
Biólogo, mestre em Ecologia e agente de fiscalização ambiental federal
nalinhadefrente@faunanews.com.br
O que é a Lista Pet?
A Lista Pet é o nome que se deu a uma lista que visa delimitar quais espécies da fauna silvestre nativa poderão ter animais usados como bichos de estimação, sendo vendidos em lojas ou pelos criadores para o consumidor sem a necessidade de uma avaliação por órgãos ambientais se aquela pessoa possui condições de manter o animal ou os animais.
É importante que se diferencie de animais domésticos como gatos, cães, cavalos e outros e, ainda, de animais silvestres exóticos, que compreendem pítons, leão, girafa, tigre, ursos, entre diversos outros. Os animais domésticos são aqueles cujas espécies foram resultantes de seleção artificial executada pelo homem durante milhares de anos. Os animais silvestres são os que ficaram submetidos à seleção natural. Animais silvestres originários do Brasil ou que o usem durante migração são chamados de fauna silvestre nativa e aqueles que ocorrem fora do Brasil são os animais silvestres exóticos.
Por que uma pessoa pode comprar animal silvestre nativo no Brasil?
Antes da Lei nº 5.197/1967, a fauna silvestre nativa era considerada res nullius (coisa de ninguém). Essa lei, conhecida também como Código de Fauna, em decorrência da absurda caça e captura de animais no país, tornou os animais propriedade do Estado como uma forma de protegê-los. No entanto, ela buscou uma forma de que as pessoas continuassem podendo adquirir ou comer animais, desde que eles fossem oriundos de criadouros autorizados pelo órgão ambiental. Os criadouros poderiam vender os filhotes, mas não animais capturados na natureza – o que caracteriza caça comercial, que é proibida no Brasil.
A premissa era de que a oferta de animais legais diminuiria o tráfico e a caça de espécimes silvestres. Mas essa possibilidade nunca foi provada e, ao contrário, pode-se constatar a coincidência entre as espécies mais autorizadas com aquelas mais traficadas.
Em artigo de 2016, a pesquisadora da África do Sul Laura Tensen comprovou cientificamente que a criação comercial não contribui para a conservação se [1] continua existindo captura na natureza; [2] se o comércio legal aumenta a demanda pelos animais; [3] se o animal oriundo do criadouro não for um substituto válido ao mateiro; [4] se ocorre lavagem de animais oriundos da natureza e [5] se os valores de venda dos animais oriundos do cativeiro autorizado são superiores aos valores do tráfico.
Todas estas situações ocorrem no Brasil e, portanto, a criação comercial não contribui para a conservação. Um esclarecedor exemplo é o caso de um traficante de macacos-prego em São Paulo que, quando flagrado, informou que sua demanda nunca foi tão alta como após um famoso artista expor seu macaco em redes sociais da internet.
Lista Pet Zero?
Solicitar que uma resolução do Conama estipule uma Lista Pet Zero (a inexistência de espécies para comércio) é se contrapor ao disposto na Lei nº 5.197/1967, que permite a venda de animais silvestres no Brasil. Na Câmara dos Deputados encontra-se o Projeto de Lei nº 4.705/2020 do Deputado Federal Ricardo Izar que proíbe a criação comercial no Brasil. É, portanto, no Congresso Nacional que a venda de animais silvestres poderá ser eliminada no Brasil. Até que isso ocorra, é melhor que se tenha uma Lista Pet.
Explico: sendo permitido por lei o comércio de animais silvestres no Brasil, é melhor que se delimite as espécies que poderão ser comercializadas. Essa delimitação é, justamente, a elaboração da Lista Pet.
A Resolução Conama nº 394/2007 e o critério de bem-estar
A Resolução Conama nº 394/2007 estipulava critérios para a elaboração da Lista Pet e atribuía ao Ibama a responsabilidade por realizá-la. A lista culminou não sendo publicada e, depois de 2011, a presidência do Ibama retornou ao Conama a responsabilidade pela lista. A resolução Conama ainda está vigente, mas o Ministério do Meio Ambiente discute a elaboração de uma nova lista e não, necessariamente, seguindo os critérios previstos na resolução. Preocupa, principalmente, que na minuta da resolução, suprimiu-se o critério de bem-estar aos animais.
Quais os critérios básicos que consideramos essenciais?
Entendemos que, minimamente, quatro critérios devam ser considerados para a elaboração da Lista Pet:
1) segurança contra acidentes;
2) segurança sanitária;
3) segurança contra bioinvasão;
4) segurança contra maus-tratos.
O primeiro critério objetiva evitar que o animal autorizado seja de uma espécie capaz de provocar ferimentos graves ou mesmo morte ao seu comprador. O segundo também visa a segurança das pessoas, mas nesse caso em relação à propagação de zoonoses. O terceiro critério se relaciona à possibilidade de fuga ou abandono de animais de determinada espécie, o que poderia favorecer a bioinvasão dos ecossistemas naturais. Portanto, dois critérios se relacionam à segurança das pessoas e o terceiro à segurança do meio ambiente. Estes três critérios são importantes a serem considerados na elaboração da Lista Pet, mas não apenas eles.
O bem-estar animal é um critério importante e seria o único que consideraria o próprio animal, já que os demais consideram o ser humano e o meio ambiente.
O que seria o básico para o bem-estar?
Onde se vai viver é o básico, o primordial para o bem-estar, e isso envolve o tamanho da gaiola, viveiro ou terrário. Sem o estabelecimento de tamanhos mínimos, os animais estarão submetidos a viverem em locais exíguos, algumas vezes sem possibilidade de se locomoverem. Além do tamanho, os requisitos ambientais como umidade, temperatura, substrato, estratigrafia também são importantes. Finalmente, os requisitos nutricionais não devem ser desprezados, pois algumas espécies possuem hábitos peculiares que não serão facilmente reproduzidos por qualquer pessoa que venham a adquirir esses animais.
O que posso fazer e o que pode acontecer?
Em determinado dia, a proteção animal poderá ser surpreendida com a publicação em diário oficial da União de uma lista de espécies da fauna silvestre nativa que poderão ser vendidas como animais de estimação. Nela poderão constar espécies que, em sua avaliação, não deveriam ser usados como animais de estimação.
Você pode se envolver e intervir de diversas formas, entre elas: leia sobre o assunto para que possa desenvolver sua própria opinião e convicção, apoie a sociedade civil organizada que já se manifesta sobre o tema e assine o abaixo-assinado coordenado pela Ampara Animal.
O texto reflete posição pessoal e não, necessariamente, institucional.
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