Estética e ética como base para atividades de educação ambiental

Tudo o que é belo tem o poder de inspirar as pessoas a criar hábitos de cuidado. E o cuidado muitas vezes leva ao interesse e desejo de saber mais, se aprofundar nos detalhes de como algo funciona, como vive, como evolui. Esse sistema de construção do conhecimento, que parece tão simples, poderia ser a base para uma educação que valorize a vida e toda a sua diversidade.

Um dos grandes diferenciais da educação ambiental foi a inclusão de valores e do lado sensível do humano no processo de aprendizagem. Apenas o repasse de informações não estava surtindo os efeitos que resultassem em proteção do meio ambiente e, posteriormente, na valorização das comunidades locais e culturas tradicionais. Ademais, o distanciamento do mundo natural com a vida em cidades e a visão de que a natureza é apenas fonte de recursos nos levaram a uma “cegueira” de percepção do que estávamos causando. Deixamos de nos sentir parte dessa teia de vida da qual dependemos, esquecendo que somos feitos por elementos naturais que são indispensáveis à nossa qualidade de vida e dos quais não podemos prescindir para continuarmos a existir.

Estética e ética também estão presentes no mundo urbano

Mesmo nas cidades existem exemplos inspiradores que nos remetem à estética e à ética. Não só no mundo natural, mas locais belos, limpos e bem cuidados como museus, obras de arte diversas, arquiteturas harmônicas, ruas arborizadas e até meios de transportes como um metrô impecável, por exemplo, podem suscitar comportamentos de zelo. Quando maltratados e feios, as atitudes de agressão parecem aumentar e o descaso predomina. Portanto, a beleza e os detalhes de atenção e respeito ajudam a trazer comportamentos positivos como resposta. Daí a ligação que ouso fazer entre estética e ética, ou seja, o belo como fonte de inspiração para cuidado, respeito, encantamento e comportamentos não agressivos.

Infelizmente, a natureza não tem sido foco dessa admiração por parte da humanidade a ponto de ser devidamente protegida. Talvez o processo educacional deva ser repensado com a inclusão de conteúdos e vivências ao ar livre ou que valorizem o mundo natural. Mesmo dentro das salas de aula, estudantes podem ser incentivados a descobrirem seus talentos com conhecimentos e oportunidades vivenciais ofertados por professores criativos.

A seguir, sugiro algumas atividades já utilizadas em cursos de educação ambiental para professores ou com alunos de séries variadas e que surtiram bons resultados.

• Experiência na natureza (individual)

Dê a cada participante uma prancheta e um lápis (ou lápis de cores diversas) e peça que escolham um local na natureza que lhes atraia, mas que seja acolhedor e inspire segurança. A regra é que fiquem em silêncio por cinco a dez minutos e, ao invés de observarem detalhes ao seu redor de maneira descritiva, que prestem atenção aos seus sentimentos e emoções. Enquanto no local, devem expressar o que vivenciaram de forma criativa (e não em formato de redação), usando de artifícios livres de linguagem ou imagem.

Os resultados podem ser bem surpreendentes. Por quê? O que ocorre é que as pessoas em geral tendem a responder primeiramente com a razão, a lógica. Mas, nesse caso, a oportunidade é de mostrar o que sentiram. Com isso, a criatividade aflora e a emoção se expressa, desvendando a individualidade e o interior de cada um(a). Além disso, as pessoas raramente exercitam ficar em silêncio e menos ainda em um ambiente natural. Essas novidades podem trazer interesses e valores que incluam a proteção ambiental.

• Descobrindo a fauna em sua região (individual ou em grupo)

Essa atividade pode ser realizada dentro da sala de aula com pesquisas bibliográficas e fotográficas ou em passeios de campo que possibilitem a observação direta na natureza. Com consultas bibliográficas, a fauna se torna mais diversificada porque não depende do acaso de se ver ou não algum animal. Mas mesmo que sejam insetos, a observação em seu hábitat natural é sempre estimulante.

Nesse caso, o(a) professor(a) ou guia terá um papel importante de chamar atenção para detalhes, como local em que se encontram, o que estão fazendo e porque, quais os perigos que correm de predadores, entre outros aspectos que podem surgir. Dentro da sala de aula, ou como adição a experiências ao ar livre, existem sites de fotógrafos de natureza do Brasil, como Luis Claudio Marigo (que deixou um legado com suas fotos que deram ainda maior sabor aos chocolates Surpresa, da Nestlé, que vinham com cartelinhas de animais brasileiros, e com seus dois filhos artistas, sendo um, Vitor Marigo, já grande fotógrafo), Leonardo Merçon, Sebastião Salgado, Araquém Alcântara e mesmo o jornalista Marcos Sá Correa, que descreveu tão lindamente o Parque Nacional do Itatiaia.

Existem ainda muitos outros bons fotógrafos, mas o importante é que todos tornam as belezas da natureza brasileira acessíveis às pessoas que não têm a oportunidade de viajar e ver de perto o que esses olhares sensíveis são capazes de detectar. A Folha de S. Paulo lançou recentemente uma coleção da fauna brasileira que pode ser valiosa para atividades educacionais.

O que fazer com as informações coletadas? Uma atividade possível é pedir aos alunos que escrevam redações, poesias ou letras de músicas com o que viram e vivenciaram. Outra é que façam desenhos que possam ser expostos nas escolas em eventos importantes nos quais pais e familiares estejam presentes. Mais uma opção é preparar uma peça de teatro que conte o que está acontecendo com os animais, plantas, hábitats ou biomas regionais.

A ideia é despertar o encantamento e a curiosidade que as imagens e as informações trazem ao aprendiz, de modo que possam ser levadas a qualquer profissão que queiram seguir, estando imbuídos dos valores da proteção da natureza. O fato de estarmos no Brasil, país megadiverso, a “missão” de encantar deveria ser ainda mais reforçada, fazendo parte do conteúdo programático escolar.

• Cadernos reciclados com foco na fauna regional

O que fazem os alunos com as folhas em branco que sobraram dos cadernos de anos letivos anteriores? Essa foi a pergunta feita pela então professora de Biologia, Andréa Peçanha (hoje profissional do IPÊ), que a cada novo ano via cadernos novos sendo trazidos, seja na escola pública seja na privada onde lecionava. Foi esse seu produto final para um curso que ministrei a professores da região do Cantareira (SP) há muitos anos. Cada participante deveria criar um projeto que pudesse ser aplicado e o da Andréa foi aplicado por muitos anos até que saiu de sua posição de professora e se juntou à equipe do IPÊ.

Andréa incentivou os alunos a trazerem seus cadernos usados e juntos arrancaram as páginas ainda sem uso e remontaram novos cadernos, que seriam doados a populações menos favorecidas, no caso, escolas de assentamentos rurais no Pontal do Paranapanema (SP), onde o IPÊ atua desde o seu nascedouro.

As capas novas foram confeccionadas em papel reciclado. Nessas capas, os alunos pintaram seus temas de pesquisa, sendo o primeiro deles sobre as espécies encontradas na região onde habitam. Na primeira página, trabalharam a língua portuguesa ao escreverem cartas se apresentando e convidando os ganhadores dos novos cadernos a também pesquisarem o tema “animais de sua região” e sugerindo que retratassem artisticamente as espécies encontradas.

Além disso, a disciplina de Geografia foi incluída com um mapa de onde estavam os meninos(as) que produziram os cadernos e onde se encontravam aqueles que iriam receber. A História também fez parte com uma narrativa de como o Brasil foi colonizado, como ocorreram os desmatamentos e como surgiram assentamentos ou outros detalhes afins. Finalmente, a Matemática também foi contemplada com cálculos de quantas árvores o projeto estaria economizando em decorrência do reaproveitamento dos cadernos que antes seriam jogados no lixo. A interdisciplinaridade foi exercitada num simples (não tão simples) caderno escolar.

Esses são apenas alguns exemplos de como incentivar atividades que enriqueçam a educação conservacionista. Contemplação e mão na massa ajudam, assim como oportunidades de apreciar o que é belo, inspirando cuidados com a riqueza natural encontrada no planeta.

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