Análise de Dimas Marques
Editor-chefe
dimasmarques@faunanews.com.br
A falta de centros de atendimento à fauna (Cetas, Cras ou Cetras) em quantidade e bem distribuídos pelo país não é novidade. Essas estruturas, responsáveis por receber, triar, atender e reabilitar animais silvestres apreendidos do tráfico ou que, resgatados, necessitem de atendimento veterinário especializado, vivem lotadas e não contam com apoio irrestrito do poder público.
Essa situação faz com que outras estruturas que atuem com animais silvestres acabem fazendo o papel de centros de triagem e reabilitação de fauna. É o caso dos zoológicos.
Os zoológicos são empreendimentos que, modernamente não deveriam atuar somente – ou primordialmente – com entretenimento. Os defensores dos zoológicos argumentam em favor de atividades de educação ambiental, conservação e pesquisa científica. No Brasil, a maioria dos zoos está longe disso, sequer conseguindo garantir o bem-estar dos animais que mantêm.
Pelo Resolução nº 489/2018 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), zoológico é um “empreendimento com a finalidade de criar, reproduzir e manter, espécimes da fauna silvestre e exótica, em cativeiro ou em semiliberdade, expostos à visitação pública.” Mas vejamos o que a prefeitura de Canoas (RS) anunciou, no final de 2021, sobre os serviços oferecidos pelo seu zoológico:
“Uma unidade móvel foi instalada no Parque Municipal Getúlio Vargas para funcionar como ambulatório do Zoológico Municipal de Canoas, gerenciado pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente. A estrutura, montada nesta terça-feira (28), foi cedida pelo comando do 3º Batalhão de Suprimento de Nova Santa Rita (3º B Sup) e vai funcionar até que seja reestabelecido o prédio do MiniZoo. Desde os temporais ocorridos entre os dias 25 e 26 de novembro, o Zoológico teve a capacidade de atendimento prejudicada. Devido à queda de uma árvore sobre o prédio que abrigava o ambulatório, sala de internação, quarentena e necropsia, a estrutura foi condenada, tendo risco de desabamento.
Conforme a bióloga e educadora ambiental, Renata Gautier, nessa época do ano a demanda de atendimentos no Zoológico de Canoas aumenta. Durante a primavera e verão, são atendidos centenas de animais. No último mês, já foram realizados 326 atendimentos pelo MiniZoo. Filhotes de passeriformes, como pombas, andorinhas, caturritas, sabiás, entre outros, foram os principais atendimentos. Além disso, também foram recebidos filhotes de gambás. Atualmente, um filhote de ouriço-cacheiro e uma coruja juvenil (veja mais abaixo) recebem cuidados.
Desde o início deste ano, o Zoológico de Canoas já recebeu mais de 1.309 animais oriundos de entrega da população local, resgate ou vindos de outros municípios. No período de altas temperaturas, são recebidos, em média, cerca de 10 animais por dia. Os bichinhos passam por avaliação veterinária e por um período de quarentena. Caso necessitem, são internados para tratamento ou são destinados para a sala de filhotes. Após, são reabilitados para soltura. Os que não podem ser soltos permanecem abrigados no MiniZoo ou são destinados para outras instituições.” – texto da matéria de divulgação “Zoológico de Canoas providencia estrutura móvel para ambulatório”, publicada em 29 de dezembro de 2021 no site da prefeitura de Canoas
Não estamos chamando a atenção aqui para a questão de o atendimento estar sendo realizado provisoriamente em uma barraca de campanha do Exército. A questão que merece reflexão é que o zoológico está atuando como um centro de triagem e reabilitação de animais silvestres (Cetras), que na Resolução 489/2018 é assim definido: “empreendimento apto a receber, identificar, marcar, triar, avaliar, recuperar, reabilitar e destinar espécimes da fauna silvestre e da fauna exótica”.
Ou seja, o MiniZoo de Canoas atua como um Cetras. E não é só ele. Os zoológicos do país todo assim têm trabalhado por conta da demanda que não consegue ser atendida pelos centros de triagem e reabilitação existentes. O Brasil conta com uma rede de 62 centros que atendem animais silvestres não aquáticos, sendo a grande maioria de pequeno porte, com pouca infraestrutura e carecendo de recursos – confira na reportagem “Nos centros de atendimento à fauna, carências e exemplos de dedicação“, publicada pelo Fauna News em 8 de outubro de 2021).
Há regiões gigantescas que não tem um centro sequer ou tem em número ridiculamente pequeno, como o estado do Amazonas, com um único centro em Manaus. Em outras localidades, como o pequeno estado do Rio de Janeiro, o tráfico de animais é tão intenso que o centro do Ibama, em Seropédica, não dá conta de tanto trabalho – sem contar a deterioração da infraestrutura, a falta de servidores e a carência de tudo por lá.
O sistema de atendimento à fauna no megadiverso Brasil é precário e carece de gestão competente e investimentos do poder público.