
Por Suzana Padua
Mestra em educação ambiental e doutora em desenvolvimento sustentável. Co-fundadora e presidente do IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas e da Escola Superior de Conservação Ambiental e Sustentabilidade (Escas)
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Nada compensa a morte de uma pessoa, que dirá mais de 660 mil só no Brasil. Esse foi o estrago deixado pela Covid-19 que assola o planeta desde 2020 e já vitimou mais de seis milhões no mundo. São famílias dilapidadas, lesões que permanecem em muitos sobreviventes da doença e incertezas traumáticas que perduram até hoje. E o que é pior, a própria Covid poderia nem ter existido ou se espalhado da forma que ocorreu. O sucesso de sua transmissão se deve a desequilíbrios ambientais que poderiam ter sido evitados. Sem entrar em teorias de conspiração se o vírus foi ou não produzido por humanos com fins letais, o fato é que letal ele foi, seja qual tenha sido sua origem.
Importante agora é minimizar o sofrimento dos que perderam entes queridos e melhorar as condições ambientais do planeta. É com essa intenção que surgiu um movimento internacional denominado Healing Trees (Árvores que Curam), que visa plantar uma árvore por vítima da pandemia no mundo.
No Brasil também foi criado um programa por várias organizações denominado Bosques da Memória, com esse mesmo propósito. Árvores nativas da Mata Atlântica têm reflorestado diversos estados que compõem o bioma, homenageando as vítimas da Covid.
A iniciativa internacional Healing Trees foi exposta por um professor da Costa Rica, José Zaglul, num evento virtual do Catalyst 2030, quando convidou membros de todos os países a aderirem à iniciativa. Como disse o professor Zaghul sobre o ato de plantar: “Procuramos nos unir pelo menos por um dia, esquecer nossas diferenças e nos transformar em uma sociedade de paz, solidariedade e amor, guiados pela esperança de um futuro melhor” (caso alguém queira participar, basta acessar healingtrees.org e preencher o formulário).
A fala do professor Zaglul reverbera empatia, sentimento tão necessário neste momento planetário de grandes desafios em que vivemos, com a degradação ambiental levando a desequilíbrios sem precedentes. São espécies que desaparecem diariamente do planeta e desastres que ocorrem continuamente, como os causados pelas mudanças climáticas drásticas, que incluem chuvas torrenciais com consequências nefastas, ou estiagens prolongadas que destroem o solo e os plantios em tantos locais distintos, entre outros.
A vida humana está sendo afetada, mas é o próprio ser humano que tem causado a grande maioria dos males atuais que atingem as demais espécies e os elementos da natureza, dos quais a própria humanidade depende. Para se ter uma ideia, o ser humano acelerou em mil vezes o processo de extinção das espécies. Ou seja, estamos em um ciclo vicioso, sendo a pandemia prova real desse processo, além de tantos outros riscos que ameaçam a vida como um todo.
O Catalyst 2030 é uma iniciativa de empreendedores socioambientais, composto por grupos como Schwab Foudation, no Brasil com a Folha de São Paulo, Ashoka, Skol, entre outros, além de empresas preocupadas em contribuírem para mudanças que melhorem o mundo. Como faço parte de muitos desses grupos, ao ouvir a proposta do professor José Zaglul, me encantei com a ideia e propus ao IPÊ aderirmos (organização da qual sou co-fundadora) e o apoio foi imediato.
Promovemos assim um evento simbólico na sede do IPÊ, com Catalyst 2030, Empreendedores Socioambientais da Rede Folha, Ashoka e Em Luta. Juntamente com uma pequena equipe do IPÊ, plantamos 100 árvores (número dos membros do Catalyst Brasil e da Rede Folha) no dia 12 de março, data marcada pela primeira morte no Brasil pela Covid-19 em 2020. Outros empreendedores da Rede Folha e Catalyst 2030 também plantaram em Minas Gerais e no Rio de Janeiro, formando uma corrente registrada no Healing Trees.
O nosso plantio aconteceu em uma área de proteção do Sistema Cantareira, em Nazaré Paulista (SP) , que vem sendo restaurada pelo IPÊ juntamente com a Sabesp (empresa de água e esgoto do estado de São Paulo), para a conservação de nascentes e represas, fundamental na produção de água de qualidade. Nessa região, o IPÊ já plantou aproximadamente 400 mil árvores e agora temos essas 100 adicionais, que serão cuidadas com muito carinho para corresponder à nobre intencionalidade com que foram plantadas.

Veronica Grant, diretora executiva do Healing Trees internacional, expressou o reconhecimento às ações no Brasil e enfatizou que “plantar e cuidar de uma árvore é um ato simbólico pela vida” e adicionou: “se a pandemia é um desequilíbrio ambiental, como se provou, árvore significa regeneração, sendo uma verdadeira fábrica de oxigênio”.
O ato é singelo, mas significativo por simbolizar a empatia que sentimos e a vontade de reverenciar as pessoas que se foram em decorrência da pandemia. A ideia é demonstrar solidariedade à dor de todos que perderam alguém para a Covid por meio de um minuto de silêncio, seguido pelo plantio de árvores nativas. Por ter esse significado tão diretamente ligado à vida, árvore traz esperança de melhores condições de restauração e de bem-estar para todos. Sendo assim, plantar uma árvore significa engajamento e participação.
A não omissão com a intencionalidade de promover melhorias socioambientais tem relação direta com a educação ambiental. Fazer escolhas conscientes é parte do processo e depende de reflexões e do direcionamento das ações que podem contribuir para a vida na Terra. Plantar árvores por si só já seria um ato louvável, mais é mais significativo se essa ação decorrer da vontade de quem planta para favorecer a vida por meio das condições atmosféricas planetárias.
E plantar árvores, fontes de oxigênio, com a intenção de homenagear alguém que morreu por uma doença que se agrava com a falta de ar, fica ainda mais forte. A escolha do plantio significa, assim, renascimento onde houve morte, regeneração onde ocorreram perdas de vida.

Uma árvore por si só poderia ser tema de um projeto complexo de educação ambiental. Um artigo recente escrito por Laís Barros Martins defende a importância da árvore para mitigar as mudanças climáticas. Com criatividade e embasamento, Laís demonstra a relevância das árvores de inúmeras maneiras e traz dois exemplos claros de como elas foram fontes de inspiração.
A primeira é conduzida por um menino alemão, Félix Finkbeiner, que tinha apenas nove anos quando começou sua campanha de plantar um milhão de árvores e criou o Plant for the Planet. O programa se expandiu pelo mundo, hoje contando com mais de 90 mil jovens em 75 países, que têm a missão de plantar um trilhão de árvores para amenizar os efeitos das mudanças climáticas.
O segundo exemplo apontado por Laís é um vídeo com Greta Thunberg e George Monbiot. Monbiot descreve as árvores como “perfeitas esculturas vivas que desafiam a gravidade e são os únicos elementos naturais em movimento perpétuo em direção ao céu”. Funcionam como “máquinas mágicas” que se constroem sozinhas com custo insignificante pelo tanto que oferecem, principalmente porque cumprem a função de absorver dióxido de carbono do ar (um dos principais gases do efeito estufa). Quando as árvores são ameaçadas, fato que acontece historicamente no Brasil, e na atualidade em um ritmo exponencial, desestabilizam-se todas as formas de vida, inclusive a nossa.
Sendo assim, plantar árvores, seja por qual motivo for, pode ser parte de um programa educacional. Quando morei no Pontal do Paranapanema, oeste de São Paulo, plantamos muito, o que ocorre até os dias de hoje. Mas, especificamente com jovens, desenvolvemos um projeto que tem pertinência com o tema abordado neste artigo. Em uma rua de Teodoro Sampaio com canteiro central dividindo as duas pistas, envolvemos jovens no plantio de árvores para embelezamento e sombreamento, já que a região atinge temperaturas muito elevadas no verão. A diferença desse plantio para outros é que em cada muda plantada foi colocada uma placa com o nome de quem plantou, que se responsabilizava por regar e cuidar até que sua árvore atingisse um estágio avançado que independesse de intervenções externas. Claro que nem todos tiveram o cuidado esperado, mas muitos sim, e a atividade acabou sendo marcante. Hoje, a rua é arborizada e bela. O que é melhor, a iniciativa impactou quem participou, pois anos depois encontrei um rapaz que lembrava
do programa de educação ambiental por ter sido um dos que plantou e, naturalmente, teve uma placa em sua árvore com seu nome.
São experiências assim que marcam as pessoas e podem as levar a ter maior consciência sobre a importância de se proteger a natureza. Vale a pena tentar, pois o Brasil e o mundo estão cada vez mais necessitando de aliados na conservação de suas riquezas naturais.

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