Na rota do fogo: a influência das estradas e da ação humana nos incêndios florestais

Os incêndios em áreas de vegetação nativa são uma realidade cada vez mais intensa e frequente. As modificações humanas no meio ambiente em conjunto com o aquecimento global provocam anomalias de temperatura e desequilíbrios no regime das estações, o que abala a resiliência das florestas, que se tornam mais vulneráveis a incêndios. Com isso, fauna e flora sofrem perdas significativas, muitas vezes imensuráveis. O Brasil e muitos outros países da América do Sul têm sofrido nos últimos meses com incêndios fora do comum, que já deixaram uma densa camada de fumaça no céu de pelo menos 60% do território do país e a sociedade consternada.

E como as estradas podem interferir nessa problemática?

Apesar de as estradas serem utilizadas por animais silvestres como rota de fuga durante queimadas (mesmo que com o perigo de atropelamentos) e de elas servirem como meio para os brigadistas chegarem aos focos de queimadas, a rede viária é, muitas vezes, a faísca que inicia o problema. Incêndios criminosos ocorrem com frequência na beira de rodovias, seja por uma bituca de cigarro lançada da janela do carro seja pela queima intencional de uma porção da vegetação. Resultados de um estudo realizado na Europa mostraram que os incêndios são frequentemente iniciados perto de estradas, independentemente do tipo de cobertura do solo que exista no entorno.

Com isso, temos um somatório de ações humanas e de extremos climáticos que acentuam a dispersão do fogo e, por consequência, a devastação ambiental. E isso já não assola somente as florestas, mas também as cidades e as pessoas, provando que a dicotomia ser humano versus natureza é mera ilusão, uma vez que o que está sendo destruído é nossa casa e nossa possibilidade de futuro.

Do ponto de vista da conservação, é essencial a formulação de políticas que protejam áreas estratégicas, como as áreas de refúgio do fogo. São áreas que servem como abrigo para animais de muitas espécies durante um evento de incêndio, além de funcionarem como memória ou legado ecológico da paisagem. Essas áreas conservam a diversidade biológica e ajudam na recuperação do ecossistema afetado pelas queimadas.

Do ponto de vista humano e legal, é preciso estimular campanhas de sensibilização sobre os riscos associados ao fogo criminoso, incluindo aqueles “acidentais” (como lançar uma bituca de cigarro da janela de um veículo). Além de banir por vez práticas como atear fogo na terra para implementação de pastagem. E, por fim, do ponto de vista tecnológico, um importante passo é investir em tecnologias de monitoramento e protocolos de gestão para que focos de incêndio possam ser mais rapidamente apagados.

Como profissional da área ambiental e pesquisadora, penso, ainda, que é imprescindível termos pesquisas cada vez mais aplicadas à conservação e vejo na divulgação científica uma grande oportunidade para disseminar o conhecimento em torno da conservação ambiental relacionada aos riscos das queimadas.

E que não seja tarde demais para implementar outro tipo de faísca na nossa sociedade: a da conscientização.

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