
Biólogo, mestre em Biologia Animal pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). É coordenador do Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) Tangará da Agência Estadual de Meio Ambiente de Pernambuco (CPRH), em Recife, e coordenador técnico do projeto de reabilitação, soltura e monitoramento de papagaios-verdadeiros intitulado de Projeto Papagaio da Caatinga
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A rotina de um Centro de Triagem e de Reabilitação de Animais Silvestres (Cetras) é algo bem diferenciado e por isso dizemos que para se trabalhar em um centro desse é preciso modificar seu estilo de vida. O melhor dizendo: Cetras é um estilo de vida.
O dia a dia de um centro é baseado em surpresas das mais diversas formas. São emergências e urgências que chegam durante todo o dia e, muitas vezes, fora do seu horário de trabalho, com animais regatados feridos em que a equipe investe muito tempo tentando estabilizá-los, e temos também as demandas por apreensões que vão sempre acontecer de forma inusitada e com números bem expressivos, exigindo um quantitativo grande de profissionais para atender e acomodar os espécimes. Estamos falando de casos com 100, 300 e até mil animais chegando de uma só vez e que, em alguns casos, são filhotes que necessitam de cuidados bem mais intensos.

Além dos processos de recebimento de fauna, os profissionais de um Cetras precisam lidar com a questão da superlotação que ocorre com a chegada das grandes apreensões ou em períodos de mais acidentes, como é o caso da época reprodutiva das preguiças, em que elas começam a se locomover mais, ficando suscetíveis a atropelamentos.
Além desses fatos, podemos relatar o processo de cuidar de filhotes, que se estende por horas a fio em regime de dedicação quase que integral. É um esforço fora da curva para ter sucesso com os pequenos órfãos. Como exemplo, podemos citar os filhotes de psitacídeos (papagaios, araras e periquitos) que chegam em números bem expressivos e de gambás, que por seu processo de adaptação ao meio urbano sofrem muito com acidentes e deixam inúmeros órfãos. Em 2020, o Centro de Triagem de Animais Silvestres Tangara, da Agência Estadual de Meio Ambiente de Pernambuco (CPRH), recebeu mais de cem filhotes de gambás, uma responsabilidade e uma demanda de trabalho imensas.
Um artigo científico da revista Journal of American Veterinary Medical Association (JAVMA) relata que a classe veterinária é a profissão com uma taxa de suicídios três vezes maior que a média das outras profissões e que os casos geralmente estão associados aos processos de eutanásia ou óbitos de pacientes. Com isso, fica a dúvida sobre a saúde mental dos profissionais que trabalham em centros de atendimento à fauna, pois estamos lidando com índices de óbitos de 20% a 40% devido, principalmente, ao fato de os pacientes chegarem já com prognósticos irreversíveis.
O sentimento de que os profissionais estão o tempo todo só remediando a questão é bem intenso, já que todos os anos essa rotina se repete. Em alguns casos pode ser pior, pois aumentam os mesmos cenários de dor e sofrimento desses animais advindos do tráfico e acidentados do processo de urbanização desordenada e inviável à vida.

Gostaria de pedir que todos os profissionais da área de centros de conservação enviassem uma frase sobre como vocês sentem as mortes dos animais ou quando há a impossibilidade de retorná-los à natureza.
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