
Por Carlos Eduardo Tavares da Costa
Biólogo, bacharel em Direito e agente de Polícia Federal
nalinhadefrente@faunanews.com.br
Nas últimas décadas, com o crescente tecnológico, estamos diante de um avanço civilizacional sem precedentes. Quando unimos tecnologia e economia, não podemos esquecer que nessa equação é imprescindível o planejamento. Sem este, fatalmente iremos nos deparar com erros e prejuízos.
Notícias sobre desenvolvimento de novas tecnologias, na área energética, sempre me chamaram a atenção. Afinal, mudanças de matrizes são e serão cada vez mais necessárias.
O estado da California, no oeste dos Estados Unidos, se vangloria por ser o campeão estadunidense das energias oriundas de fontes renováveis, onde políticas públicas buscam a descarbonização completa do sistema. Aguardar que mudanças de mercado aconteçam normalmente não tem sido a regra. Altas taxações para empresas que ainda usam fontes não renováveis têm sido impostas e a pressa acaba se tornando inimiga da perfeição.
Para um fornecimento energético em larga escala, as energias solar e eólica ainda apresentam uma série de limitações e empresas de grande porte ainda dependem de subsídios estatais para se manterem em operação.
Mas onde eu desejo chegar? Bem, no item “planejamento”, em que parece ter ocorrido uma falha.
Um significativo número de aves mortas tem sido encontrado em torno das usinas eólicas e fotovoltaicas. Os conhecidos celóstatos (espelhos planos que refletem a luz solar para um receptor) têm, literalmente, “fritado” dezenas de aves, diariamente, nas grandes planícies dos desertos de Mojave e Sonora. As gigantescas pás (que hoje já chegam a medir mais de 70 metros de comprimento) dos aerogeradores têm sido responsáveis, também, por inúmeras mortes.
Com imensa variedade climática – o que fatalmente cria diversidade de habitat -, a California tem uma rica avifauna com mais de 500 espécies, uma maioria residente, porém, muitas migratórias.
Publicada no jornal da Royal Society Open Science, em março de 2022, a reportagem “Vulnerability of avian populations to renewable energy production” (Vulnerabilidade das populações de aves e a produção de energia renovável) dá conta de que o número de fatalidades chega a 300 mil aves/ano. Para as espécies mais vulneráveis – cerca de 23 que já sofrem grande pressão antrópica, entre eles o condor-californiano e a águia-real -, o número de fatalidades chega a cinco mil indivíduos/ano. Para minimizar o problema, luzes e drones já começaram a ser usados.
Façamos, agora, um rápido paralelo com a matriz energética renovável brasileira e com o número e diversidade de espécies em nosso território.
Oitenta por cento dos parques eólicos brasileiros estão instalados na região Nordeste: Bahia, Rio Grande do Norte, Piauí e Ceará lideram. No caso das usinas solares e fotovoltaicas, as porcentagens são bem parecidas e as principais estão instaladas também no Piauí, Bahia e Ceará. Outras usinas eólicas e solares ficam localizadas nos estados de São Paulo e Minas Gerais.
Indiscutivelmente, os biomas Cerrado, Caatinga e Mata Atlântica são riquíssimos em espécies da avifauna. A Caatinga abriga 591 espécies de aves catalogadas; o Cerrado – segundo maior bioma da América do Sul e considerado como um hotspot mundial de biodiversidade – abriga 837; e a Mata Atlântica bate o recorde com 891 espécies.
Os dados relativos à danos físicos e comportamentais não estão facilmente disponíveis em nosso país. Talvez as empresas administradoras de tais empreendimentos não tenham os registros ou não os disponibilizem. Dados como os da geógrafa Adryane Gorayeb, da Universidade Federal do Ceará (UFC), que relatou em pesquisa recente a interferência dos parques eólicos de Pernambuco na rota de aves, são relativamente raros.
Tais tecnologias são importantes para que possamos retirar um discutível excesso de CO₂ de nossa atmosfera, porém danos secundários dessas tecnologias em seres já impactados podem e devem ser analisados e prevenidos.
– Leia outros artigos da coluna NA LINHA DE FRENTE
Observação: as opiniões, informações e dados divulgados
no artigo são de responsabilidade exclusiva de seu(s) autor(es)