Por Vitor Calandrini
Primeiro-tenente da PM Ambiental de Paulo, onde atua como chefe do Setor de Monitoramento do Comando de Policiamento Ambiental. É mestrando no Programa de Pós-Graduação em Sustentabilidade na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP
nalinhadefrente@faunanews.com.br
Sem dúvida alguma, não há outro assunto em todos os meios de comunicação e em nosso dia a dia que não seja a doença Covid-19, causada pelo novo coronavírus. A pergunta é: como ela poderia se relacionar aos animais silvestres? E mais: por que resiliência e cativeiro? Como esses temas se correlacionam?
Pois bem, este texto é mais uma reflexão sobre os impactos dos seres humanos em nossa fauna silvestre, tanto ativamente, quanto por nossa omissão.
Inicialmente, é importante salientar que até o momento a maioria dos artigos científicos publicados no mundo relaciona o surgimento da Covid-19 ao consumo de carne de animais silvestres infectada, a exemplo de certos morcegos e pangolins (um dos animais mais traficados no mundo), espécies que contêm coronavírus com similaridade de mais de 90% com o tipo que causa a Covid-19.
E quando falo em resiliência, muitos poderiam achar que seria algo relacionado à doença ou à capacidade de se manter saudável. Mas a visão de resiliência que vim trazer aqui é outra. É a resiliência ambiental, que nada mais é do que a capacidade do meio ambiente, e neste contexto a fauna silvestre está inserida, de se reorganizar e reocupar seus habitat quando o ser humano se recolhe em suas casas, se isolando de um vírus transmitido por ele mesmo.
Trago aqui dois exemplos que vêm chamando a atenção, um internacional e um regional. O internacional foi a cristalização da água e o reaparecimento de peixes nos canais sempre movimentados e poluídos de Veneza, na Itália, um dos países mais atingidos pela Covid-19. O de abrangência local é o reaparecimento de grupos de maritacas em bandos sobrevoando áreas urbanas, fato que poderia até ocorrer, mas era imperceptível devido à aglomeração de veículos, pessoas e barulhos característicos de áreas urbanizadas.
E quando falamos na sensação de cativeiro, essa sim é para nós, os seres humanos, que começam a se recolher em suas residências para evitar a contaminação e propagação da Covid-19. Agora, nós estamos experimentando como é ter a vida, com alimentação, água e local para descanso disponíveis, mas restritos um ambiente restrito, sem poder sair e se relacionar livremente com outros da nossa espécie (os relacionamentos ainda acontecem de forma leve porque existe a internet e outros meios de comunicação). Será que neste contexto não conseguimos nos sensibilizar com os animais mantidos em cativeiro? Não é possível uma empatia e uma análise sobre como deve ser a vida de um animal de estimação?
A verdade é que este tempo de reclusão preventiva é muito importante para essa reflexão, mesmo que superficial. Até onde compensa o consumo de carne de animal silvestre? Será que estamos dividindo o espaço do planeta de forma consciente, considerando os demais seres vivos? Será que animais em cativeiro realmente podem ser felizes?