Por Andreas Kindel
Biólogo, professor titular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e coordenador do Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias da mesma universidade (NERF-UFRGS)
transportes@faunanews.com.br
Para quem está perdendo, aí vai uma dica: ainda está acontecendo a I Conferência sobre Impactos dos Transportes na Fauna. O evento é gratuito, começou em 3 de novembro e segue até 9 de dezembro com palestras, mesas redondas e minicursos sobre a interação dos múltiplos modais de transporte sobre a fauna. Vou destacar aqui três aspectos que julgo especiais nessa iniciativa.
O primeiro deles, que deu origem ao título dessa coluna, é o fato de ser uma promoção conjunta da REET Brasil (Rede Brasileira de Especialistas em Ecologia de Transportes) e da Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo). A primeira instituição é uma rede de troca de saberes e colaboração entre técnicos dos múltiplos setores envolvidos com todos os modais de transporte (na terra, na água e no ar). A segunda é um órgão ambiental, responsável pelo licenciamento dessas infraestruturas em uma das unidades da federação. A aproximação e a organização conjunta de um evento dessa natureza por estes múltiplos setores por si só é algo a ser comemorado. É das aproximações e das trocas entre esses múltiplos setores que surgirão as inovações em procedimentos e práticas que reduzirão os conflitos entre essas infraestruturas e a fauna (ou a biodiversidade como um todo).
As tentativas de aproximação não são novas, mas essa combinação de instituições (sociedade civil organizada e órgão público) e sua representatividade são novas para o setor de transportes e isso precisa ser reconhecido, estimulado e replicado. Ainda somos incapazes de rastrear as cooperações que nascem desses encontros, mas não tenho dúvida que elas ocorrem. Sem cooperação não há inovação de procedimentos e é isso que também perseguimos.
O segundo aspecto a ser destacado é o acesso gratuito a todas as atividades do evento, graças ao apoio incondicional da Cetesb, que viabilizou também os minicursos sem ônus aos participantes. Por razões óbvias, as vagas eram limitadas, mas essa se tornou uma oportunidade rara de congregar profissionais e estudantes de diferentes instituições e regiões do país para discutir, de forma mais aprofundada, temas mais específicos de cada um dos modais de transporte. A disponibilidade de profissionais qualificados para desenvolver e implantar procedimentos amostrais e analíticos de avaliação dos impactos dessas infraestruturas sobre a fauna e planejar a mitigação, em todos os seus estágios (desde evitar, minimizar, recuperar até compensar), é um dos gargalos mais importantes para que tenhamos infraestruturas mais sustentáveis ambientalmente. Ainda que tenhamos outros aspectos de acessibilidade que devem ser aperfeiçoados/perseguidos, o rompimento da barreira financeira relacionada às inscrições tem que ser valorizado e sabemos que isso requereu um esforço do órgão público. Nem sempre tem sido fácil a esses órgãos desempenharem a sua função pública e o empenho de todos os envolvidos tem que ser reconhecido.
Notável também é a abrangência dos temas (modais, grupos faunísticos), a heterogeneidade dos atores, setores e formações entre os ministrantes e a representatividade de gênero (outras representatividades ainda precisamos perseguir, mas há um caminho aberto). É dessa diversidade de percepções que surgirão novas soluções para os velhos problemas da interação dessa infraestrutura com a fauna. Quanto mais diversidade buscarmos nas nossas discussões, maiores serão as oportunidades de cooperações e soluções inusitadas. Essa é uma forma inteligente de catalisar as transformações tão necessárias. Acomodar a diversidade dá muito mais trabalho, mas também traz muito mais resultados. Várias das palestras ilustraram a importância das diversidades para a construção das soluções propostas.
Finalmente, é muito difícil mensurar e monitorar as repercussões de eventos dessa natureza no fim último, que é reduzir o sofrimento das populações animais decorrentes dessas infraestruturas e suas repercussões sobre serviços ecossistêmicos. Minha experiência traz a convicção de que é nesses momentos catalizadores que surgem cooperações que redundam em novas normativas, novas abordagens, novas ações, novas estruturas que reduzem a degradação de habitat e as fatalidades de fauna e recuperam a conectividade da paisagem.
Ainda não terminou o evento atual e já estou torcendo pelo próximo. Mas quem perdeu as palestras e as mesas redondas até aqui pode resgatá-las no canal da Cetesb no YouTube. No mesmo link podem ser acompanhadas as atividades que ainda acontecerão até 9 de dezembro. Parabéns a todas e todos envolvidos na organização por este esforço de impacto!
– Confira a programação da I Conferência sobre Impactos dos Transportes na Fauna
– Leia outros artigos da coluna FAUNA E TRANSPORTES
Observação: as opiniões, informações e dados divulgados
no artigo são de responsabilidade exclusiva de seu(s) autor(es)