
Médica veterinária, mestranda em Saúde, Medicina Laboratorial e Tecnologia Forense pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e agente da Polícia Federal com especialização em Polícia Ambiental
nalinhadefrente@faunanews.com.br
O crime, qualquer que seja ele, não é apenas uma responsabilidade das polícias. Nesse sentido, o esforço para combatê-lo não cabe apenas a essas instituições. Sendo um problema social, a melhor forma de atacá-lo é com as ações de prevenção. A diminuição da criminalidade é, de fato, alcançada quando se atinge as suas raízes.
Tratando especificamente do tráfico de animais silvestres, impedir a retirada de um deles da natureza é bem menos custoso que reintroduzi-lo ao seu local de origem. Criar políticas públicas de educação ambiental e investir na fiscalização é bem menos dispendioso tanto para o Estado quanto para o meio ambiente.
A partir do momento em que um animal selvagem é capturado, ele passa a viver uma situação extrema de estresse até chegar às mãos do consumidor final – quando chegam, pois muitos deles sucumbem durante esse percurso. Eles ficam confinados em locais pequenos, aglomerados com centenas de outros, são transportados em pequenas caixas, privados de alimento e de água por longas horas e passam, normalmente, a sobreviver em local que em nada se parece com seu habitat natural.
Nos casos em que ocorre uma interceptação da polícia que consegue retirar o animal das mãos do criminoso, outra longa jornada é iniciada para que ele consiga voltar ao seu habitat.
Esse animal, inicialmente, precisará ficar em quarentena em um centro de triagem e de reabilitação de animais silvestres para averiguar se, durante esse período em que esteve aprisionado, não adquiriu alguma enfermidade que possa ser transmitida aos outros animais. Ele também precisará passar por uma série de exames, de modo a verificar se não está com algum tipo de lesão definitiva que o impeça de retornar à natureza.
Após essas etapas, inicia-se um processo de reabilitação, que consiste em um grande trabalho para que ele volte a manifestar os seus instintos selvagens, como o de procurar seu próprio alimento, locomover-se naturalmente, voar longas distâncias (para as aves, por exemplo), proteger-se de predadores, procurar abrigo, etc.
Esse processo todo, infelizmente, não tem grandes probabilidades de sucesso, pois a porcentagem de óbitos ou de animais que adquiriram sequelas permanentes é muito alta. Todo o gasto de uma reabilitação é sustentado, geralmente, por verba pública, ou seja, por nós contribuintes – o que é um equívoco, pois deveria ser imputado tal dispêndio ao criminoso, o grande responsável por toda essa desordem; por toda essa desarmonia natural e social.
Mas, por que não investir em prevenção?
Durante meus 18 anos na polícia, percebi algo recorrente nos infratores: embora soubessem como driblar uma ação policial, pois tinham total clareza de que estavam infringindo uma lei, eles desconheciam que sem os animais silvestres não existiria floresta, pois são eles que disseminam sementes. Ou seja, essas pessoas não sabiam que a retirada desses espécimes do meio natural causava, inevitavelmente, um desequilíbrio ambiental, como a disseminação de pragas em suas próprias plantações.

Em outras palavras, eles não tinham conhecimento de que esse desequilíbrio, essa desarmonia da natureza, ameaça inclusive a vida humana, o que inclui a deles e de suas famílias.
O que mais me impressionou foi que muitos deles achavam que os animais não sofriam. Eles imaginavam que, por serem irracionais, não sentiam dor da mesma forma que os humanos. Os animais eram vistos como objetos.
Quantos crimes poderiam ser evitados com um simples trabalho de educação e conscientização ambiental? Quantas crianças e jovens, ao terem contato com essa temática, iriam tornar-se adultos conscientes? Empreender todos os esforços na prevenção será muito mais econômico para o Brasil em todos os aspectos: o fortalecimento dos órgãos de fiscalização e um trabalho de educação ambiental reduziriam bastante os custos de ações repressivas e de regeneração ambiental. A sociedade e o meio ambiente certamente agradeceriam.
– Leia outros artigos da coluna NA LINHA DE FRENTE
Observação: as opiniões, informações e dados divulgados
no artigo são de responsabilidade exclusiva de seu(s) autor(es)