Por Barbara Zucatti
Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e mestranda no Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias da mesma instituição (NERF-UFRGS)
transportes@faunanews.com.br
Nesta semana, tivemos uma data comemorativa: 11 de setembro, dia do Cerrado. Mesmo sendo o segundo maior bioma da América do Sul, a savana mais biodiversa do mundo e responsável por 40% do abastecimento de água no Brasil, estamos em tempo de luta e não de comemoração. Tudo isso está sendo ameaçado principalmente pela expansão agropecuária, facilitada pela ampliação da malha rodoviária e pela tímida proteção administrada pelos sistemas de conservação a nível federal e estadual.
Apenas cerca de 8% do bioma possui seu território legalmente protegido por unidades de conservação (UCs), a grande maioria é área protegida de uso sustentável. O que significa ser permitido explorar os recursos naturais, desde que a biodiversidade e as características ecológicas sejam mantidas. No entanto, o desenvolvimento agrícola no Cerrado tem promovido a expansão e a pavimentação da malha rodoviária, promovendo a fragmentação do habitat, a mortalidade direta da fauna e o isolamento das populações.
Podemos encontrar das mais antigas às mais recentes notícias sobre os atropelamentos da fauna ameaçada de extinção em rodovias que cruzam as UCs do Cerrado. Uma das importantes áreas de conservação do bioma, o Parque Nacional das Emas, registrou um aumento de cerca de 33% das taxas de mortalidade por atropelamento de animais silvestres. Dentre a fauna impactada pelas estradas dentro da unidade de conservação, estão espécies ameaçadas de extinção como o lobo-guará (Chrysocyon brachyurus), um símbolo dessa savana.
Um estudo com objetivo de identificar pontos de agregação de atropelamentos (hotspots) e suas associações com características da paisagem encontrou maior número de atropelamentos perto da vegetação nativa do que em plantações de cana e pastagens. Como esperado, indica a importância da paisagem nativa do bioma para a abundância e o deslocamento da fauna.
Estudos feitos pelo Projeto Bandeiras e Rodovias revelam que o tamanho populacional dos tamanduás-bandeira (Myrmecophaga tridactyla) pode reduzir pela metade em função dos impactos que as rodovias causam na espécie. Entretanto, o estudo enfatiza que esses impactos podem atingir não somente a fauna, mas a própria agricultura no longo prazo, visto que os tamanduás-bandeiras cumprem um papel ecológico importantíssimo na redução de insetos danosos aos cultivos.
Graças às pesquisas científicas, estamos trilhando um caminho para tentar amenizar os impactos das rodovias causados na nossa fauna, com uma variedade de estudos que visam compreender o comportamento das espécies, o padrão espacial dos atropelamentos e os atributos de paisagem que podem estar relacionados com as fatalidades.
Mas enquanto nossas pesquisadoras e pesquisadores forem desvalorizados, enquanto a política de conservação dos nossos biomas for defasada e nossos políticos acreditarem e difundirem a percepção equivocada de que o Cerrado é apenas um deserto propício para plantação de soja, teremos um longo e árduo caminho a percorrer.
Porém, seguimos na luta!
#OCerradoNãoÉDeserto
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