para atropelar a ninhada que está se deslocando. Também por serem jovens (alguns menores que uma moeda), a possibilidade de o motorista enxergar o animal atravessando e evitar o atropelamento é muito baixa. No trecho do anel viário monitorado, a vegetação está avançando, sobrando poucos sítios de nidificação já que quelônios buscam áreas abertas para fazer o ninho. O local mais semelhante com os requisitos que a fêmea procura é na margem da via (foto ao lado). Os animais das espécies coletadas (a tartaruga tigre d’água, Trachemys dorbigni, e o cágado-de-barbelas, Phrynops hilarii) colocam em média 12 ovos por ninho, sendo que a maioria pode ser predada antes da eclosão.
Tendo o conhecimento de toda essa situação, venho refletindo com certas perguntas:
O que essas mortes significam para a persistência das populações de quelônios nesse ambiente? A taxa de sobrevivência antes da eclosão é baixa para quelônios e os que sobrevivem estão sendo atropelados. Será que as mesmas tartarugas poderiam morrer de alguma outra forma e a morte por atropelamento não teria tantas consequências para a população? Será que estão morrendo todos os poucos indivíduos que sobrevivem ao atropelamento e a população local está declinando?
O cenário monitorado está em mudança. Percebemos que a vegetação está avançando e os sítios de nidificação diminuindo. Será que as populações de cágados vão desaparecer do local por conta disso? Devemos impedir que isso aconteça manejando a vegetação do entorno? Quando que devemos modificar o ambiente atual para dar a prioridade a alguma espécie?
Enfim, são diversas perguntas que podem ser respondidas com futuras pesquisas e que achei importante levantar já que, às vezes, não refletimos a fundo antes de tomar alguma decisão. De qualquer forma (e talvez sem evidência de impacto populacional), algumas medidas já foram solicitadas para diminuir a mortalidade desses cágados e de outros animais no local. Tendo impacto ou não na população, por questões éticas vamos lutar pela sobrevivência dessas espécies no local, o que não anula futuros estudos da população e de comportamento desses quelônios.