Por Andreas Kindel
Biólogo, professor associado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e coordenador do Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias da mesma universidade (NERF-UFRGS)
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Nos dias 28 e 29 de agosto, aconteceu em Belo Horizonte (MG), numa ação conjunta do NERF (Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias da Universidade Federal do Rio Grande do Sul) e do TREM (Transportation Research and Environmental Modeling Lab da Universidade Federal de Minas Gerais) o workshop "Monitoramentos de mortalidade de fauna e de medidas mitigadoras em ferrovias: protocolos de amostragem e sua publicização". O objetivo foi reunir o empreendedor público de ferrovias, algumas empresas concessionárias, órgão licenciador federal, consultorias ambientais, bem como a academia, para discutir como avaliar a mortalidade de animais silvestres em ferrovias e a efetividade das ações e estruturas de mitigação implantadas.
Qual a importância disso? Ao contrário das rodovias, as pessoas praticamente não circulam nas ferrovias e quando o fazem, dos vagões, não são capazes de observar a fauna morta depositada entre ou ao lado dos trilhos. Esses são alguns dos fatores que sustentam a percepção generalizada de que ferrovias matam pouco. Provavelmente, também são uma razão para os estudos em ferrovias serem, não só no Brasil, muito negligenciados e por isso pouco sabemos sobre os padrões de mortalidade.
Contudo, os poucos dados disponíveis, gerados no âmbito do licenciamento dessas infraestruturas, evidenciam que a magnitude da mortalidade não é negligenciável. Possivelmente, em alguns contextos e para algumas espécies, a mortalidade em ferrovias pode ser tão grande quanto ou maior do que a observada em rodovias – quando utilizada uma mesma unidade espacial (quilômetros).
Os estudos obrigatórios a serem realizados durante a renovação de licenças de operação das ferrovias já implantadas são uma grande oportunidade para aprendermos com o presente e planejarmos infraestruturas menos danosas ambientalmente no futuro próximo. Contudo, há inúmeras formas de realizar esses estudos e qualquer proposta, oriunda de qualquer um dos setores envolvidos, será imediatamente bombardeada por um número infindável de questionamentos ou objeções: “isso não é possível! Isso é muito caro! Precisa mesmo fazer isso? É melhor fazer de outra forma!”
Como fugir desse ciclo recorrente de conflitos de interesses, experiências e receios que pode afetar a velocidade e qualidade das decisões a serem tomadas?
A única saída é cooperar!
A proposta desses workshops, que já chegaram à terceira edição, é integrar técnicos de todos os setores envolvidos com essas infraestruturas na construção de protocolos de consenso, via mais eficiente para identificar critérios e procedimentos que confiram credibilidade, legitimidade e significado aos estudos que estão sendo elaborados.
Todos esperamos que nossos protocolos produzam decisões mais inteligentes, baratas e efetivas, ou seja, que salvem vidas animais. Todos estamos empenhados para que os protocolos sejam adotados e monitorados, promovendo assim a espiral de aprendizado que deveriam ser os licenciamentos. Nossa expectativa é que os protocolos continuem a ser melhorados. Nossa certeza é que ninguém mais aceita que os estudos continuem sendo feitos como sempre foram.