Por Kamila Bandeira
Bióloga com mestrado e doutorado em Zoologia pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É pesquisadora do Museu Nacional da UFRJ e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Suas pesquisas estão focadas em Paleontologia de vertebrados
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Hoje, neste artigo, irei falar sobre um “pequeno” saurópode brasileiro, o Gondwanatitan faustoi. Antes de me adentrar em detalhes sobre o Gondwanatitan, vou contextualizar.
Os saurópodes (ou Sauropoda, como o grupo é conhecido cientificamente) foram todos os dinossauros herbívoros, quadrúpedes, com cabeça pequena e pescoço e caudas longos. Eles foram os herbívoros dominantes em muitos ecossistemas durante o Mesozóico (a “Era dos Dinossauros”) durante o período Jurássico (entre 200 a 145 milhões de anos atrás), especialmente alguns grupos como os diplodocídeos (grupo em que temos o Brontosaurus, Apatosaurus, Diplodocus) e os braquiossaurídeos (grupo com formas como o Brachiosaurus). Durante o Cretáceo (entre 145 a 65 milhões de anos atrás), muitos destes grupos de saurópodes foram extintos, com exceção de um deles: os titanossauros.
Os titanossauros (conhecidos cientificamente como Titanosauria) foram um grupo de saurópodes que rapidamente se diversificou e alcançou uma distribuição global. Fósseis desses animais foram encontrados desde altas latitudes na Ásia e até mesmo na Antártica!
Os titanossauros foram particularmente diversos aqui na América do Sul, especialmente na Argentina e Brasil. Eles foram animais muito bem adaptados, apresentando uma diversidade morfológica e ocupando nichos (ambientes) diferentes, um indicativo de grande sucesso evolutivo. Além, os titanossauros alcançaram tamanhos variados, com espécies com cerca de seis metros de comprimento enquanto outras ultrapassaram os 35 metros! No nosso País, temos atualmente onze espécies de titanossauros e, dentre eles, uma das mais completas é o Gondwanatitan faustoi. O Gondwanatitan era um titanossauro relativamente pequeno, com uma estimativa de 7 a 8 metros de comprimento – mais ou menos o tamanho de dois fusquinhas em fila!
Apesar desse tamanho modesto, o Gondwanatitan possui uma grande importância sistemática (área da Biologia que estuda as relações evolutivas dos organismos). Isso se deve pois, na época em que foi descrito, em 1999, existiam pouquíssimos esqueletos completos de titanossauros, enquanto o Gondwanatitan tinha praticamente todos os elementos – faltava apenas a cabeça, boa parte do pescoço e elementos das mãos e dos pés. Além disso, essa espécie pode ser distinguida de outros titanossauros por várias características únicas, mas principalmente da sua cauda. Por exemplo, as vértebras (ossos que compõe toda a coluna vertebral) da parte anterior e média da cauda possuíam a parte das articulações ligeiramente em forma de coração.
Outra característica importante das vértebras caudais é o posicionamento do arco neural, que é localizado na porção mais a frente desse osso – o que indica que o Gondwanatitan é um parente muito próximo de uma espécie da Argentina, o chamado Aeolosaurus. Outras características importantes são uma crista do úmero (osso do braço), que era muito bem desenvolvida, e a tíbia (um dos ossos da canela) com uma extensão para cima e pouco curva.
O Gondwanatitan foi descoberto em rochas da região de Álvares Machado, próximo a cidade de Presidente Prudente, no interior do estado de São Paulo. Os primeiros ossos foram descobertos em 1983 pelo fazendeiro Yoshitoshi Myzobuchi, que na época rapidamente informou o paleontólogo do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o professor Fausto Luiz de Souza Cunha.
O professor Fausto reconheceu rapidamente que os fósseis encontrados eram de um dinossauro e, rapidamente, organizou escavações que duraram entre 1984 e 1986 para a retirada do esqueleto do Gondwanatitan. O esqueleto foi mantido na coleção de Paleontologia do Museu Nacional, até que os paleontólogos Alexander Kellner e Sergio de Azevedo estudaram, descreveram e classificaram essa espécie em 1999. O nome da espécie faz alusão ao supercontinente do sul formado após a quebra da Pangéia, que é chamado Gondwana, e também ao professor Fausto pelas suas contribuições à `Paleontologia e por seu trabalho de campo que levou à descoberta dessa espécie.
Referencias
– Kellner, A. W. A. & Azevedo, S. A. K. 1999. A new sauropod dinosaur (Titanosauria) from the Late Cretaceous of Brazil. National Science Museum Monographs. 15: 111–142.
– Paul, G. S. (2010). The Princeton Field Guide to Dinosaurs. Princeton University Press
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