Biólogo e especialista em gerenciamento de risco de fauna em aeroportos e controle de animais sinantropícos nocivos. É analista de serviços tecnológicos do Senai- Firjan, membro da Associação Brasileira de Falcoaria e integrante da Rede Brasileira de Especialistas em Ecologia de Transportes (REET Brasil)
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Conhecer os movimentos pendulares diários ou mesmo as rotas migratórias de aves que frequentam aeroportos pode nos ajudar a responder muitas perguntas sobre os fatores atrativos desses animais para o sítio aeroportuário. Porém, os métodos disponíveis para um diagnóstico nem sempre são fáceis e baratos de serem aplicados.
Considerando um cenário mais abrangente de estudos de Ecologia, a busca por informações sobre as espécies não é algo novo. No entanto, um dos fatores limitantes sempre foi o custo envolvido nas expedições e nos levantamentos de dados de campo. Por isso, é possível traçar um paralelo com as espécies que gradativamente foram catalogadas pela ciência e o desenvolvimento das cidades, acontecendo até mesmo um padrão, em que as espécies conhecidas eram, em sua maioria, de indivíduos com área de vida próximos de museus e universidades (centros de pesquisa).
Exemplos disso são os acréscimos das espécies descritas para o Brasil, inicialmente nas imediações do estado do Rio de Janeiro, logo depois da vinda da família real para o nosso país, em 1808.
Com o passar dos anos, novas tecnologias foram sendo adicionadas e muito pôde ser aprendido por meio da captura, marcação, seguidas da soltura, observação e recaptura. No entanto, as taxas de recaptura ou mesmo de nova observação de muitas espécies são bem baixas, funcionado melhor com as mais territorialistas e com pequenos deslocamentos em sua área de vida. Em espécies com maior área de vida e grandes deslocamentos, esse método já não se mostrava eficiente.
Para resolver lacunas no conhecimento de espécies com maior área de vida e grandes deslocamentos, foi muito importante o advento do sensoriamento por telemetria (do grego tele = longe e metro = medir) presencial ou remoto. Telemetria é o termo usado para agrupar as metodologias que utilizam dispositivos eletrônicos sem fio para determinar a posição, movimentação e padrões de atividade à distância. O grau de refinamento da localização depende dos objetivos do estudo, podendo desde estimar a presença até dar a localização exata. Temas já abordados aqui no Fauna News em pelo menos três artigos (“Sabiás viajantes e as mudanças climáticas”, de Karlla Barbosa, “A telemetria na compreensão das relações dos animais com as rodovias”, de Gabriela Schuck, e “Micos-leões-pretos usam mochilas hi-tech para ajudar a recuperar seu habitat”, de Lígia Takau) fazem referência às metodologias associadas ao uso de telemetria para o monitoramento de fauna por rádio frequência nas modalidades VHF e UHF, bem como a mais recente, por Sistema Global de Posicionamento (GPS). Essas técnicas já foram apresentadas ao público geral, como visto em desenhos animados.
Cada uma dessas metodologias possui prós e contras. No entanto, nenhum desses métodos pode ser caracterizado como inferior ao outro. Ambos são largamente utilizados em todo o mundo, dependendo das perguntas que se pretende responder. A marcação de aves de alta mobilidade com anilhas, apesar de ser pouco efetiva para responder perguntas que necessitam de monitoramento individual, podem ser bastante eficientes no monitoramento de espécies de baixa mobilidade.
Telemetria
Em monitoramentos de animais que percorrem longas distâncias, a telemetria é considerada uma das melhores técnicas a ser utilizada, entretanto exige o uso de transmissores de alta potência que, por consequência, são mais pesados. Seguindo uma regra básica, quanto maior, mais potente e com maior autonomia de baterias, mais caros e menos espécies animais podem ser monitoradas por eles.
Assim, o tamanho de uma ave restringe o peso máximo que um transmissor pode ter e, consequentemente, limita a autonomia desses transmissores. O outro fator limitante é o custo dos projetos, que dependendo da espécie que será monitorada, o preço pode chegar próximo de R$ 40 mil por indivíduo (em colares de grandes felinos, com grande autonomia de baterias e que, após o período de estudo, se soltam automaticamente).
Já para as aves, um trabalho realizado pelo professor Carlos David, com valores convertidos, chegou ao custo de pouco mais de R$ 1 mil por animal monitorado. No entanto, na aviação, os custos com os prejuízos causados por colisões com aves podem ser muito superiores e, portanto, esse custo-benefício deve ser pensado. Esses pontos negativos abordados são apenas para que seja feito um checklist inicial para o preparo de um melhor desenho amostral.
Há exemplos de estudos aplicados ao gerenciamento de risco de fauna que podem ser usados como modelo. Em Lima, na capital peruana, pesquisadores equiparam 10 urubus-de-cabeça -preta com GPS e câmeras para identificar pontos irregulares de despejo de lixo. O Departamento de Aves da Universidade Nacional de San Marcos, em um trabalho em conjunto com duas agências locais de publicidade, criou a campanha Gallinazo Avisa. Essa campanha tem o papel de alertar a população local sobre a série de problemas gerados pelo uso desses pontos irregulares de despejo de resíduos.
O documentário, em parte filmado pelos próprios urubus, está disponível no Youtube e leva o mesmo nome da campanha. Ainda com ajuda dessas aves, o órgão de avaliação e fiscalização ambiental (Ofea) identificou pelo menos 20 pontos ilegais de despejo de lixo na capital.
Já em terras brasileiras há o monitoramento de fragatas realizado em parceria com o aeroporto do Galeão, na capital fluminense. Nesse importante trabalho, que deveria ser replicado em outras capitais e seus respectivos aeroportos, os pesquisadores com o uso de um transmissor GPS acoplado na ave registraram um voo a uma altura máxima de 2.217.48 metros. Informação muito interessante para entender sobre o risco de colisões com ave mesmos fora dos muros do aeroporto.
A mesma tecnologia de monitoramento por telemetria VHF, UHF e GPS, que são usadas para monitorar a fauna silvestre dos aeroportos, também pode ser utilizada para acompanhar animais que atuam no gerenciamento do risco da fauna, evitando que eles, ao invés de cumprir o seu papel na segurança do voo, se tornem um problema.
Aqui nesta publicação, temos a intenção apenas de fazer um apanhado geral sobre o uso das tecnologias de sensoriamento e monitoramento remoto. Queremos conseguir resultados melhores na tentativa de identificar fatores atrativos de fauna na Área de Segurança Aeroportuária (ASA) e assim poder propor soluções mais assertivas para os problemas no entorno dos aeroportos.
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