Divulgação científica e viés de gênero no Congresso Latino-americano de Aracnologia

Na semana de 16 a 21 de junho, as colunistas que aqui vos escrevem estiveram em Bogotá, Colômbia, no 7º Congresso Latino-americano de Aracnologia (CLA). No último texto que publicamos aqui na coluna, abordamos os trabalhos que apresentaríamos. Agora, vamos relatar nossas experiências no evento e no pós congresso.

Entre diferentes novidades, como pela primeira vez ser um evento híbrido, o CLA abriu espaço para diferentes temas fora da pesquisa aplicada, sendo um deles a divulgação científica.

Eu (Cláudia) tive a imensa satisfação de participar da mesa-redonda sobre divulgação científica com outros divulgadores latino-americanos. Minha apresentação teve como título “Entre teias e telas: perspectivas de uma aracnóloga em formação”. A troca de experiências foi imensamente enriquecedora, pois trabalhamos com divulgação científica em diferentes níveis, variados aspectos, estratégias diversas e até mesmo públicos distintos. No entanto, todos com o mesmo objetivo: aproximar a sociedade da ciência e dos animais que amamos estudar.

De exposições presenciais em escolas e comunidades, passando por jogos, filmes de curta-metragem, músicas (inclusive ganhadora de Grammy), vídeos, eventos a textos como os que escrevemos para a coluna Invertebrados aqui do Fauna News… Nós pudemos aprender com os relatos uns dos outros e compartilhar quais as melhores estratégias para nossos objetivos. Em um evento internacional dessa escala, um espaço para que se converse sobre divulgar a Ciência se mostra essencial para que esse seja um assunto que alcance maior visibilidade e apoio da comunidade acadêmica e das instituições.

Apresentação do trabalho sobre a coluna Invertebrados

Tivemos também um trabalho apresentado como pôster sobre os quatro anos de textos sobre aracnídeos aqui no portal. Incrivelmente, até a data do congresso, já haviam sido publicados 39 textos para os aracnídeos.

Tivemos um recorde de acessos entre os textos sobre aracnídeos com uma publicação que aborda aracnídeos de importância médica, com mais de 6.200 visualizações por mais de cinco mil leitores. Escrever e falar sobre assuntos que muitas vezes geram medo nas pessoas pode ser uma tarefa difícil. Entretanto, com a divulgação científica e informação atualizadas, conseguimos cada vez mais criar a nossa teia de comunicação entre pesquisadores e a população no geral, desmistificando esses seres que são incríveis.

O trabalho foi muito bem recebido e atraiu a curiosidade não só de brasileiros. Algumas pessoas já conheciam alguma iniciativa do Fauna News, como o podcast Silvestres. Diversas outras ficaram interessadas em conhecer mais sobre o que vem sendo feito no portal. Recebemos pedidos e sugestões de textos sobre alguns grupos (abordaremos mais sobre opiliões!) e temas, o que é bastante motivante para continuarmos escrevendo!

Ex-alunos do pesquisador em Zoologia Cultural e professor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) Elidiomar Ribeiro da Silva, que também escreve para a coluna, visitaram nosso pôster e contaram com afeição sobre o tempo em que conviveram com ele.

Além desse trabalho sobre o Fauna News, realizamos outras cinco apresentações orais e quatro pôsteres sobre diferentes projetos com divulgação científica. Em um dos pôsteres, apresentei o trabalho que vem sendo desenvolvido no Grupo de Estudos de Artrópodes da Amazônia (GEAA) sobre a importância da divulgação científica na desmistificação de aracnídeos na região, onde moro (Belém, no Pará).

Em se tratando de animais não muito carismáticos, como é o caso dos aracnídeos, quando observamos o medo e a repulsa transformando-se em respeito e admiração, temos certeza de que nosso objetivo foi alcançado e nosso papel como divulgadores foi feito. Para que tenhamos sucesso, é importante que trabalhemos de forma interdisciplinar, como acontece aqui no Fauna News, em que pesquisa e jornalismo sério se unem para a conservação e p bem-estar dos animais silvestres.

Antes de apresentarmos mais sobre nossas participações no congresso, gostaríamos de agradecer a todas as pessoas que nos incentivam e ajudaram a chegar até Bogotá para participarmos desse evento tão importante para a comunidade latino-americana de aracnologia. Muito obrigada!

Sobre diversidade e viés de gênero na Ciência

Atuamos como divulgadoras científicas e colunistas do Fauna News há mais de dois anos. Além disso, lutamos contra o viés de gênero, bem como em conjunto com a comunidade LGBTQI+, especialmente na academia aracnológica.

Um dos resultados desse tema tão importante foi o seminário “História recente da salticidologia latino-americana e viés de gênero”, apresentado por mim, Kimberly. Como objetivo principal desse trabalho, busquei analisar todos os artigos publicados por autores latino-americanos na salticidologia (estudo das aranhas Saltacidae) relacionados com seu sexo biológico.

Os dados foram analisados em número de publicações, de espécies, de autorias e de colaborações. Encontrou-se um machismo intrínseco estrutural, proveniente de práticas meritocratas. Foram analisados mais de 350 trabalhos publicados por 76 salticidólogos (56 homens e 20 mulheres). Desses, 161 foram realizados apenas por homens, principalmente no Brasil, Argentina, Colômbia e Uruguai. Para as salticidólogas, destaca-se apenas a Argentina, com Maria Elena Galiano, com mais de 100 publicações. Em colaborações, apenas 64 são colaborativos com mulheres e desses a maior parte não aparece como primeiras e/ou últimas autoras (34 e 21 respectivamente).

Isso demonstra que a estruturação é reforçada ao trabalharem apenas com outros salticidólogos.

A compreensão acerca do viés de gênero é altamente desproporcional, favorecendo os homens salticidólogos. Através desses resultados, ações afirmativas e políticas inclusivas tornam-se cada vez mais necessárias, para que tenhamos novas métricas de inclusão dessas e de mais mulheres para continuarem a história da Aracnologia. A comunidade aracnólogica tem de estar atenta a essa estruturação intrínseca do machismo para que possamos ter equidade. Importante ressaltar ainda a necessidade de serem levados em conta outros vieses sociais, como maternar, culturais, políticos e regionais. As referências para essa pesquisa estão listadas ao final deste texto. Confira mais fotos de outros trabalhos na galeria abaixo.

Dicas extras

Eventos científicos são importantes para a troca de conhecimento de forma mais direta entre pesquisadores de determinada área. Dessa forma, os cientistas se mantem atualizados sobre temas, divulgam suas descobertas, trocam informações e fazem networking. Para estudantes de diferentes níveis, participar desses eventos é importante para conhecer diferentes profissionais e aprimorar seus estudos.

Além disso tudo, planejar e organizar uma viagem internacional não é tarefa fácil. Separamos algumas dicas para você, que pretende viajar para algum congresso científico:

• Lembre-se de que organização é fundamental, tanto financeira e de tempo.
• Confira o clima e tempo para onde você está viajando.
• Tente todas as oportunidades de recursos que estejam a sua disposição, como bolsas e rifas.
• Antes de viajar, revise as políticas públicas, sociais e de vacinação do país de destino.
• Pesquise sobre câmbios da moeda do destino.
• Planeje suas rotas e agenda.
• Anote tudo para não esquecer!

Referências

• https://viiclaracnologia.wixsite.com/viicla
• Schwindt-Bayer, L. A. (Ed.). (2018). Gender and representation in Latin America. Oxford University Press.
• Htun, M. (2016). Inclusion without representation in Latin America: Gender quotas and ethnic reservations. Cambridge University Press.
• Schwindt-Bayer, L. A. (2010). Political power and women’s representation in Latin America. Oxford University Press.
• Scott, A. M. (1986). Women in Latin America: Stereotypes and social science. Bulletin of Latin American Research, 5(2), 21-27.
• Huyer, S. (2015). Is the gender gap narrowing in science and engineering. UNESCO science report: towards, 2030, 85-103.
• López-Aguirre, C. (2019). Women in Latin American science: gender parity in the twenty-first century and prospects for a post-war Colombia. Tapuya: Latin American Science, Technology and Society, 2(1), 356-377.
• García-Holgado, A., Díaz, A. C., & García-Peñalvo, F. J. (2019, October). Engaging women into STEM in Latin America: W-STEM project. In Proceedings of the Seventh International Conference on Technological Ecosystems for Enhancing Multiculturality (pp. 232-239).
• Arredondo Trapero, F. G., Vázquez Parra, J. C., & Velázquez Sánchez, L. M. (2019). Stem and gender gap in latin america. Revista de El Colegio de San Luis, 9(18), 137-158.
• Contreras Ortiz, S. H., Villla-Ramírez, J. L., Osorio-Delvalle, C., & Ojeda-Caicedo, V. (2020). Participation of women in STEM higher education programs in Latin America: The issue of inequality.
• Guzman, I. R., Viterbo, J., dos Santos Nunes, E. P., Suni-Lopez, F., Jimenez, E., Casagrande, A. L., & Maciel, C. (2024). Gender Equality Policies in STEM in Latin America-A Systematic Literature Review. In International Conference on Information Technology & Systems (pp. 410-419). Springer, Cham.
• Merchán-Rubiano, S. M., Acero-López, A. E., Sánchez-Gómez, J. S., & De Cajén, S. B. G. (2023, October). Diversity, equity and inclusion on STEM Education in Latin America. In 2023 IEEE Frontiers in Education Conference (FIE) (pp. 1-9). IEEE.

Observação: as opiniões, informações e dados divulgados
no artigo são de responsabilidade exclusiva de seu(s) autor(es).