
Por Larissa Oliveira Gonçalves
Bióloga e mestre em Ecologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É doutoranda em Ecologia na mesma universidade, atuando no Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (NERF-UFRGS)
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A poluição sonora pode ser um problemão para espécies que dependem da comunicação acústica. Alguns exemplos são aves e anfíbios que dependem da transmissão de seus cantos e chamados para conseguir um parceiro e obter sucesso reprodutivo. Esse impacto sobre as aves já foi discutido em um artigo desta coluna. Para tentarmos dimensionar o problema, escute o som das motocicletas do vídeo abaixo. Imagine o quanto o ruído dos veículos que trafegam em uma estrada afeta o comportamento desses animais!
Essa foi a pergunta de um estudo publicado recentemente na revista Plos One, no qual os autores avaliaram experimentalmente o efeito de duas intensidades de ruído de tráfego nos chamados de duas espécies de anfíbios da família Hylidae. Uma das espécies escolhida (Boana bischoffi) tem a frequência acústica dos seus chamados altamente sobreposta pela frequência emitida pelo tráfego de veículos. Já a outra (Boana leptolineata) tem uma sobreposição baixa pelo tráfego. A ideia foi testar se a sobreposição ou não de frequências de sons está relacionada ao efeito que o tráfego pode ter.
Depois de uma série de experimentos, reproduzindo o ruído do tráfego gravado em uma estrada e observando o comportamento dos animais, os autores constataram que o ruído afeta tanto a taxa de chamados de Boana bischoffi quanto o comprimento dos chamados de Boana leptolineata. A espécie com menos sobreposição pela frequência emitida pelo tráfego conseguia manter os seus chamados mesmo com o estímulo do ruído, já a espécie com alta sobreposição reduzia significativamente os seus chamados após o estímulo.
Apesar de a espécie com menos sobreposição não reduzir as taxas de emissão dos seus chamados, os autores verificaram que Boana leptolineata aumentava o comprimento do chamado com o estímulo do ruído do tráfego e isso acontecia principalmente quando a intensidade do tráfego era maior.
Ambas espécies demonstraram alguma resposta após a exposição ao ruído do tráfego. Mesmo que a avaliação tenha sido apenas da resposta imediata ao ruído com indivíduos que não estavam expostos anteriormente a ele, podemos imaginar que o ruído afeta um comportamento essencial para persistência dessas populações animais. O encontro de parceiros é uma pré-condição para haver reprodução e o sucesso desta dependerá da condição física dos parceiros.
Mesmo que os indivíduos ajustem aspectos do seu canto para reduzir a interferência do ruído, se isso representar desgaste energético e comprometimento da performance reprodutiva é possível predizer que ocorrerão prejuízos para a população. Existem estudos evidenciando o desaparecimento de populações de algumas espécies de anfíbios em áreas marginais de estradas, mesmo quando há habitat disponível. O estudo citado aqui é mais uma peça no quebra-cabeça que está sendo montado para entender como isso acontece e como intervir.