Por Andreas Kindel
Biólogo, professor associado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e coordenador do Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias da mesma universidade (NERF-UFRGS)
estradas@faunanews.com.br
Acaba de ser publicada uma revisão que buscou responder a essa pergunta. Várias foram as razões elencadas: dimensionar o número de fatalidades, avaliar mudanças demográficas e genéticas nas populações ou alterações comportamentais, descrever a distribuição de espécies ou mesmo descobrir novas espécies e dimensionar a prevalência de contaminantes e patógenos.
A razão mais urgente é a obrigação ética e legal de reduzir a mortalidade nas estradas, que exige, para o planejamento de estruturas ou ações de mitigação, um amplo conjunto de dados. Com frequência, escrevemos aqui sobre a importância de uma série de cuidados na coleta dessas informações para qualificarmos a tomada de decisão.
Mas o meu propósito com este artigo de hoje é ilustrar algumas das outras razões para se amostrar e monitorar a fauna atropelada citadas na revisão a partir de um post chocante do pesquisador e consultor ambiental Felipe Peters, que circulou no Facebook e que reproduzo ao lado na íntegra.
Para além da imagem desconcertante e potencialmente mobilizadora do "varal do horror", há uma série de informações no post que ilustram uma enorme dedicação e disciplina do Felipe para promover o maior aproveitamento científico possível dessa tragédia. Todo material biológico obtido dessas carcaças foi destinado a múltiplas instituições científicas, informação por mim confirmada de forma independente e que obviamente é digna de admiração. Muita coisa sobre a distribuição e a estrutura demográfica e genética dessas espécies poderá ser revelada a partir dessas amostras.
Um outro aspecto interessante dessa imagem é que ela ilustra também uma hipótese comumente utilizada por quem monitora mortalidade de fauna em rodovias de forma sistemática e raramente encontra felinos atropelados. Os felinos não só podem ser mais raros que outras espécies, mas suas carcaças também podem ser mais rapidamente removidas da estrada pelo enorme interesse que despertam nos biólogos…
Mais do que tudo isso, a imagem e o texto do post clamam por alguma solução para reduzir essa carnificina. Mas planejar a redução das fatalidades para felinos não é uma tarefa trivial. Na escala de tempo em que são feitos os estudos de monitoramento de fauna raramente acumulam-se registros de felinos em número suficiente para identificar eventuais agregações, ou seja, segmentos da estrada onde o número de eventos é maior do que seria esperado ao acaso. A escolha de locais com agregações diminui a razão custo/benefício da instalação das medidas mitigadoras, algo a ser perseguido nesses estudos.
Mesmo que alternativamente a decisão seja por implantar alguma ação de mitigação em cada local com registro de carcaças, isso pode significar implantar estruturas continuamente, pois, como já vimos, os eventos acumulam-se de forma lenta, relativamente. E todos que já tentaram negociar soluções dessa natureza, em estradas já em operação, sabem que o esforço político e financeiro para viabilizá-las é considerável. Frequentemente é necessária a intervenção judicial.
Contudo, a imagem deixa claro que não importa a dimensão do desafio, algo precisa ser feito!