Fotografando a anta-brasileira

Olá, espero que esteja tudo bem por aí. Voltando à nossa série sobre emblemáticas espécies brasileiras, chegou a hora de cobrir um dos animais mais famosos e importantes dos nossos ecossistemas: a anta-brasileira (Tapirus terrestris).

Também chamada de tapir, a anta-brasileira é o maior mamífero terrestre não só do Brasil, mas de toda a América do Sul. Está distribuída do sul da Venezuela até o norte da Argentina e em praticamente todo o território nacional. Ela pode passar de dois metros de comprimento, 1,10 metro de altura na cernelha (o ponto mais alto das costas do animal, localizado entre as suas escápulas) e pesar até surpreendentes 300 quilos, sendo que as fêmeas costumam ser ligeiramente maiores que os machos.

A coloração do couro grosso e resistente de um adulto é acinzentada/amarronzada, enquanto um filhote parece uma melancia, por conta das listras e pintas amareladas que estampam seu corpo para camuflá-lo de predadores. Entre as características mais marcantes desse animal, estão sua pequena “tromba” (utilizada para agarrar folhas e frutas) e uma crina presente do início do pescoço até a cabeça, que a diferencia de outras espécies de tapirídeos.

Quanto maior o estômago, maior o apetite. As antas são herbívoras e ingerem até 10 quilos de comida todos os dias, sendo sua dieta composta por inúmeras frutas, folhas e até cascas de determinadas plantas. A grande variedade de vegetais consumidos, juntamente com a extensa área que elas percorrem por dia, as tornam dispersoras de sementes fundamentais para os ecossistemas. Não à toa, as antas receberam merecidamente o título de “jardineiras das florestas”. Além disso, esse mamífero é considerado uma espécie guarda-chuva (ao protegê-la, uma série de outras espécies, animais e vegetais, também são protegidas por consequência).

A anta-brasileira está classificada como “vulnerável” na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês), com a tendência de que suas populações irão diminuir ao longo dos próximos anos (dados avaliados em 2018). Infelizmente, ela é um dos animais que precisam enfrentar uma série de obstáculos antrópicos para sobreviver, como o desmatamento, a caça ilegal, a contaminação por agrotóxicos, as colisões com veículos, as queimadas, etc.

Localização

As antas vivem tanto em áreas de mata fechada quanto em campos mais abertos, mas sempre em regiões com algum corpo d’água próximo, como rios e lagos. Elas podem ser encontradas em todos os biomas brasileiros, mas a história em cada um deles é bem diferente, então vou tentar destrinchá-los bem resumidamente:

• Pantanal: ainda são relativamente comuns. Parte das populações consegue se manter saudável e se reproduzir; um dos melhores biomas para fotografá-las.
• Floresta Amazônica: também abriga um bom número de indivíduos em áreas mais intocadas. Nas bordas da floresta podem se tornar mais raras; bom local para fotografá-las.
• Mata Atlântica: números bem reduzidos. Maioria das populações não consegue se manter no longo prazo; difícil encontrá-las, mas é possível.
• Cerrado: populações também não são muito estáveis. É a região onde são mais afetadas por atividades humanas; vegetação do bioma facilita na hora de encontrar e fotografar.
• Pampa: extintas em praticamente todo o bioma. Avistamentos são extremamente raros e geralmente em faixas de transição com outro bioma, não havendo confirmação de indivíduos e/ou populações residentes no Pampa.
• Caatinga: até pouco tempo atrás, acreditava-se que estavam extintas de todo o bioma. Porém, em março deste ano, a Iniciativa Nacional para a Conservação da Anta Brasileira do Instituto de Pesquisas Ecológicas (Incab-IPÊ) realizou uma expedição à região (batizada de “Em busca da anta perdida”) e recolheu dados que comprovaram a existência atual de indivíduos residentes do bioma.

Equipamentos

Uma lente teleobjetiva costuma ser a melhor amiga do fotógrafo de vida selvagem. E com as antas isso não é uma exceção. Ela permitirá que você consiga seus registros sem a necessidade de se aproximar do animal, evitando que ele se assuste com sua presença. Dependendo da paisagem e proximidade da anta, também é possível usar as grande-angulares.

As câmeras trap também são uma ótima alternativa. Você pode utilizar uma câmera trap “original” (sacrificando um pouco a qualidade da imagem) ou montar um mecanismo de disparo automático com seu próprio equipamento (o que vai sair bem mais caro). Para essa técnica, é preciso ter uma certa familiaridade com o local para posicionar a câmera corretamente nas rotas e/ou territórios das antas. Além disso, fique atento a vestígios (como fezes e pegadas) que confirmem a presença recente de indivíduos na região.

Apesar de ter uma visão ruim, a jardineira das florestas tem uma ótima audição. Portanto, se estiver disponível em seu equipamento, utilize o modo silencioso de disparo e desative quaisquer notificações sonoras dos seus eletrônicos.

Técnicas

A anta-brasileira não é conhecida por ser um animal muito rápido nem ágil, portanto não é necessário utilizar velocidades muito altas do obturador para conseguir fotos nítidas enquanto ela caminha, descansa ou forrageia (a partir de 1/400s já deve ser suficiente). Tente priorizar a entrada de luz no seu equipamento para reduzir o impacto do ruído e conseguir belos registros.

Essa espécie de ungulado também tem uma relação muito forte com a água, sendo ótima na natação. Se tiver o equipamento necessário e a disposição de se molhar um pouco, fotos no nível da água e até subaquáticas (como essa do Luciano Candisani) podem dar resultados muito interessantes.

Dicas extras

As antas são ativas principalmente à noite, então a alternativa das câmeras trap pode se mostrar mais eficiente durante esse período. Para fotos à luz do dia, suas melhores janelas de oportunidades serão durante o nascer e o pôr-do-sol.

Caso queira aumentar suas chances de encontrá-las em qualquer um dos biomas, vale a pena dar uma estudada no seu “cardápio” e tentar encontrar áreas arborizadas por suas plantas favoritas (por exemplo, elas adoram palmito-juçara, Euterpe edulis, nativo da Mata Atlântica). E claro, lembre-se de nunca se afastar tanto de onde tem água.

Já foi observado que as antas podem conviver temporariamente com outras espécies frugívoras em uma mesma área, como os catetos, queixadas e veados. Portanto, se der sorte, mantenha um olho atento para fotografar outros animais e sair no lucro.

Apesar da nossa sociedade ter transformado o nome desse animal em xingamento, a verdade é completamente outra. Além de sua participação fundamental nos serviços ecossistêmicos, as antas são animais absurdamente inteligentes, carismáticos e fascinantes de se observar. Ainda não tive o privilégio de fotografar um indivíduo na natureza, mas quando acontecer, tenho certeza de que será um momento inesquecível.

Quando falamos de grandes mamíferos, sempre nos lembramos dos vistos nos safáris africanos, dos ursos americanos e dos felinos asiáticos. Infelizmente temos a tendência de ignorar gigantes da nossa própria fauna. Espero ter gerado uma certa curiosidade em você sobre a anta-brasileira, um dos meus animais favoritos.

Obrigado pela companhia e nos vemos em breve!

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