
Por Dimas Marques
Jornalista e editor responsável do Fauna News
dimasmarques@faunanews.com.br
Composta por 216 deputados federais e cinco senadores, a Frente Parlamentar Ambientalista está com novo coordenador há quase um mês. Em 13 de abril, o deputado federal Nilto Tatto (PT-SP) assumiu o cargo em meio à polêmica gestão do presidente Jair Bolsonaro sobre temas ambientais e às pressões de bancadas como a ruralista e da bala – tradicionalmente pouco alinhadas às questões ecológicas.
A Frente Parlamentar Ambientalista é uma iniciativa de deputados federais e senadores que, de acordo com seu site, assumem o “compromisso de atuar, conjuntamente com a sociedade civil, no sentido de apoiar iniciativas governamentais e não-governamentais que visem alcançar padrões sustentáveis de desenvolvimento.”
Nilto Tatto (PT-SP) está em seu segundo mandato como deputado federal. Nascido em Frederico Westphalen (RS) no ano de 1963, chegou em São Paulo com 14 anos. É graduado em Estudos Sociais e possui especialização em Administração para Organizações Não Governamentais pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).
A trajetória de Nilto Tatto é marcada pela militância junto às causas indígenas e de quilombolas, com forte atuação no Vale do Ribeira (SP). Foi um dos fundadores do Instituto Socioambiental (ISA), onde trabalhou como diretor executivo e coordenador de programas. Ele também já se envolveu em projetos e pesquisas de recuperação de mananciais, manejo florestal, planejamento territorial, geração de trabalho e renda, agricultura familiar e desenvolvimento sustentável.
Atualmente, Nilto Tatto tem atuado intensamente na Câmara dos Deputados em questões ligadas à conservação da fauna silvestre e ao combate à disseminação do uso de agrotóxicos no país.
O parlamentar é o atual relator na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara dos Deputados do projeto de lei 6.268/2016, o PL da Caça, de autoria do ex-deputado federal e atual dirigente do Serviço Florestal Brasileiro Valdir Colatto (MDB-SC). Seu relatório foi pela rejeição desse projeto que busca liberar a caça no Brasil. Ele também é autor do PL 1.487/2019, que propõe a proibição da criação de pássaros em gaiolas e viveiros.
O Fauna News entrou em contato com Nilto Tatto para conhecer seus objetivos relacionados à fauna silvestre na coordenação da Frente Parlamentar Ambientalista e um pouco do que pretende desenvolver sobre o tema na Câmara dos Deputados.
Fauna News – O senhor acabou de assumir a coordenação da Frente Parlamentar Ambientalista. Quais serão as prioridades de trabalho da Frente?
Nilto Tatto – O principal desafio é coordenar os esforços de resistência aos muitos projetos do governo de Jair Bolsonaro que são contrários ao meio ambiente. O presidente tem mostrado ser hostil à pauta ambientalista e diversas agendas perniciosas à preservação ambiental estão pautadas, com interesse governamental e da base aliada no Congresso em aprová-las.
Também buscaremos contrapor a agenda negativa apresentando um outro modelo de preservação e de defesa do Meio Ambiente, articulando e criando condições que permitam aprovar projetos como a Lei do Mar, a que prevê o pagamento de serviços ambientais e a PNARA (Política Nacional de Redução dos Agrotóxicos), que tive a honra de relatar.
Fauna News – Quais as pautas ligadas à conservação da fauna silvestre que serão trabalhadas pela Frente?
Nilto Tatto – No primeiro momento, a luta é para impedir a aprovação de projetos que flexibilizem ou liberem a caça indiscriminada de animais. Queremos diálogo com os movimentos e organizações em defesa da fauna silvestre para avaliar futuras iniciativas.
Fauna News – Historicamente, a Frente trabalha mais com temas ligados a desenvolvimento sustentável, água e desmatamentos. São temas que, lógico, tocam indiretamente na conservação da fauna silvestre. Mas percebe-se que não há discussões que abordem diretamente o tema fauna silvestre. E, atualmente, há assuntos e propostas relevantes em discussão no país, como os projetos de lei para ampliar a atividade de caça, a proibição ou não da criação de animais (principalmente pássaros) em cativeiro, lista pet, etc.
Por que a Frente não se envolve mais diretamente com esses assuntos? O senhor pode ajudar a mudar esse quadro?
Nilto Tatto – A intenção é que esses temas sejam abordados, sobretudo pelo fato de, como você argumentou na sua pergunta, há vários projetos relevantes na pauta que afetam significativamente a fauna silvestre.
Fauna News – Quatro projetos que impactam diretamente a caça no Brasil estão tramitando na Câmara dos Deputados, sendo que dois deles estão na CMADS. Todos têm o viés de legalizar ou facilitar a caça no país. O senhor fez um parecer pela rejeição no seu relatório apresentado sobre o PL 6.268/2016 (PL da Caça do ex-deputado federal Valdir Colatto). Qual a sua posição frente aos demais projetos?
Nilto Tatto – Sou contra todos os projetos que legalizem ou facilitem a caça no país.
Fauna News – Existe alguma articulação entre os parlamentares na Frente Parlamentar Ambientalista, na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados e nos demais ambientes do Legislativo federal para tentar frear essa crescente onda pró-caça?
Nilto Tatto – Sim, existe uma articulação. Estamos construindo uma agenda na Frente Ambientalista com o objetivo de tratar especificamente desse tema. No entanto, ainda não temos muitos detalhes.
Fauna News – Sobre as atividades da CMADS, como está a composição da comissão na atual legislatura? Está melhor para as questões ambientais que nas últimas, onde bancadas como a dos ruralistas e da bala tinham forte representatividade?
Nilto Tatto – Ainda é cedo para dizer algo porque houve uma renovação muito grande e, por conta disso, não é possível traçar o perfil de alguns parlamentares novos, de primeiro mandato e que integram a CMADS.
Fauna News – O PL da Caça (PL 6.268/2016) chegou a ser arquivado após a não reeleição de seu autor, o ex-deputado federal Valdir Colatto (MDB-SC). Mas, ele voltou a tramitar por estar apensado a outro projeto, o PL 7.129/2017, do deputado federal Alexandre Leite (DEM-SP), que trata do abate e controle populacional de espécies exóticas invasoras (não nativas de determinada região). Foi uma manobra articulada com o deputado federal Alexandre Leite (DEM-SP) para o retorno do PL da Caça ou o senhor acha que o parlamentar paulista tinha interesse apenas em manter a tramitação do PL de sua autoria?
Nilto Tatto – Geralmente esses processos de apensamento ou desapensamento são articulados, no entanto não tenho informações sobre esse caso em específico.
Fauna News – O presidente da República, Jair Bolsonaro, assinou terça-feira um decreto regulamentando o acesso a armamento e munições para colecionadores, atiradores esportivos e caçadores. Um dos quatro projetos de lei pró-caça, o PL 1.019/2019, também do deputado Alexandre Leite (DEM-SP), que aguarda a designação de relator na CMADS, tem a mesma intenção de facilitar o acesso às armas. Há alguma articulação entre o Planalto e os parlamentares da bancada da bala para aumentar a circulação de armas e favorecer a indústria de armas e munições?
Nilto Tatto – Com certeza essa articulação existe.
Fauna News – O senhor apresentou este ano um PL (1.487/2019) para alterar a Lei 5.197/67 e proibir a criação de Passeriformes. Sua proposta foi apensada ao PL 3.264/2015, da deputada federal Shéridan (PSDB-RR), que tem o mesmo objetivo. Na atual composição da CMADS, existe a possibilidade de as propostas serem aprovadas?
Nilto Tatto – Da forma como está hoje, é pouco provável que ele seja aprovado pois sofrerá resistência. A ideia do projeto foi levantar o debate sobre a criação de Passeriformes e, a partir daí, trazer a sociedade para a discussão, tentar alterar a correlação de forças a partir da conscientização da população e eventualmente aprová-lo.
Fauna News – O senhor é a favor ou contra a criação comercial de animais silvestres (não apenas de pássaros) para fins de bichos de estimação? Há quem defenda a criação comercial como ferramenta para redução da pressão sobre os animais livres e há quem considere que tal comércio sustenta a cultura da criação de silvestres como pets, que, por sua vez, é a base da demanda que sustenta o tráfico de fauna no Brasil.
Nilto Tatto – Sou contra.
Fauna News – Há mais de 15 anos, tramita na Câmara dos Deputados o PL 347/2003. Esse projeto, resultante da CPI que investigou o tráfico da vida silvestre, tipifica o crime de tráfico de animais. Ele está pronto para ser votado em plenário. Por que não se consegue modificar e melhorar a legislação que combate o tráfico de fauna, com, por exemplo, penas mais duras aos traficantes profissionais e punições diferenciadas para os traficantes e para as pessoas que criam animais em casa sem autorização? A pauta ainda não é prioridade no parlamento?
Nilto Tatto – A questão nesse caso é que não houve conjuntura favorável ao longo de todo esse tempo, devido ao perfil da maioria dos parlamentares. Precisamos muito da mobilização e pressão da sociedade civil caso queiramos mudar essa conjuntura.
Fauna News – O senhor tem novas propostas a serem apresentadas para a conservação da fauna silvestre?
Nilto Tatto – Vamos buscar diálogo, tanto no âmbito da Frente Parlamentar Ambientalista como no meu mandato em particular, para avaliar futuras iniciativas junto a entidades, organizações e lideranças que atuem na preservação da fauna silvestre.