Passarinhadas: um sobrevoo pela saúde humana

Já não é novidade que observar aves em vida livre, a atividade de passarinhar, traz benefícios para a saúde. Ao indagar “que saúde é essa?”, a resposta mais frequente que ouço tem uma concepção de saúde centrada no indivíduo: aponta-se a diminuição de índices de depressão, estresse e ansiedade; também a estimulação dos sentidos (visão e audição) e do sistema cardiorrespiratório, em decorrência das caminhadas feitas para alcançar os pássaros que se deseja encontrar.

Ainda que essas consequências sejam boas para a saúde humana, nosso tempo urge para que ampliemos essa noção.

A necessidade humana por vínculos

Na graduação em Psicologia, aprendemos que saúde não é apenas ausência de doença, mas viver com qualidade nas diversas esferas da vida, assim como ter condições dignas de existir, que vão para além do tratamento do corpo. Segurança na alimentação e moradia, existência de uma comunidade que ampare e dê apoio e sentimento de pertencimento são exemplos de necessidades vitais para todos os seres humanos.

Uma outra consequência das passarinhadas, mencionada com menos frequência ao se indagar sobre saúde, é expandir o círculo social e fazer amigos. Em outras palavras, criar e fortalecer vínculos.

Observando aves e amizades

Na prática de birdwatching, a troca de informações e experiências é fundamental. Observadores mais experientes se tornam guias para iniciantes, compartilhando seus conhecimentos sobre as espécies, seus comportamentos e hábitats. Por sua vez, os iniciantes trazem um olhar “sem vícios” aos primeiros.

Conforme se tornam mais recorrentes, esses ambientes de trocas favorecem a criação de laços de amizade e colaboração, assim como a inclusão em clubes e/ou grupos de observadores de aves (COAs e/ou GOAs, respectivamente) e a ida a feiras, como o Avistar, fortalecem o senso de comunidade e pertencimento.

Aqui estou, aqui é onde passarinho!

Conexões que extrapolam a comunidade dos passarinheiros também podem ser vivenciadas: destaco, sobretudo, os vínculos intergeracionais e os com o território. Aqueles que vieram antes de nós, sejam essas pessoas mais velhas, familiares ou não, desenvolveram formas diferentes de habitar o espaço – em geral, pelas necessidades de trabalho ou pelas possibilidades de moradia de suas épocas. Falo sobre roceiros, ribeirinhos, migrantes de outros Estados do Brasil ou de fora.

Conversar com pessoas de diferentes origens e faixas etárias sobre a percepção que têm dos pássaros e dos elementos da paisagem e fazê-las puxar na memória como se dava a ocupação das cidades e a relação com os bichos levam, de forma geral, a momentos bastante afetivos. Essas experiências também podem revelar particularidades que se agregam a nossa identidade.

Responsabilização cidadã

A qualidade de vida que podemos obter através do ato de passarinhar pode gerar benefícios que se estendem às aves. À medida que somos encantados por esse grupo animal específico, por extensão, podemos nos tornar mais sensíveis ao ambiente em que elas habitam e às relações ecológicas que desenvolvem.

Brevemente, algumas ações podem ser destacadas: passar a fazer a separação de resíduos recicláveis, priorizar a compra de alimentos de produtores locais, optar por dietas mais veganas que carnistas, lutar pelos direito à cidade e à natureza – diretamente, organizando-se em coletivos, e/ou através da eleição de políticos mais convencidos da importância de pautas ambientais e climáticas.

Um convite à conexão

As passarinhadas são um convite para a conexão genuína com outros seres, humanos ou não. Ao compartilharmos momentos de surpresa, aprendizado e encantamento, os vínculos que criamos podem se tornar suficientes para serem duradouros e protetivos para além desses momentos de lazer – seja no âmbito da saúde humana, na criação e fortalecimento de comunidades; como também na defesa do território que ocupamos e, no qual, coexistimos com animais e plantas, uma vez que cuidamos daquilo que nos importa.

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