
Por Dimas Marques
Jornalista, pesquisador do Diversitas-USP e editor responsável do Fauna News
dimasmarques@faunanews.com.br
Não bastasse a intenção de ampliar a caça no Brasil, o deputado federal ruralista Valdir Colatto (PMDB-SC) também está tentando acabar com a Lista Nacional Oficial de Espécies da Fauna Ameaçadas de Extinção. Um projeto do parlamentar com esse objetivo chegou a estar na pauta da sessão de quarta-feira, 3 de maio, da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) para ser votado. Um requerimento do deputado federal Marcelo Álvaro Antônio (PR-MG) conseguiu retirá-lo da pauta.
Colatto é autor do Projeto de Decreto Legislativo de Sustação de Atos Normativos do Poder Executivo (PDC 427/2016) que objetiva sustar a Portaria nº 444, de 17 de dezembro de 2014, do Ministério do Meio Ambiente (documento que contém as espécies de animais ameaçados e o grau de ameaça de cada uma). O principal argumento do deputado é que não cabe ao Ministério do Meio Ambiente determinar a proibição de captura, transporte, armazenamento, guarda, manejo, beneficiamento e comercialização dos animais das espécies constantes na lista.
O relator do PDC na comissão, o deputado federal Alceu Moreira (PMDB-RS) – que também é da bancada ruralista, sendo, inclusive, vice-presidente da regional sul da Frente Parlamentar de Agricultura (FPA) – deu seu parecer favorável pela aprovação do projeto de Colatto em voto de setembro de 2016.
Causa estranheza a falta de divulgação da tramitação desse projeto por parte dos ambientalistas. O projeto de Colatto começou a tramitar na Câmara dos Deputados em julho de 2016 e desde agosto está na da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. Na sessão de 26 de abril da Comissão, o projeto também estava na pauta e só não foi votado porque seu relator, o deputado Alceu Moreira, não estava presente.
Após conseguir que seu requerimento pela retirada do projeto da pauta fosse aprovado, o deputado Marcelo Álvaro Antônio (PR-MG) divulgou um vídeo em sua página no Facebook alertando para as intenções de Colatto.
Vale salientar que Colatto, integrante da bancada ruralista e da bala (que de acordo com matéria do UOL Notícias recebeu dinheiro das indústrias de armas e munições), é autor do projeto de lei (PL) 6268/2016 que está apresentado como uma proposta de Política Nacional de Fauna, mas, na realidade, é uma tentativa de ampliar a caça no Brasil – atividade hoje permitida de ser praticada em poucos casos (como o controle populacional de animais de espécies invasoras). A proposta apresentada pelo parlamentar catarinense tem a clara intenção de permitir a caça profissional e esportiva. Está na justificativa do PL:
“A previsão estabelece que o Poder Público Federal, no âmbito de sua competência, possa rever e regulamentar o manejo, controle e o exercício de caça, esta última enquanto atividade, que pode ser definida como a prática de perseguir animais, geralmente selvagens, mas também assilvestrados, para fins alimentares, para entretenimento, defesa de bens, populações e atividades agrícolas ou com fins comerciais.”
Sem a lista de espécies ameaçadas, o projeto de Colatto (se transformado em lei) permitirá a caça de animais de qualquer espécie, pois o parágrafo 3º do artigo 7º do PL determina:
“Espécies da fauna silvestre brasileira ameaçadas de extinção só podem ser manejadas para fins científicos ou conservacionistas.”
Sem a lista de espécies ameaçadas, também sucumbe o Capítulo III (Das espécies ameaçadas de extinção) do PL de Colatto, que tem em seus artigos 13 e 14:
“Art. 13. Cabe ao poder público federal, estadual e municipal, em conjunto com a sociedade civil, a proposição e a adoção de medidas, bem como o desenvolvimento de ações, projetos de pesquisa ou planos de manejo de fauna que visem a proteção da fauna considerada ameaçada de extinção, bem como de seus sítios de reprodução, locais de abrigo e ambientes particulares necessários à sobrevivência de qualquer espécie pertencente a qualquer uma das categorias de ameaça.
Parágrafo único. Os programas de proteção das espécies ameaçadas de extinção dependem de autorização do órgão ambiental competente.
Art. 14. Quando ocorrerem, em áreas de empreendimentos sujeitos a licenciamento ambiental, espécies que constem nas listas oficiais de fauna silvestre ameaçada de extinção, ficam os empreendedores obrigados a financiar ações, projetos de pesquisa ou planos de manejo de fauna, de acordo com critérios estabelecidos e regulamentados pelo órgão ambiental competente visando a conservação dessas espécies.”
Fica a pergunta ao deputado Colatto e ao relator Alceu Moreira, como será efetivada pela União, Estados, Distrito federal e Municípios a proteção das espécies ameaçadas sem a listagem que eles querem acabar?
E mais: como serão protegidos os animais de espécies ameaçadas que vivem em áreas com empreendimentos sujeitos a licenciamento ambiental como previsto no artigo 14?
A resposta é uma só para as duas questões acima: esses parlamentares simplesmente não querem proteger nada. Eles estão defendendo interesses de setores produtivos atrasados e que procuram ampliar suas atividades a qualquer custo.
Perde a fauna, perde a biodiversidade, perde a própria agricultura, que no futuro sofrerá as consequências de um desequilíbrio ambiental ainda maior, perdem outras tantas atividades produtivas que precisam do meio ambeinte saudável, perdem os brasileiros que terão sua saúde e qualidade de vida comprometidas, enfim, perde o Brasil.
A Lista Nacional Oficial de Espécies da Fauna Ameaçadas de Extinção é uma ferramenta fundamental e imprescindível para o poder público preparar e efetivar políticas de conservação, para ONGs comprometidas com a defesa ambiental determinarem suas diretrizes e para auxiliar muitas das pesquisas científicas desenvolvidas no país.
O Fauna News apoia o coletivo Aliança Pró Biodiversidade (APB) na oposição ao projeto de lei de Colatto. Conheça a APB.
– Conheça o PDC 427/2016
– Conheça o PL 6268/2016 (ampia a caça no Brasil)
– Releia o post "Projeto de lei que autoriza a caça no Brasil pode facilitar o tráfico de fauna", publicado pelo Fauna News em 14 de fevereiro de 2017