Cabeleireira se esforça para ter mais prisões que notório traficante de fauna da PB

07 de dezembro de 2017

No perfil de Luluzinha no Facebook não consta o comércio de animais silvestres

Por Dimas Marques
Jornalista, pesquisador do Diversitas-USP e editor responsável do Fauna News
dimasmarques@faunanews.com.br

Infrator cara de pau auxiliado por lei ineficaz só pode resultar em aberração. E Luciana Golghetto Monfreda é protagonista de uma dessas aberrações promovidas pela Lei de Crimes Ambientais.

Entre junho e novembro, Luluzinha acumulou seis prisõesLuciana reside em Mirassol, pequena cidade com pouco mais de 58 mil habitantes situada no norte paulista, a pouco mais de 450 quilômetros da capital do Estado, perto de São José do Rio Preto. Casada, Luluzinha (apelido que consta em seu perfil no Facebook) apresenta-se na rede social como cabeleireira, uma apreciadora de música sertaneja e interessada em animais. Mas essa aparente vida comum é apenas um dos perfis dela.

Luciana, ou melhor, Luluzinha tem outro perfil, um que tenta esconder e não está nas redes sociais.

Luluzinha já foi flagrada seis vezes com animais silvestres sem autorização somente em 2017. Tudo a partir de junho. A cabeleireira parece estar se esforçando para alcançar a notoriedade do traficante de fauna residente na Paraíba Valdivino Honório de Jesus, que já foi detido 14 vezes e é apontado pelo Ibama em reportagem do Fantástico, da Rede Globo, como o maior comerciante ilegal de animais silvestres do Brasil.

A evolução de Luluzinha no universo do crime ambiental envolvendo animais silvestres deve estar dando inveja no conhecido traficante de fauna Valdivino. Afinal, enquanto ela levou menos de cinco meses para acumular seis detenções, ele precisou de 21 anos para ver registradas suas 14. 

Valdivino prestando esclarecimentos para agente do Ibama: 14 prisões

Luluzinha está sendo investigada como integrante de uma quadrilha de comerciantes ilegais de primatas baseada no interior paulista e que também pode estar atuando no estado do Rio de Janeiro. Em post publicado em sua página no Facebook, a PM Ambiental paulista já escancarou para ninguém ter dúvidas: ela é uma traficante de animais silvestres.

A investigação
Foi a partir da apreensão de um adolescente que transportava três macacos-prego em um ônibus da empresa Cruz, em 13 de junho, que a polícia entrou em contato com essa quadrilha especializada no tráfico de pequenos primatas e chegou até Luluzinha. De acordo com a PM Ambiental, na delegacia de Araraquara (SP), o jovem contou ter saído de Vargem Grande Paulista, na Região Metropolitana de São Paulo, e ido até Mirassol para pegar os animais na casa de uma amiga.  Ele teria alegado que pretendia soltá-los em uma mata próxima de sua residência. Os primatas, que foram sedados para a viagem, estavam em uma caixa de transporte pequena, o que teria levado um dos animais à morte.

O caso chamou a atenção dos policiais, que passaram a investigá-lo com mais atenção. Em 17 de junho, a PM Ambiental finalmente conheceu Luluzinha pessoalmente: ela foi detida em sua casa após ser monitorada em redes sociais e aplicativos por suspeita de vender animais silvestres sem autorização para moradores da cidade de São Paulo. No quintal do imóvel havia vários macacos, sendo quatro saguis-de-tufo-branco (Callithrix jacchus), três saguis-de-tufo-preto (Callithrix penicillata) e onze macacos-prego (Sapajus apella), totalizando 18 primatas, além de dois papagaios-verdadeiros (Amazona aestiva).

No momento da ação policial, um casal estava comprando um sagui e um macaco-prego, que seriam revendidos por valores bem maiores na capital paulista. De acordo com a PM Ambiental, Luluzinha declarou ter capturado os primatas em um local conhecido como Mata dos Macacos, na área rural do município vizinho Bady Bassit.

Micos-leões-dourados apreendidos em Embu das Artes (SP). Espécie só existe no estado do Rio de JaneiroLuluzinha foi indiciada, mas solta. Suas ações nas redes sociais continuaram a ser monitoradas pelos policiais. A PM Ambiental afirma ter conseguido indícios de que ela mantinha contato com Jacqueline Berenstein Ring. Por conta dessa relação entre elas, em 24 de julho (leia o post do Fauna News sobre o caso), uma equipe do 1º Batalhão da Polícia Militar Ambiental foi até a residência dessa nova suspeita, em Embu das Artes, na Região Metropolitana de São Paulo. No imóvel, foram encontrados 19 pequenos primatas, sendo dois micos-leões-dourados (Leontopithecus rosalia), dois macacos-pregos, onze saguis- de-tufos-brancos  e quatro saguis-de- tufos-pretos.

Um dos macacos-pregos tinha lesões e havia suspeitas de serem resultado de automutilação. Os micos-leões, os saguis e um macaco-prego estavam presos em viveiros com armações de telas típicas de galinheiros. Na Polícia Civil, Jacqueline foi indiciada pela manutenção de animal silvestre em cativeiro sem autorização e por maus tratos, sendo solta posteriormente.

Macacos-prego encontrados no veículo onde estava LuluzinhaLuluzinha passou a ser considerada uma peça fundamental nas investigações do que se considerava, naquele momento, uma possível quadrilha especializada em tráfico de pequenos primatas. Sempre monitorada pela PM Ambiental, ela acabou detida novamente em 2 de agosto (leia o post do Fauna News sobre o caso). Às 20h30, o veículo onde estavam Luluzinha, suas duas filhas e Mariana Mortati Silva Candido (dirigindo), foi parado por policiais e nele havia dois macacos-prego capturados na Mata dos Macacos.

Em 8 de setembro, por manter em sua casa um macaco-prego, oito blocos de notas fiscais, 60 anilhas, 106 microchips e dois alicates para anilhar (materiais usados para dar aparência de legalidade aos animais capturados na natureza que seriam traficados), Luluzinha foi novamente detida (leia o post do Fauna News sobre o caso). Os policiais foram até a residência dela após uma equipe da Policia Rodoviária Estadual ter flagrado, na praça de pedágio de Araraquara da rodovia Washington Luiz (SP-310), um morador de Santo André transportando três macacos-prego em seu carro. No veículo encontrava-se uma das filhas de Luluzinha.

Macaco e material usado para dar aparência de legalidade aos animais traficados

A cabeleireira de Mirassol ainda foi detida em 21 de outubro, quando, também em sua residência, os policiais encontraram um arara-canindé (Ara ararauna), e duas vezes no feriado de 15 de novembro.

Isso mesmo, duas vezes no mesmo dia.

O 15 de novembro
Às 5h30 do feriado da Proclamação da República, Luluzinha foi abordada por policiais enquanto dirigia um carro pela rodovia Washington Luiz (SP-310), sentido cidade de São Paulo. No veículo, havia um filhote de macaco-prego. Ela foi presa, indiciada e solta. Afinal, o crime de manter em cativeiro ou transportar animais silvestres sem autorização não prevê que o infrator responda preso pelo ilícito. 

Com a legislação ajudando, bastou um pouco de cara de pau para Luluzinha tentar sua ação mais ousada: praticar o mesmo crime horas depois de ter sido pega na estrada. E foi o que ela fez 16 horas após sua quinta detenção. Mas novamente não deu certo.

Eram 21h30 quando Luluzinha foi novamente detida em Mirassol após embarcar com mais primatas em um ônibus com destino a São Paulo. Quatro filhotes de macacos-prego estavam espremidos dentro de malas e mochilas no interior do veículo, onde permaneceriam por mais de seis horas.

Esses dois filhotes estavam sendo transportados na bagagem, onde ficariam por mais de seis horas

O Fauna News, que já havia noticiado alguns casos envolvendo Luluzinha, tentou entrar em contato com ela. Um dos recados informando que uma matéria jornalística estava sendo feita sobre seu histórico de flagrantes foi visto por ela segunda-feira na sua página em que divulga seu trabalho como cabeleireira no Facebook.

O Fauna News está à disposição de Luluzinha para publicar seus esclarecimentos.

Luluzinha permanece solta, a PM Ambiental de olho nela e os animais em perigo.

Já a legislação… bem, essa continua ineficiente e ajudando a criar esse tipo de aberração.

– Saiba mais sobre a legislação ineficiente contra o tráfico de animais

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