Reabilitação é etapa decisiva no processo de retorno de fauna à natureza

No último artigo, escrevi sobre como as áreas de soltura poderiam colaborar na reabilitação de aves, através do uso dos aviários ociosos para treino de voos e conseguir avaliar suas possibilidades de soltura com maior precisão.

Discutir reabilitação envolve vários tópicos importantes. Ao receber um animal, precisamos procurar o máximo de informação sobre a sua espécie, para que esse processo de retorno à natureza seja feito o mais eficaz e rápido possível.

Conhecer a espécie

Coletando informações da espécie, conseguimos chegar o mais próximo de sua dieta e podemos tentar reproduzir o hábitat. Para um filhote de coruja, por exemplo, devemos escolher um local escuro para permanecer, simulando o interior da mata, alimentá-lo nas primeiras horas do dia e no cair da tarde e fazer com que sua dieta seja o mais próximo ao que ele comeria se estivesse livre. Dessa forma, conseguimos chegar próximo ao que seria sua vida na natureza, o que também diminui o estresse do animal.

Sabendo que esta coruja faz ninho em ocos, podemos tentar reproduzir uma toca até mesmo com caixa de papelão; se a alimentação for de insetos, comprar tenébrios ou grilos, ou se ela for de uma espécie carnívora, pescoço de galinha e ratinhos congelados serão a base da alimentação e provavelmente uma suplementação de cálcio será necessária.

Diálogo entre instituições

O diálogo com outras instituições que trabalham com fauna silvestre também é de extrema importância. A troca de informações, conhecimento e experiências ajudam a reabilitações bem-sucedidas.

Muitas vezes, para animais gregários, como os psitacídeos, ter alguns indivíduos adultos juntos com os jovens resgatados pode ajudar, pois eles os ensinam a comer e a vocalizar, por exemplo. São chamados de helpers, que além de facilitar nosso trabalho acelerando os processos de desenvolvimento da ave, contribuem para que os filhotes tenham menos imprinting – processo em que animais silvestres criam vínculos com os humanos que as cuidam, o que dificulta deixá-los aptos à soltura. Ave mais mansa e sem medo do ser humano pode, por exemplo, se aproximar de alguma casa após a soltura e ser capturada e engaiolada.

O papagaio Palito

Destaco um caso aqui na Área de Soltura Monitorada Cambaquara, em Ilhabela (SP), envolvendo um papagaio-moleiro (Amazona farinosa) de nome Palito. Ele chegou em maio de 2022, jovem, muito desnutrido, com asas cortadas e bastante assustado. Sabíamos que para a troca de penas levaria em torno de um ano, mas estávamos dispostos a esperar. Porém, por ele ser extremamente assustado e sem poder voar, muitas vezes caia no chão do viveiro.

Numa dessas quedas, ele feriu-se próximo da cloaca. O tratamento foi longo e doloroso, pois a cicatrização demorou. Chegando a outubro de 2023, um ano e meio após sua chegada, suas penas ainda não haviam crescido. No início de dezembro, decidiu-se fazer implante de penas para que sua qualidade de vida melhorasse. Esse procedimento foi realizado na clínica Wildvet, em São Paulo (SP), pelo veterinário André Grespan.

O resultado foi fantástico e, aos poucos, Palito ganhou massa muscular. Progressivamente, ele passará para recintos maiores até conseguir chegar a plenitude de voar.

Quem trabalha com animais silvestres sabe que um resgate rápido aumenta as chances de sobrevivência, ainda mais com uma boa avaliação e atendimento veterinário. De todas as formas, a reabilitação é o processo mais demorado e requer muita dedicação e investimento de recursos humano e financeiro. Tudo isso irá garantir o sucesso da soltura e a sobrevivência do animal em vida livre.

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